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GT_23- Sociología de la Educación y Políticas Educativas
#00729 |
Miradas infantiles en la construcción sociocultural de la escuela: la interpretación de la imagen como herramienta metodológica para comprender experiencias escolares.
En la experiencia humana el espacio es representado a través de imágenes para orientarnos en él. En el análisis social la imagen se considera como una de las manifestaciones humanas que juegan un papel crucial en el acto del comprender, al ser poseedoras de signos lingüísticos, símbolos, emociones, deseos y pasiones. De acuerdo con Diego Lizarazo, las imágenes pueden verse como construcciones cruciales de los pueblos y como figuraciones en las que se cristalizan cuestiones esenciales para las colectividades. La infancia recrea su mundo y sus vivificaciones en las imágenes que traza, y estas tienen implicaciones simbólicas, cognitivas y culturales importantes en la significación de niñas y niños en torno a sus vivencias.En este estudio se plantea como objeto de interpretación a las representaciones de la escuela en las infancias de comunidades rurales de Tamaulipas, México. El objetivo es comprender cómo representan las niñas y niños a la escuela de su comunidad rural, a partir de la realización de dibujos de su autoría. Esta labor se apoya metodológicamente en el esquema de interpretación del texto icónico, un instrumento propuesto por Diego Lizarazo fundamentado en los aportes de los teóricos de la hermenéutica contemporánea. La labor interpretativa a través de este esquema implicó identificar cuatro dimensiones: objetos representados, sujetos, espacios y acciones. La estrategia de campo fue el estudio de caso de una escuela multigrado del municipio de Ocampo. Participaron 30 niños de la primaria, que es su población total, dando como resultado el mismo número de dibujos. A partir de la interpretación de las imágenes se puede observar que las niñas y niños de las comunidades de estudio representan a la escuela como un espacio que les posibilita pertenecer a un mundo para socializar, jugar y aprender. No obstante, este aprendizaje es escindido; por un lado, se representa el conocimiento adquirido mediante los contenidos programado en los planes de clase y en los libros de texto y, por otro, el aprendizaje derivado de las actividades deportivas y lúdicas. Los niños no representaron objetos, situaciones o actantes de una vinculación con su comunidad, pero implícitamente se manifiesta que son ellos quienes construyen diariamente esa vinculación escolar-comunitaria a partir de sus aprendizajes, sus saberes, sus juegos colectivos. Hay una vinculación escuela-comunidad que pudiera tomarse como base para enriquecer los saberes escolares proyectados por la escuela, pero dicha relación se encuentra invisibilizada. Las escuelas en México se han olvidado de las necesidades particulares del aprendizaje infantil, sobre todo si se trata de alinearse a un programa educativo homogéneo para todos sin distinguir diferencias socioculturales que trazan a las escuelas rurales.
#01548 |
Por uma nova educação: As relações de poder no espaço escolar pela ótica cinematográfica
José Aparicio da Silva1
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Alfredo Cesar Antunes
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Constantino Ribeiro de Oliveira Junior
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1 - NÚCLEO DE PESQUISA ESPORTE, LAZER E SOCIEDADE/PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS/UEPG/BRASIL..
O espaço escolar, com seu aspecto disciplinar, é cerceado por inúmeras relações de poder. O cinema representou essas relações em diversas ocasiões. Considerando existir teóricos que propõem uma escola mais liberta, libertadora e libertária, este artigo analisa essa postura repressora imposta por essa instituição. Para tanto, reflete-se sobre os filmes: Nada de Novo no Front, de 1979, do diretor Delbert Mann, Estados Unidos, e Pink Floyd: The Wall, de Alan Parker, de 1982, Inglaterra, além do curta-metragem Escolas democráticas, de 2006. Este, um filme alemão do diretor Jan Gabert. Embora os enredos sejam encenados em três temporalidades distintas, eles se assemelham pela temática. Nada de novo no front tem o enredo na Primeira Guerra Mundial, enquanto Pink Floyd: The Wall, no contexto pós-Segunda Guerra, e Escolas Democráticas, no início do século XXI. Existem neles, ainda assim, práticas de uma escola e de uma educação coercitiva.
Introducción:
“Isto que eu vou ensinar serve pra quê? Eu diria que os professores teriam que fazer sempre essa pergunta.” Esta foi uma das provocações feita por Rubem Alves à Revista Digit@l, no programa Personagens. E continua ele: “era preciso que os professores parassem e dissessem: não vamos seguir o programa! Vamos fazer as coisas que são essenciais no ambiente em que a criança vive” (Mattos, 2011).
Assim descontextualizada, parece um tanto quanto anárquica a sua explanação. Entretanto Rubem Alves está propondo, nessa entrevista, a formação e um novo tipo de professor e uma nova educação. Baseado em seus estudos teóricos e práticos e no conhecimento que obteve na Escola da Ponte[1], ele propõe uma educação mais libertária, com uma aprendizagem que faça sentido para vida cotidiana do estudante.
A escola teria que ensinar liberdade e ações voltadas para a prática cotidiana. Segundo Rubem Alves, o objetivo da escola é “ensinar a criança a ter a alegria de pensar”. Uma escola sem os instrumentos de poder que limitam e inibem os estudantes. Sem notas e provas, “porque aquilo que o aluno produz numa prova não revela o que ele pensa”; ao invés de o professor estar à frente da sala “dando aula”, propõe que o professor esteja junto dos alunos, seja companheiro deles. Ao invés de o aluno ficar copiando, sugere que a aprendizagem seja para a vida, isto é, fazer o conhecimento científico ter utilidade no dia a dia (Mattos, 2011).
Essa seria a escola ideal. No entanto não é bem assim. Se recorrermos à história dessa instituição, notaremos que ela esteve intimamente ligada à manutenção da ordem e à reprodução do sistema, e para tanto estabelece relações de poder limitadoras.
Esse texto propõe-se a analisar o espaço[2] escolar e suas relações de poder a partir da ótica cinematográfica. Filmes representativos sobre a escola “pipocam” nos streamings. Se procurarmos, encontraremos dezenas deles. Entretanto, parafraseando Milton Santos[3], muitos desses filmes veem a escola como fábula; outros tantos, como perversidade (mais próximo da realidade); e alguns poucos deles pensam a escola como possibilidades, ou seja, por uma nova escola.
