Resumen de la Ponencia:
Neste texto, aborda-se a problemática da migração internacional e da pobreza a partir da análise de matérias jornalísticas, veiculadas em mídias digitais, sobre a presença migrante em Fortaleza, no estado do Ceará, Brasil. Busca-se identificar as classificações sociais em torno da figura do imigrante em condição de pobreza difundidas pelos jornais digitais que circulam na capital cearense. Para tal, parte-se da seguinte pergunta: Quais e de que maneira as classificações sociais, veiculadas em meios de comunicação de massa, homogeneízam e/ou diferenciam a condição do imigrante pobre?. Parte-se do pressuposto de que, nos últimos anos, a presença migrante na capital cearense tem suscitado recorrentes representações difundidas pelos meios de comunicação que apontam, sobretudo, as condições de vida e de trabalho dos imigrantes, as ações no âmbito da assistência pública e da atuação solidária de entidades da sociedade civil na provisão de serviços e recursos assistenciais. Situando essa proposta no domínio da pesquisa qualitativa, utiliza-se como recursos metodológicos a técnica de análise do discurso de textos jornalísticos que abordam a temática da migração, relação de assistência, pobreza e Estado. Coletou-se notícias publicadas entre os anos 2018 e 2022 disponíveis no acervo digital dos Jornais O Povo, O Estado e Diário do Nordeste que tratam das vivências dos imigrantes em território brasileiro. Dialogando com os estudos sobre os emissores midiáticos, compreende-se que a linguagem é um meio de refletir e descrever o mundo, situando-se como prática social. Desde modo, observa-se que essas matérias jornalísticas põem em movimento mecanismos de construção de imagens sobre os estrangeiros que os associam, em sua maioria, à pobreza, à busca de melhores condições de vida e de trabalho. Estes discursos produzidos pelos meios de comunicação em massa são construídos em função da ressignificação que são feitas do imigrante. É dominante, nestas matérias, a figura de um sujeito ambivalente, que une dimensões contrárias de partida e chegada, pertencimento e não pertencimento. Estas representações entrelaçam-se com processos de marginalização, desqualificação social e estigmatização dos imigrantes. Neste cenário, conclui-se que diferenças, desigualdades e discriminações imbricam-se na experiência dos imigrantes em situação de pobreza. Os imigrantes são vistos como ameaças a cultura ou as tradições, a partir de um distanciamento em relação ao “outro”, onde as fronteiras físicas e simbólicas entre “nós” e “eles” são cada vez mais ambivalentes.
Introducción:
A migração é um fenômeno longínquo, presente na história do ser humano. Com as transformações geradas pela globalização contemporânea, observa-se uma intensificação dos deslocamentos populacionais e dos intercâmbios culturais, os quais assumem distintos contornos. Situando os movimentos migratórios internacionais a partir do processo de reestruturação produtiva e do atual contexto da globalização, em suas múltiplas dimensões e desdobramentos, pode-se dizer que o aumento do volume e significância das migrações internacionais refletem as mudanças sociais, políticas, econômicas, demográficas e culturais que englobam a transnacionalização das fronteiras nacionais. Assim, impulsionado pelas duas guerras mundiais, decolonização e guerra fria, o século XX é considerado a “época da migração" (Castles & Miller; 2009).
Ao buscar compreender o fenômeno da imigração em sua totalidade, Sayad (1998) discorre que as condições que levam a migração e as formas de inserção do migrante no país receptor são consequências, sobretudo, das precárias condições de sobrevivência dos imigrantes em seus países de origem. Para este, a migração é vista como processo total, pois se deve considerar sua perspectiva histórica, política e as estruturas presentes no funcionamento da sociedade. Fato que os fazem compor a categoria de emigrantes (de lá) e de imigrantes (aqui), constituindo paradoxalmente sua condição existencial. Os imigrantes em situação de pobreza ao chegar aos países receptores, muitas vezes, são utilizados como força de trabalho e percebidos pelos nativos como um "problema", atrelado à noção de geradores de despesas sociais, ameaças à cultura e tradição instituída.
