Resumen de la Ponencia:
Considerando a produção social da obra literária do escritor João Silvério Trevisan, o presente trabalho parte da problematização do autor acerca da realização de uma interpretação acerca do Brasil, tomando como ponto de partida o diagnóstico de um país em crise. Nesse sentido, a partir da problematização da variável raça, presente no romance
Ana em Veneza (1994) somos instados a perguntar em que medida tal obra permite compreender o Brasil a partir da revelação de fantasmas – no sentido proposto pela socióloga Avery Gordon – enquanto estruturas regressivas de um passado reificado, fraturado, não elaborado que moldaria a maneira como o imaginário social é produzido como reação fóbica da sociedade brasileira frente a condutas desviantes. Nesse sentido, procederemos, de forma a fundamentar sociologicamente o trabalho, considerando a relação teórico-metodológica das formulações da crítica literária de caráter dialética, entre forma literária e processo social, onde objetos literários podem ser analisados como constituídos de condições originais históricas que reaparecem como formas socioliterárias. Assim, o romance aborda temas como o exílio, o desenraizamento, os trânsitos culturais percorridos pelos personagens na narrativa como se apresentassem o “estigma de estrangeiro”. Realçando sua condição de “a-pátridos”, o romance de Trevisan coloca, portanto, a questão da nacionalidade como enigma da formação social do Brasil, isto é, qual o projeto racial moderno a nação seria formada? Conforme aponta Richard Miskolci, para compreender o contexto, por exemplo, de uma das personagens estudadas, Julia Mann se insere, é preciso entender o contexto histórico e social em que viveu, isto é, a Alemanha dos fins do século XIX e início do século XX. A condição de estrangeira de Julia era vista, segundo Miskolci, pelos europeus, da metade para o fim do século XIX, como um perigo, baseada nas teorias organicistas nacionalistas, na teoria da degeneração da raça, ou seja, de toda uma visão biológica que permeava o debate sobre raças nos fins do século XIX. Podemos, entretanto, estender a “sugestão” feita por Miskolci e investigar, além do caso de Julia com relação ao debate organicista europeu sobre raças, como esta visão seria abordada no caso dos personagens Ana, mucama e negra e Nepomuceno, nordestino e homossexual, portanto, como as concepções teóricas sobre a degeneração das raças produzidas na Europa foram apropriadas pelas elites brasileiras para empreender o projeto moderno de embranquecimento da nação a partir do fantasma da degeneração, portanto o romance de Trevisan apresenta a relação entre nacionalidade e raça, revelando a construção social e literária dos personagens está relacionada ao contexto histórico e político que promovia uma abordagem biológica da sociedade brasileira nos fins do século XIX.