Recentemente, ao montar uma oficina sobre Cinema: escola, ensino e educação, elegi treze filmes que tinham essas temáticas em comum. Todos esses filmes direta ou indiretamente abordavam o espaço escolar.
O que era mais comum ainda neles? O fato de que todos representam relações de poder no âmbito escolar. A questão que se coloca: não é, simplesmente, o cinema que reflete as relações de poder, mas sim que a escola é, por excelência, um espaço de relações de poder e de constante disputas e tensões. A sétima arte imita a vida e vice-versa.
Sendo assim, trata-se dos temas o cinema, a escola e as relações de poder. Organizado da seguinte forma: A escola e as relações de poder e A representação das relações de poder no âmbito escolar pelos filmes escolhidos.
[1] Rubem Alves escreveu um livro chamado A escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir, no qual conta a experiência que obteve na vivência com estudantes e trabalhadores da educação na referida escola em Portugal.
[2] Espaço aqui utilizado na definição de Henri Lefebvre (1991). Para quem o espaço social é a condição, meio e produto de produção e reprodução da sociedade.
[3] Milton Santos, no livro Por uma nova globalização, caracteriza o mundo de três formas: “como fábula, como perversidade e como possibilidade”. A globalização como fábula, o mundo tal como nos fazem crer; a globalização como perversidade, o mundo como ele é, e, por fim, por uma outra globalização, o mundo como pode ser (Santos, 2003, pp. 9-10)
[4] Título original em inglês: Im Westen nichts Neues.
[5] Título original em alemão: Demokratischen Schulen.
Desarrollo:
A escola e as relações de poder
A escola, originária da Grécia Antiga, tem em sua etimologia “scholé, para entender a ideia de lazer, recreação ou tempo livre [...] para os gregos, a aprendizagem esteve relacionada à ideia de entretenimento [...] distanciando-se das obrigações e do trabalho” (Veschi, 2019).
Percebe-se, dessa maneira, que a escola, da sua origem, manteve o sentido elitista. Entretanto perdeu a noção de ócio criativo. Passou a ser disciplinar e, em muitos casos, recebe as conotações de labor, ofício, trabalho, dificuldade etc.
Com o advento da constituição dos Estados Modernos e a criação do aparato burocrático, criam-se novas instituições e se regulamentam as antigas, tal como a escola, por exemplo. Essa instituição, então, fica ao encargo de normatização, observadora das regras sociais.
Portanto, diz Phillippe Ariès (1978, p. 178), “antes do século XV, o estudante não estava submetido a uma autoridade disciplinar extracorporativa, a uma hierarquia escolar”. Ariès revela que, a partir desse contexto histórico,
[...] a missão dos mestres [ênfase adicionada] não consistia apenas em transmitir, como mais velhos diante dos companheiros mais jovens, os elementos de um conhecimento; eles deviam, além disso, e em primeiro lugar, formar os espíritos, inculcar virtudes, educar tanto quanto instruir (Ariès, 1978, p. 179).
Ariès (1978, p. 180) traz ainda que, com essa nova configuração da disciplina escolar, aparecem três características: “a vigilância constante, a delação erigida em princípio de governo e instituição, e a aplicação ampla de castigos corporais” [...] uma disciplina humilhante: o chicote ao critério do mestre e espionagem mútua em benefício do mestre”.
Para Norbert Elias, em suas teses da sociogênese e da psicogênese, o crescimento das “redes de interdependências”[1], a hierarquização funcional nas sociedades modernas e a incapacidade burguesa de ter a família como vigilante dos modos das crianças e jovens fizeram com que o papel da escola passasse a ser o de observar e regular o comportamento social.
Diz Elias (2018, pp. 118-119):
Devido a sua constituição biológica, não só é verdade que os homens estão mais aptos a aprender a controlar o seu comportamento do que qualquer outra criatura, como também que o seu comportamento deve trazer a marca daquilo que aprenderam. Os padrões de comportamento de uma criança não só podem mas devem evoluir muito por meio da aprendizagem, se é que a criança pretende sobreviver. “Comportamento” significa ajustamento a situações mutáveis.
Norbert Elias (1994), em O Processo Civilizador, relata que a sociogênese e a psicogênese se relacionam mutuamente. Os sujeitos e as instituições vão se modelando, em diferentes escalas de tempo e espaço, para assegurar as relações de poder. Os indivíduos introjetam essas regulações de comportamento e as repassam de forma sócio-hereditária, e assim se garante o controle das emoções.
A teoria dos processos de civilização proposta por Elias, baseia-se na defesa de que, toda e qualquer transformação ocorrida na estrutura da personalidade do ser individual (psicogênese), produz uma série de transformações na estrutura social em que o indivíduo está inserido. Da mesma maneira, as diversas transformações que ocorrem constantemente nas estruturas das sociedades (sociogênese), especialmente nas relações sociais, produzem alterações nas estruturas de personalidades dos seres individuais que a compõem (Brandão, 2000, pp.10-11).
Nesse sentido, a escola é, com primazia, o espaço para a criação e também para o repasse das normas e valores, éticos, morais e sociais. Consegue ela amenizar as tensões geradas pelas relações de interdependências.
É preciso notar que a burguesia, obrigada a recuar perante essas formas de associação do proletariado, fez tudo o que pôde para desligar esta força nova de uma fração do povo considerada como violenta, perigosa, sem respeito pela legalidade, disposta por conseguinte à sedição. Dentre todos os meios utilizados, houve alguns muito vastos (como a moral da escola primária, esse movimento que fazia passar toda uma ética através da alfabetização, a lei sob a letra) (Foucault, 2006, p. 31).
Então, a escola, que deveria ser o espaço de emancipação, de transformação social e, sobretudo, de aprendizagem, acaba sendo ela a reprodução do sistema social de controle, vigilância e punição. Foucault insere a escola entre as instituições de monitoramento dos sujeitos.
A escola, para Foucault, está na mesma linha da fábrica, do quartel, da prisão e o do hospício. Em seu livro Vigiar e punir, a despeito de seu subtítulo ser o nascimento da prisão, ele também trata da instituição Escola.
