Resumen de la Ponencia:
A terceira semana do mês de maio de 2020 marcou a ruptura da barreira, mais que simbólica, de mais de mil mortes diárias causadas pelo novo Coronavirus. No país tropical, “abençoado por Deus”, o vírus chegou primeiro nas classes mais abastadas, às quais logo foi garantido um tratamento
vip-gourmet nos chiques ambientes hospitalares, assegurados por seus pomposos planos de saúde. Enquanto o paciente zero se curava em famoso e caro hospital de São Paulo, vinha a óbito no Rio de Janeiro a primeira vítima da doença: uma empregada doméstica negra contagiada pela patroa branca, moradora do Alto Leblon – o bairro com o metro quadrado mais valorizado da cidade carioca. Esta, como o paciente paulistano, voltava da Itália (à época o epicentro da pandemia), mas não dispensou a trabalhadora doméstica e não respeitou a quarentena enquanto aguardava o resultado do teste para a Covid-19. A morte da trabalhadora, que não havia visitado a Europa, não deixou dúvidas quanto ao laudo da patroa. A partir de março de 2020, período em que explodiu a pandemia no Brasil, o coronavirus se espraiou para as periferias mais precarizadas, em especial nas grandes cidades. Os efeitos foram os piores possíveis: são milhões de pessoas infectadas a uma velocidade sem precedentes. Os dados sobre o perfil das vítimas da Covid-19 mostram que entre pretos e pardos a porcentagem de mortos passou de 32,8% para 54,8% no curto período de 10 de abril e 18 de maio. Este número aumenta ainda mais quando examinamos as mortes por outras síndromes respiratórias, conforme registros em cartórios. Entre os pardos, as mortes por essas doenças aumentaram 72,8%, entre pretos a elevação foi de 70,2% e entre os brancos o aumento foi de 24,5%. As pesquisas realizadas em maio pelo Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde da PUC-Rio, demonstraram que as chances de um paciente preto ou pardo e analfabeto morrer em decorrência da Covid-19 no país são 3,8 vezes maiores do que de um paciente branco e com nível superior. Na cidade de São Paulo, jovens trabalhadores/as desempregados/as ou que precisam trabalhar fora de casa foram os/as mais infectados/as pelo novo coronavírus. Enquanto brancos/as têm 8,1% de chances de se infectarem, as estatísticas revelam que os riscos são maiores para pretos/as e pardos/as, cujas probabilidades de contraírem a Covid-19 sobem para 14,8%. Outro dado revelador: pessoas brancas também são maioria entre as que puderam ser internadas, mas minoria entre as mortas. Nesta comunicação, pretendemos examinar como o contexto de pandemia tem exposto a mentalidade escravista da classe dominante brasileira.