Resumen de la Ponencia:
No Brasil, um grupo de pesquisadores tem se dedicado a pensar sobre novas possibilidades das cidades e do urbano que não estão diretamente associadas a cidades específicas, mas a um complexo urbano de cidades médias e pequenas, além de incluir territórios fronteiriços. Esse complexo urbano não é definido por cada unidade administrativa separadamente, mas pelas relações que essas cidades estabelecem entre si e pelas maneiras pelas quais pessoas e coletividades circulam e as classificam. Segundo esses pesquisadores, o complexo urbano aparece como uma única cidade na experiência de travestis que habitam a cidade, quando pensada a partir da estreita relação entre a gênero, produção de beleza, transformação corporal, economias sexuais e deslocamentos espaciais. Desse modo, corpo e espaço estão embutidos em um jogo permanente de desejo, consumo e mobilidade. E, assim, entre corpo e espaço, são produzidas subjetividades e afetividades. Nesse sentido, ofereço uma contribuição para essa proposta ao propor um diálogo entre este complexo urbano e as formas como as travestis se apropriam, experienciam e criam cidade. A pesquisa etnográfica realizada por mim entre 2016 e 2020 em três cidades brasileiras: São Carlos/SP, Franca/SP e Campo Grande/MS, ajudou a perceber que as travestis estão em constante deslocamento entre lugares e cidades. Ao longo desses deslocamentos elas desenvolvem uma epistemologia própria, a qual revela que a urbe das travestis é uma soma de cidades, um espaço contínuo que dissolve os lugares em imagens sucessivas de cidade. Decorrente da consideração das cidades na perspectiva das travestis, é possível pensar uma cidade que é um montante de outras cidades, um holograma construído pelas travestis que habitam a cidade para além dos limites geopolíticos, um espaço continuado. Ou ainda, uma cidade devir, uma cidade que se dá nos interstícios, não apenas localizada em um mapa político administrativo, mas em territorialidades que são feitas e refeitas por experiências urbanas materializadas dentro e fora das “cidades oficiais”, que tomam forma em sua mobilidade e heterogeneidade. Ou seja, a cidade travesti não é um palimpsesto, não é dada, imposta, mas construída nos movimentos. Com esse aporte, espero contribuir com os estudos sobre o urbano que consideram as transformações nos modos de vida e experiência urbana para reflexão sobre o passado, presente e futuro das cidades latino-americanas.