Para ele, Jeremy Bentham, na configuração do Panóptico, parte do “princípio da inspeção”, segundo a qual as pessoas tinham o sentimento de estarem constantemente vigiados.
O Panóptico de Bentham é a figura arquitetural dessa composição. O princípio é conhecido: na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre; esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas têm duas janelas, uma para o interior, correspondendo às janelas da torre; outra, que dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar. [...] . O dispositivo panóptico organiza unidades espaciais que permitem ver sem parar e reconhecer imediatamente. [...] E esta é a garantia da ordem. Se os detentos são condenados não há perigo de complô, de tentativa de evasão coletiva, projeto de novos crimes para o futuro, más influências recíprocas; se são doentes, não há perigo de contágio; loucos, não há risco de violências recíprocas; crianças, não há “cola”, nem barulho, nem conversa, nem dissipação (Foucault, 2001, pp. 165-166).
Mesmo que não haja literal, efetiva e concretamente um panóptico dentro da escola, ainda assim podemos percebê-lo como metáfora, na arquitetura, no design e nas expressões utilizadas em seu espaço.
As grades, os altos muros, portões com vigilantes, rígidos horários (sinal), postura punitiva, controladora, impositiva, o tempo do intervalo (prêmio), pedido de permissão para sair ou entrar em sala, para falar ou ir ao banheiro, disposição das carteiras enfileiradas em salas de aula, o tablado para o professor ficar mais alto que a turma, a janelinha de vidro na porta da sala... Além disso, temos os termos: controle da disciplina, dominar a turma, executar tarefas, fazer trabalhos, testes e provas, classificação por notas, correção, supervisão, inspeção, advertência, suspensão etc.
Há também “blocos” nos quais o ajuste das capacidades, os feixes de comunicação e as relações de poder constituem sistemas regulados e concordes. Seja, por exemplo, uma instituição escolar: sua organização espacial, o regulamento meticuloso que rege sua vida interior, as diferentes atividades aí organizadas, os diversos personagens que aí vivem e se encontram, cada um com uma função, um lugar, um rosto bem definido — tudo isto constitui um “bloco” de capacidade-comunicação poder. A atividade que assegura o aprendizado e a aquisição de aptidões ou de tipos de comportamento aí se desenvolve através de todo um conjunto de comunicações reguladas (lições, questões e respostas, ordens, exortações, signos codificados de obediência, marcas diferenciais do “valor” de cada um e dos níveis de saber) e através de toda uma série de procedimentos de poder (enclausuramento, vigilância. recompensa e punição, hierarquia piramidal) (Foucault, 1995, p. 241).
Esses mecanismos “disciplinares”, segundo Foucault (2006), funcionam na verdade como pequenos mecanismos penais, por isso propõe a ideia de uma “microfísica do poder”. As relações de poder são escalonadas na sociedade em instituições ou dentro de uma mesma, tal como acontece na escola, a título de exemplo.
A representação das relações de poder no âmbito escolar pelos filmes
O recorte em Nada de novo no Front (7’18’’ a 12’30’’) trata, de certo modo, dessa relação. Mas antes de descrever a cena, faz-se necessário uma apresentação. Nada de novo no front é um filme que possui duas edições, uma de 1930, dirigido por Lewis Milestone, e outra de 1979 (esta última aqui analisada), do diretor Delbert Mann.
É um homônimo do livro de Erich Maria Remarque, publicado em 1929. Esse livro trata do cotidiano dos jovens soldados alemães, incluindo ele próprio, durante a Primeira Guerra Mundial. Consta que Remarque escreveu esse livro a partir das anotações dos diários, feitas pelos soldados.
Com a ascensão do Partido Nazista na Alemanha, o livro foi proibido, e sua edição, incinerada. Era acusado de ser antipatriótico. Sua leitura desestimulava nos jovens o interesse pelo exército e pela guerra. Remarque foi exilado nos Estados Unidos, e lá seu livro foi reeditado e adaptado para o cinema.
Na cena em questão, após uma batalha de trincheiras, os soldados são surpreendidos numa emboscada francesa e precisam recuar. Nisso, um dos soldados leva um tiro na perna. Passado o sufoco, o jovem soldado Paul Bäumer respira, mais ou menos aliviado, e sussurra como quem pensa: “o que é que eu estou fazendo aqui? Como é que tudo isso começou?”. Nesse momento entra um flashback[2]. Bäumer se vê na escola, numa aula de história, com seu professor discursando calorosamente em favor da guerra e da gloriosa nação alemã. Enquanto isso, ele, distraidamente, desenha um pássaro que pousou na janela. Sua arte é interrompida, de forma abrupta, pelo professor que chama seu nome, em tom áspero, e acaba espantando também o pássaro.
Dessa cena decorre o seguinte diálogo:
Professor – Bäumer!?
Bäumer – Sim, Senhor.
Professor – O que é isso? (apontando para o desenho)
Bäumer – Um pássaro, Senhor.
Professor – Um pássaro. Um tordo?
Bäumer – Sim, Senhor. Um tordo. Ele estava na janela.
Professor – Muito bem. E essa linha é a janela.
Bäumer – Obrigado Senhor.
Professor – Mas você não vem à escola para desenhar, nem para escrever poemas, nem para sonhar. Não é, Bäumer?
Todos são dispensados da aula, menos Paul Bäumer, que fica para ouvir o sermão do professor. Fica nítido o papel da escola na sociedade: moldar os jovens para lutar na guerra. Para isso retira deles qualquer elemento que manifeste a subjetividade. Bäumer foi punido, pelo professor, por estar “divagando” da aula com seu desenho. A violência, nesse caso, foi simbólica. Bäumer não teve coragem, após a repreensão que levou, de recusar o alistamento voluntário e ir às trincheiras.
Imagem 1: Frame do filme Nada de novo no front, 1979.
O outro recorte fílmico que reflete essa relação de poder na escola trata-se da cena (21’ 13’’ a 28’ 09’’) de Pink Floyd: The Wall, mais precisamente quando decorrem as canções The happy days of our lives e Another brick in the wall II.
The Wall é um filme musical de 1982, baseado no álbum duplo, de mesmo nome, lançado pela banda Pink Floyd em 1979. Dirigido por Alan Parker e com os desenhos de Gerald Scarfe na animação. O roteiro, escrito por Roger Waters, faz-se autobiográfico, mas a linguagem do cinema chama de autoficção quando combinam-se elementos biográficos com outros criados de forma ficcional.
O filme, por meio das músicas, conta a história de Pink, um menino órfão paterno. Seu pai morreu enquanto lutava na Segunda Guerra Mundial. O filme perpassa a vida do personagem e seus conflitos com a família, com a escola, com a polícia, com a justiça e com o Estado.
No recorte selecionado, a crítica é direta para a escola. A escola é comparada com uma fábrica, linha de produção em série. Os alunos são uniformizados. Para criticar a perda da identidade dentro da escola, a cena traz todos com máscaras, absolutamente iguais, marchando diretamente para um moedor de carne. “Afinal, você é apenas mais um tijolo no muro.”
A canção, entoada em coro pelos estudantes, diz o seguinte em suas legendas: “Não precisamos de educação! Não precisamos que nos controlem, e nem de sarcasmo na sala de aula. Professor, deixe as crianças em paz!” (PINK FLOYD, The Wall, Alan Parker, 1982).
Pink, brincando nos trilhos com amigos, vê-se apavorado quando lembra do seu professor. Sua memória remete-lhe à classe. Lá, em meio a uma aula de Geometria, o professor lhe toma um papel de anotações e parte para a humilhação. Diz o texto narrado pelo personagem professor:
— O que temos aqui mocinha? Escritos misteriosos? — Um código secreto? — Não. Poemas, nada mais. — Poemas pessoal. (todos riem) — A garotinha aqui se acha um poeta. O professor lê seu poema em voz alta e depois conclui: — Absolutamente ridículo, mocinha! Bate-lhe na mão com sua própria régua. — Volte ao seu trabalho! E, assim continua a aula normalmente. — Repitam depois de mim: um Acre é um retângulo, cuja área é um centésimo e é apenas uma medida [...] e blah, blah, blah... [ênfase adicionada] (PINK FLOYD, The Wall, Alan Parker, 1982).
A violência, aqui, é física e simbólica. O professor efetivamente bate no aluno. Além disso, humilha-o por escrever poemas. Poemas são para meninas! Está implícito no discurso do professor, ao chamá-lo de mocinha. Assim como no filme Nada de novo no front, a escola, nesse caso, tem o papel de coibir qualquer traço de subjetividade nos estudantes.
Enquanto a aula segue, com o decoro e repetição, o menino fica imaginando a possível reação. Destroem a escola, amontoam os móveis, ateiam fogo e partem para cima do professor, arrastando-o até o fogo. Porém, antes de executar o ato final, a sua imaginação é despertada pelo sinal do intervalo.
Como já dito anteriormente, para Foucault (2006), o controle, o poder, a dominação têm escalas múltiplas. Por isso na cena do filme The Wall, o indivíduo-professor que sofre um abuso na relação de poder pela mulher dentro do espaço doméstico — família — exerce esse mesmo abuso na relação sobre os alunos no espaço escolar — escola.
Imagem 2: Frame do filme Pink Floyd, The Wall, 1982.
O curta-metragem Escolas democráticas, por sua vez, é um filme alemão híbrido, que mescla pessoas reais com animação. Esse curta, na realidade, é um trecho retirado e editado de um filme documentário/ficcional de mesmo nome, também dirigido por Jan Gabert e animado por Ellen Stein em 2006. Em seus 6’ 09’’ de duração faz uma dura crítica à instituição Escola e sua dinâmica de produção no dia a dia.
Curiosa e propositadamente, o filme começa com os estudantes, pessoas reais, entrando na escola, e termina com esses mesmos estudantes saindo dela, alegremente. Porém, dentro do espaço escolar, são transformados em bonecos, análogos a fantoches, muito parecidos uns com os outros, simbolizando a perda da singularidade identitária.
O filme faz um desfile de relações de poder sobre os alunos: aulas passivas de 45 minutos cada, marcada por um sino estridente para que os alunos troquem de sala e, consequentemente, de matéria e professor.
A aula de matemática é “decoreba” de regras e fórmulas que o professor escreve no quadro e os alunos copiam; a de leitura é com a professora lendo e os alunos ouvindo; na de música, a professora toca piano para os alunos, que a ouvem inertemente; e, na aula de biologia, a professora espanta uma borboleta da janela, porque, ironicamente, estava tirando a atenção de uma estudante que deixava de “aprender” a estrutura corpórea de uma borboleta desenhada, com giz, na lousa.
Aí vem o intervalo. O merecido recreio. Mas apenas para aqueles que foram bem comportados. Os que não tiveram esse mérito ficam presos, dentro da escola, com o inspetor. O intervalo soa como se fosse o direito ao banho de sol pelo detento de bom comportamento. Interessante notar que de recreação da origem grega de escola só ficou mesmo esse pequeno intervalo. O restante do tempo escolar é todo trabalho.
A crítica mais marcante é em relação ao sistema tradicional de avaliação. Os alunos “inteligentemente” copiam em seus cadernos os conteúdos e depois devolvem na prova, para o professor, aquilo que decoraram. Numa espécie de “caderno cheio, cabeça vazia”.
No filme, essa educação bancária[3], no dizer de Paulo Freire, é representado pela cor azul. Os alunos abrem a cabeça, depositam o líquido azul e, no dia da prova, esvaziam-na, voltando ao estado normal, vazio. O professor é o único detentor de conhecimento. Aos estudantes, sobra apenas a possibilidade remota de tentar adivinhar o que ele pensa, pois ali estaria a resposta correta.
Com a descrição acima, pode-se pensar que o título do filme, Escolas democráticas, é irônico. Mas não. Não é! O média-metragem por inteiro tem a intenção de criticar esse modelo de escola. Propõe uma nova escola, baseado em decisões coletivas. A sinopse do filme diz o seguinte:
Nas escolas democráticas, os alunos podem decidir por si mesmos o que e como aprender. Não há currículos lá, não há notas e exames são voluntários. Alunos e professores têm os mesmos direitos e organizam sua escola juntos. Todos têm voz nas decisões. Isso pode ir bem? Escolas Democráticas - Um filme sobre a vontade de aprender (Escolas Democráticas, Jan Gabert, 2006 ).
Imagem 3: Frame do filme Escolas democráticas, 2006.
O notável na análise desses três filmes é que as relações de poder, dentro do espaço escolar, têm funções bem definidas para com os jovens. O “adestramento do corpo e da mente; dominação e controle, a fim de corrigir as divergências” (Foucault, 2001, p. 148), tais como:
[...] tempo (atrasos, ausências, interrupções das tarefas), da atividade (desatenção, negligência, falta de zelo), da maneira de ser (grosseria, desobediência), dos discursos (tagarelice, insolência), do corpo (atitudes “incorretas”, gestos não conformes, sujeira), da sexualidade (imodéstia, indecência).
A Escola, portanto, é um espaço de docilização do corpo. No Brasil, desde a educação jesuíta, imposta aos nativos, já tinha esse sentido. O índio catequisado, segundo o discurso dos padres, tornava-se mais dócil. Não importando o grau de violência física e simbólica que lhe era atribuído. E, nesse sentido, parece que a escola acompanhou o modelo para manter a “cordialidade”.
Tem-se, pelos filmes aqui representados, aos estudantes, o propósito de moldar suas condutas, disciplinar seus comportamentos, formar, formatar, modelar, remodelar.
Embora os enredos dos filmes sejam encenados em três temporalidades distintas, eles se assemelham pela temática. Nada de novo no front tem o enredo na Primeira Guerra Mundial, Pink Floyd: The Wall, no contexto pós-Segunda Guerra, e Escolas Democráticas, no início do século XXI. Existem neles, ainda assim, remanescentes de educação coercitiva, punitiva, vexatória e sarcástica.
[1] Norbert Elias propõe uma análise sociológica em que o modelo deixe de ser egocêntrico, o qual ele chama de tradicional, e passe a ser pensando por teias de interdependências. “Estas concepções tradicionais serão substituídas por uma visão mais realista das pessoas, que através das suas disposições e inclinações básicas são orientadas umas para as outras e unidas umas às outras das mais diversas maneiras [...] tais como famílias, escolas, cidades, estratos sociais ou estados” (Elias, 2018, p. 15).
[2] O cinema consegue dar visibilidade para a memória. Ao remeter às lembranças de um personagem, com a técnica do flashback faz com que o espectador tenha acesso às imagens do passado na história que está sendo contada.
[3] “Paulo Freire deu o nome de educação bancária, por oposição a uma educação libertadora. [...] Para ele, aula é adjetivada com qualificativos tais como ‘expositiva’, “passiva’, ‘alienante’, etc., para se referir às atividades da educação bancária” (Dicionário Paulo Freire, 2010, pp. 95 e 123).
Conclusiones:
Sempre faço perguntas provocadoras aos alunos. Pergunto-lhes: por que vocês não apanham na escola? Por que os professores não batem mais nos alunos? As respostas são muitas e das mais variadas ordens. Vão de questões legais a morais. Mas, independentemente de as respostas estarem corretas, eu faço a retórica: “Vocês não apanham mais na escola porque muita gente já apanhou por vocês!”
É certo que temos avanços na educação. Mas ainda se tem muito a percorrer para uma nova educação e uma nova escola. Com mais liberdade, libertadora e libertária.
Por fim, voltando ao ponto de partida, vale lembrar que a escola pode ser democrática. E, além disso, pode ter finalidade prática voltada para as ações do cotidiano.
Paulo Freire defendia a horizontalidade em oposição à educação vertical que hierarquiza a sociedade e acirra as desigualdades. A jornalista Angela Pinho fez uma síntese interessante da Pedagogia do Oprimido, uma das principais obras de Paulo Freire. Diz ela que, “de forma bem resumida, o cerne da teoria de Freire é que a educação é uma ferramenta contra a opressão e que qualquer processo educacional deve partir da realidade do próprio aluno” (Pinho, 2021).
Para isso é necessário que a educação seja um canal para a libertação. Mas, como diz o poema Romanceiro da Inconfidência, de Cecília Meirelles[1], “liberdade é uma palavra que sonho humano alimenta: que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda!”
“Poucas pessoas desejavam ser libertas, menos ainda estavam dispostas a agir para isso, e virtualmente ninguém tinha certeza de como a ‘libertação da sociedade’ poderia distinguir-se do estado em que se encontrava” (Bauman, 2001, pp. 25-26).
Bauman, nesse trecho, amparado em Marcuse, analisa com receio a ideia da libertação da sociedade. Diz ele que, nos anos 80 do século XX, passadas três décadas das lutas por liberdades e direitos individuais e de grupos, a libertação não ocorreu efetivamente por falta de “base de massas”. E ainda, afirma Bauman (2001, p. 29): “o tipo de liberdade louvada pelos libertários não é, ao contrário do que eles dizem, uma garantia de felicidade. Vai trazer mais tristeza que alegria”.
Byung-Chul Han reflete que o panóptico de Betham fora substituído por um novo tipo, o panóptico digital. Este causa a sensação de liberdade e transparência, mas, no final das contas, é tão controlador e vigilante quanto o antigo.
O panóptico digital surge agora totalmente desprovido de qualquer ótica perspectivística, e isso é que constitui o seu fator de eficiência [...] visto que é possível ser iluminado e tornado transparente, a partir de todos os lugares, por cada um. [...] Todos controlam todos [...] Cada um e todos são expostos a visibilidade e ao controle [...] (HAN, 2017a, p. 106; pp 109-110).
Han vê com ressalvas essa troca do controle por uma pseudoautonomia. Considera uma cilada a ideia de falsa liberdade ou uma liberdade controlada.
A sociedade do século XXI não é mais a sociedade disciplinar, mas uma sociedade de desempenho. Também seus habitantes não se chamam mais sujeitos de obediência, mas sujeitos de desempenho e produção. são empresários de si mesmos. [...] A sociedade disciplinar ainda está dominada pelo não. Sua negatividade gera loucos e delinquentes. A sociedade do desempenho, ao contrário, produz depressivos e fracassados (Han, 2017b, pp. 24-26).
Contudo, embora haja esses debates referentes aos meandros da passagem de um tipo de sociedade a outra, com maior ou menor liberdade social, existem opções. Tratando-se de sistema educacional, parece existir ideologicamente uma orientação segmentária: enquanto as crianças mais elitizadas aprendem de forma libertária, com a práxis Rubem Alves, método Paulo Freire, pedagogia Waldorf, ou ainda pelo modelo sociocrítico de Educação para a Paz, aos demais oferecem instrução disciplinar em escolas de ofícios ou cívico-militares.
Porém, entre esses que analisam a sociedade de forma pessimista, niilista e até mesmo fatalista, ainda tem-se a esperança.
Após a Revolução, “no curso do desenvolvimento”, depois que o bem-estar for redistribuído, depois que os privilégios de classe forem eliminados, depois que a educação for livre e universal [ênfase adicionada], e os trabalhadores puderem controlar os meios pelos quais o trabalho será organizado, então — assim profetiza Marx no clímax do Manifesto — então, finalmente (BERMAN, 2007, p. 120) em lugar da velha sociedade burguesa, com suas classes e seu antagonismo de classes, teremos uma associação em que o livre desenvolvimento de cada um será a condição para o livre desenvolvimento de todos [ênfase adicionada] (Marx, 1888, p. 353 como citado em Berman, 2007, p. 120).
Sendo assim, faz-se necessário manter viva a “utopia” com possibilidades. Por uma nova escola, por uma nova educação, para que possamos ter uma nova sociedade, uma “sociedade alternativa”.
[1] Citado aqui tal qual ao roteiro do filme Ilha das Flores, de Jorge Furtado, 1989, p. 10.
Bibliografía:
Ariès, P. (1978). História Social da criança e da família. Rio de Janeiro: Guanabara.
Bakhtin, M. (2003). Estética da criação verbal (4a ed.). São Paulo: Martins Fontes.
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Palabras clave:
cinema; escola; educação.
#02059 |
A 'Reprodução' a partir da 'Distinção': construção do professor universitário de música no Brasil
Egresso de um currículo universitário comum a muitos cursos de música no Brasil, o professor universitário desses cursos é fruto do processo de ensino que mantém forte a presença de um habitus conservatorial (PEREIRA, 2013) na estrutura do ensino superior. Ao integrar-se profissionalmente como docente em uma instituição universitária, este profissional mantém-se reproduzindo o mesmo sistema curricular, perpetuando uma dinâmica de exclusão baseada em hierarquias estéticas. O ensino superior de música no Brasil apresenta-se em dois graus distintos: bacharelado e licenciatura. Na modalidade "bacharelado", o objetivo do curso é voltado à formação profissional de músicos. A proposta do egresso do curso "licenciatura" é habilitá-lo à docência na educação básica, prioritariamente. A comunidade escolar no Brasil é formada por crianças e jovens com diferentes influências musicais. Com essa pluralidade musical, o licenciado em música se vê desafiado a desenvolver seu trabalho com variadas expressões artísticas periféricas. Com cursos superiores que reforçam um modelo curricular conservatorial, pergunta-se: de que maneira esse professor universitário, atuando na formação de professores à educação básica, permanece refletindo e reforçando um modelo de currículo tradicional? Este artigo visa situar a problemática da música erudita como central no currículo do ensino superior de música no Brasil por seu contexto sociológico, de modo a permitir uma reflexão sobre a atuação docente da educação musical como um mecanismo de reprodução social. A partir de currículos de cursos de licenciatura em música no Brasil, demonstra-se que o habitus conservatorial não é uma ocorrência isolada, mas faz parte da ordem social mais ampla. O valor institucional dado a certas músicas em detrimento de outras, são moldados por desigualdades. Os professores formadores como grupos dominados, que internalizam as lógicas de um currículo dominante, reproduzem e reforçam a música erudita como centro em seu currículo. Dessa forma, a partir de "A Distinção" (BOURDIEU, 2011) que "A Reprodução" (BOURDIEU, 2020) mostra o habitus conservatorial do ensino superior com uma educação musical que dificulta a expansão de uma prática musical acessível e integradora em outros campos educativos. A insistência em hierarquias de gosto na centralidade do currículo influenciam em como as pessoas se envolvem com a música. A inserção de uma prática de ensino a partir de um conteúdo artístico central, reforça e mantém o seu capital cultural. Com isso, a reprodução do habitus conservatorial é reforçado no currículo do ensino superior e na constituição profissional do professor formador. Uma prática musical mais restrita não limita apenas o potencial para discussões sobre gostos e educação musical, mas instiga a exclusão de grupos que representam atividades artísticas periféricas. Se o professor formador constitui-se de um agente autônomo, poderá ampliar a possibilidade da (re)construção de um currículo plural, reduzindo o distanciamento provocados pelas hierarquias culturais no ensino musical.
#02474 |
Sociologia, música e prática educativa: uma experiência em tempos de Pandemia
Cilene Maria Valente da Silva1
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Lorena Bischoff Trescastro
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1 - SEDUC - Secretaria Estadual de Educação.2 - SEMEC - Secretaria Municipal de Educação.
Sociologia, música e prática educativa: uma experiencia em tempos de PandemiaGT23 – Sociología de la Educación y Políticas EducativasO presente trabalho foi desenvolvido nas aulas online de Sociologia durante a Pandemia. Considerando que os alunos se mostravam dispersos, ausentes nada receptivos as análises sociológicas, utilizamos a música como estratégia na prática educativa. Tendo como suporte o que diz Anne Marie Green (2000), a música é um objeto complexo por se tratar de um fato social total que coloca em jogo e combina aspectos técnicos, sociais, culturais e econômicos. Assim propusemos o seguinte objetivo: desenvolver a concentração, a criatividade e estimular a aprendizagem, a prática educativa nas aulas de Sociologia. A experiência foi desenvolvida nas Escolas: Estadual de Ensino Médio Profa. Albanizia de Oliveira Lima e Escola Prof. Pedro Amazonas Pedroso, que integram a Rede Pública de Belém do Pará – Brasil, envolvendo seis turmas, com 30 alunos cada, de fevereiro a setembro de 2021 através da plataforma Google Meet. As aulas tinham o tempo de 1h, aconteciam uma vez por semana em cada turma e foi apresentada uma música por aula. As músicas eram veiculadas sem explicações. Utilizamos os diversos gêneros musicais: Clássico, Reggae, Funk, Música Popular Brasileira, Pisadinha, Rock, Rock POP. Após a veiculação da música, interagíamos com os alunos questionando sobre se já tinham escutado, autoria, gênero musical, e mensagem? A partir do quarto encontro observamos que os alunos não se atrasavam mais para entrar no horário da aula, que interagiam um com os outros sobre o som( era como se referiam a música), também começaram a sugerir a música que queriam ouvir, assim seus diversos gostos musicais ficaram evidentes como fala Bozon (2000), “a prática musical é um “fenômeno transversal, que perpassa toda a sociedade” e que “constitui um dos domínios onde as diferenças sociais ordenam-se da maneira mais clássica e marcante...”(p. 147). Essa diversidade em evidência causou discussões acirradas entre os alunos, foi observado também, que os alunos foram evoluindo em decifrar as mensagem das letras das músicas veiculadas, assim podíamos observar três situações referentes as músicas trabalhadas: músicas que os alunos nunca tinham ouvido, música que os alunos já tinham escutado mas não entendiam, músicas que os alunos gostavam e já conheciam em suas relações com a prática social, essa perspectiva revelou “por que estudantes de diferentes grupos se envolvem em certas práticas musicais, por que evitam outras e como respondem à música na sala de aula” (GREEN, 1997, p. 33) permitindo análises sociológicas e a abordagem de conceitos de seus conteúdos escolares. A música contribui também para deixar a aula mais alegre e receptiva, proporcionando um ambiente acolhedor e receptivo, reduzindo a tensão em momentos de atividades e de avaliação.
#02692 |
A construção de pensamento crítico através da interseccionalidade de gênero, racialização e classe: uma pesquisa em Educação Musical
Esta apresentação tem como fundo ético-político-pedagógico, a crença na suprema importância e necessidade de toda ação educativa/formativa construir pensamento crítico. Na América Latina vemos isto como urgente, tanto quanto viável através de toda e qualquer área do conhecimento. É o que propõe a pesquisa em andamento, que desenvolvemos no âmbito da Educação Musical, particularmente na formação crítica de professoras/es de música. O objetivo central da pesquisa é verificar a prática docente, na atualidade, de egressos do curso de Licenciatura em Música da UDESC, formados de 2014 a 2017. Este período de abrangência se define pela participação e autoria dos sujeitos na elaboração e realização de projetos temáticos de problematização da cultura hegemônica, na disciplina curricular obrigatória nominada “Projetos em Educação Musical”, na qual um dos objetivos centrais era (e é) a promoção de pensamento crítico para uma educação musical descolonial. Os procedimentos metodológicos são entrevistas semi-estruturadas, individuais, via formulários escritos, e de grupos focais em encontros remotos via internet e presenciais. A pesquisa iniciou em agosto de 2021 e tem término previsto para setembro de 2023. Propomos um recorte da referida pesquisa para abordar no Congresso ALAS 2022: verificar e descrever, a partir da prática docente dos egressos, modos de se interseccionar as chamadas identidades sociais de gênero, racialização e classe, como categorias de análise de contextos locais de práticas musicais, associando-as a desigualdades sociais estruturais mais amplas.Teórica e conceitualmente, a presente pesquisa se fundamenta nas Teorias Decoloniais (MIGNOLO, 2017; QUIJANO, 2010; GENTILI, 1995), na Pedagogia Crítica (FREIRE, 1967; HOOKS, 2019) e na interseccionalidade e feminismos (LUGONES, 2018; CRENSHAW, 1989). Dada a barbárie social e crise humanitária em que nos encontramos na contemporaneidade, se pretende averiguar entre estudantes egressas/os, em que medida a formação dada pela universidade, e nela, a disciplina Projetos em Educação Musical pode ser identificada na atuação músico pedagógica das/os profissionais em atuação no mercado de trabalho.Considerando-se a população majoritariamente branca no estado de Santa Catarina, e dado o racismo tão pulsante nos dia atuais no Brasil e América Latina, se abordará com os egressos, por exemplo, a racialização que nasce com a modernidade/colonialismo/patriarcal/ escravagista. Se procurará conhecer questões como: de que saberes lançam mão, ao se depararem com uma circunstância pedagógica que envolve racismo? De que argumentos lançam mão, ao se depararem com desigualdades de gênero? As enfrentam? Ou são induzidos pela ambiência ideológica da escola a aceitar como naturais? Que critérios balizam suas escolhas de repertórios musicais e modos de abordá-los?Palavras-chave: Pensamento crítico; interseccionalidade; educação musical descolonial.
#03833 |
Trajetórias de estudantes na educação superior: diversificação de públicos, contradições culturais e projetos de futuro
Celia Caregnato1
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Julio Cesar Baldasso
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Murilo Marreco Pedroso
1
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Lourenço Brito Felin
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Este trabalho discute aspectos das trajetórias estudantis na educação superior brasileira. O contexto no qual se situa o tema é da ampliação do acesso a esse nível educacional nas últimas duas décadas e suas interconexões com as crises mais amplas. De um lado, os estudantes que antes não acessavam o sistema, passaram a fazê-lo a partir de políticas de ações afirmativas tornando a composição das instituições mais diversificadas. De outro lado, a crise sanitária internacional gerou consequências marcantes para a vida estudantil, mas também a crise política nacional e suas consequências econômicas. O objetivo deste trabalho é analisar como os estudantes mobilizam recursos materiais e códigos culturais, lidando com o processo de socialização acadêmica e de formação superior e com vistas as possibilidades futuras. Colocamos atenção sobre as trajetórias dos estudantes, o modo como disputam em contextos adversos, assim como produzem projetos ou expectativas de futuro baseados nos recursos que possuem, no trabalho de produção de si por meio de laços sociais que mobilizam (Colombo, Rebughini, Domaneschi, 2021). O contexto que debilita também provoca processos de reflexividade de indivíduos, grupos e instituições, gera desacomodações e produz possibilidades. A partir de aportes da teoria disposicional da prática (Bourdieu,2001 e Lahire, 2004) e da teoria da crítica (Boltanski, 2010), analisamos o modo como os estudantes constroem suas trajetórias universitárias e como produzem reflexividades e expectativas de futuro em horizontes mais ou menos delimitados na relação com suas experiencias de formação na universidade. Em termos metodológicos a apresentação tem por base dois tipos de dados que foram produzidos no âmbito do grupo de pesquisa sobre socialização acadêmica dos estudantes. Primeiro, um survey realizado em uma universidade pública do Sul país com 1.463 respostas que abarcam aspectos das condições estudantis, do modo de estar na universidade e dos elementos de capital cultural que mobilizam para desenvolver seus programas de formação na universidade. Em segundo lugar, baseamos a análise em um conjunto de mais de uma dezena de entrevistas realizadas com o objetivo de dialogar com achados quantitativos. Neste caso conseguimos interpretar com mais detalhes as alternativas criadas, as dificuldades enfrentadas e os recursos que dispõem para mobilizar-se de modo a integrar-se e/ou a enfrentar lógicas institucionais e sociais. Os achados até aqui permitem formular a hipótese de que os modos tradicionais de entender a produção de capital cultural e de usufruir de recursos simbólicos disponibilizados para elites, convivem com recursos elaborados a partir de experiências singulares em relações sociais disponibilizadas para não herdeiros e instigam tanto a integração à universidade como o enfrentamento diante de regras consideradas estranhas.
#04169 |
A GEOPOLITICA DO ENSINO DAS MÚSICAS ANDINAS NO PERU: Um estudo sobre as ausências epistemológicas musicaisEsse trabalho objetiva investigar a geopolítica do ensino de música no Peru, a partir da análise dos currículos das escolas superiores de músi
A GEOPOLITICA DO ENSINO DAS MÚSICAS ANDINAS NO PERU: Um estudo sobre as ausências epistemológicas musicaisEsse trabalho objetiva investigar a geopolítica do ensino de música no Peru, a partir da análise dos currículos das escolas superiores de música, focalizando-se no Conservatorio Nacional de Música (CNM) e na Escuela de Música de la Facultad de Artes Escénicas de la PUC-Perú. O aumento do ensino da música ocidental se fortalece frente às músicas andinas tradicionais, mal compreendidas como folklore e, portanto, não presentes nas instituições de ensino superior. As suas ausências fazem com que o ensino e a prática da música se concentrem especificamente nos processos de ensino e aprendizagem da música ocidental, que se sobrepõe às músicas andinas, minimizando seu valor social, cultural e educacional. Para analisar essas ausências epistemológicas, se faz uma análise documental dos currículos da educação superior relacionados à formação profissional musical, já que se considera que essa não-presença da cultura musical andina está relacionada à geopolítica do ensino de música, sendo desvalorizada pelo mesmo processo colonizador que reproduz e naturaliza o sistema ocidentalista dominador sobre a cultura andina. Para isso, abordamos a pesquisa documental e apresentamos alguns dos documentos e ordenamentos legais (tais como leis, decretos, resoluções etc.) que fizeram parte desta investigação da geopolítica do ensino de música no Peru, assim como os documentos oficiais e legais das instituições mencionadas, as suas propostas metodológicas de ensino e os seus planos de estudos curriculares. Nesse sentido, tentamos analisar a discursividade sobre os currículos de ambas as instituições com o propósito de dialogar sobre a geopolítica do ensino de música no Peru e assim identificar o lugar do ensino das músicas andinas nessas propostas curriculares. O discurso analisado está baseado nos aportes metodológicos de Foucault como propostas para repensar a construção dos enunciados e dos sistemas de pensamentos que a história validou como verdade. Desta forma Foucault (1970) postula que esses sistemas de pensamento não são o reflexo de uma epistemologia ou de uma história das ciências, mas que são formações discursivas que se originam e se legitimam em uma época, espaço e tempo particular, em uma população específica que, porém, à sua vez, se transformam através do tempo, se constituem a partir de desfases, de sistemas de diferenciação com relação a outros discursos, de processos econômicos, de instituições e de relações sociais. Portanto, se demostra que a modernidade/colonialidade ainda é uma epistemologia dominante na academia.Palavras-chave: Geopolítica do ensino (conhecimento), músicas andinas, currículos, formação profissional, análise discursiva
#04671 |
Jóvenes, movilidades y espacios: producir cortos audiovisuales en la escuela secundaria
Debates acerca de las dimensiones espacio-temporales y vinculares en el análisis de lo escolar ocuparon un lugar significativo durante la pandemia por COVID-19. Sin embargo, tales discusiones no resultan novedosas en los estudios sobre los procesos educativos. En los últimos años se advierten tensiones en torno a las crisis de modelos tradicionales limitados a los espacios áulicos, las clases expositivas y el lugar de la/el estudiante como sujeto pasivo y receptor de conocimientos; así como los efectos del uso de nuevas tecnologías y la necesidad de generar mayor interés y motivación entre jóvenes estudiantes.Retomando los aportes del enfoque de las movilidades y de las geografías emocionales se propone discutir acerca de las posibles (re)configuraciones de los espacios escolares que potencian las actividades artísticas -especialmente aquellas que implican movimiento, físico y emocional- como es el caso del teatro. Para ello, propongo indagar acerca de las significaciones, emociones y prácticas que despliegan jóvenes estudiantes en torno a la producción de lo espacial y la relación entre movilidades e inmovilidades a partir de una propuesta educativa de creación de cortos audiovisuales en una escuela secundaria situada en el sur de la Ciudad Autónoma de Buenos Aires. Desde una estrategia cualitativa, utilizando observación participante y análisis de documentos audiovisuales para la construcción de datos empíricos, se analizan los registros de campo y los videos (cortos) generados en el marco de un taller de teatro, con el uso de celulares, por parte de estudiantes del primer año de dicha escuela, que fue desarrollado entre mayo y diciembre de 2019.