Pierre Bourdieu, em prefácio de A Imigração ou os paradoxos da alteridade (1998) de autoria de Abdelmalek Sayad, destaca que a condição de “ser imigrante” tem implicações culturais e identitárias, pois “o imigrante pode estar em um lugar onde não é nem cidadão, nem estrangeiro”. Essa condição do imigrante atrelada ao deslocamento, mobilidade e movimento, sucinta à necessidade de pensar os fundamentos de cidadania e do Estado, haja vista que o imigrante demanda do Estado uma série de condições jurídicas, sociais, civis e econômicas, que reverberam nas políticas públicas, no que se costuma classificar como problemas de imigração.
Por conseguinte, a própria natureza da imigração só pode ser captada através dos diferentes problemas que se encontra associada (Sayad, 1998), com destaque para pobreza. Esta condição de “deslocado” do imigrante impõe dificuldades de análise, até mesmo para as ciências, que porventura incorporam as visões ou representações dos órgãos oficiais. Quanto a isto, Bourdieu (1998) alerta que as pesquisas que abrangeriam os chamados problemas da imigração deveriam voltar-se ao olhar sobre a experiência social do imigrante, a fim de aprofundar questões mais íntimas da condição do estrangeiro, abrangendo as causas e os motivos que teriam determinado suas partidas dos países de origem e a diversidade de suas condições e trajetórias.
Partindo desse pressuposto, buscamos transformar os problemas da imigração em problemas sociológicos (Lenoir, 1993). Para tal, trazemos a problemática da migração internacional e da pobreza a partir da análise de matérias jornalísticas, veiculadas em mídias digitais, sobre a presença migrante em Fortaleza, no estado do Ceará, Brasil. Busca-se identificar as classificações sociais em torno da figura do imigrante em situação de pobreza difundidas pelos jornais digitais que circulam na capital do Ceará. Para tal, parte-se da seguinte pergunta: Quais e de que maneira as classificações sociais, veiculadas em meios de comunicação de massa, homogeneízam e/ou diferenciam a condição do imigrante pobre? Parte-se do pressuposto de que, nos últimos anos, a presença migrante na capital cearense tem suscitado recorrentes representações difundidas pelos meios de comunicação que apontam, sobretudo, as condições de vida e de trabalho dos imigrantes, as ações no âmbito da assistência pública e da atuação solidária de entidades religiosas e da sociedade civil na provisão de serviços e recursos assistenciais. Situando essa proposta no domínio da pesquisa qualitativa, utiliza-se como recursos metodológicos a técnica de análise do discurso de textos jornalísticos que abordam a temática da migração, relação de assistência, pobreza e Estado. Coletou-se notícias publicadas, entre os anos 2018 e 2022, no acervo digital dos Jornais O Povo, O Estado e Diário do Nordeste que tratam das vivências dos imigrantes em território brasileiro. Dialogando com os estudos sobre os emissores midiáticos, compreende-se que a linguagem é um meio de refletir e descrever o mundo, situando-se como prática social. Neste cenário, conclui-se que diferenças, desigualdades e discriminações se imbricam na experiência dos imigrantes em situação de pobreza. Os imigrantes são vistos como ameaças a cultura ou as tradições, a partir de um distanciamento em relação ao “outro”, onde as fronteiras físicas e simbólicas entre “nós” e “eles” são cada vez mais ambivalentes.
Desarrollo:
Migração, pobreza e relações de assistência em Fortaleza, Ceará, Brasil: imagens das experiências vividas no cotidiano
A consolidação do Brasil na rota das novas migrações internacionais, a partir nos anos 1990, reverbera na permanência ou transitoriedade dos imigrantes e na construção de novos processos migratórios nas regiões do país. Conforme o “Atlas Temático: Migrações Internacionais na Região Nordeste” (2019), entre 2000 e 2017, o Ceará se consolidou como o segundo Estado do Nordeste brasileiro que mais recebeu migrantes internacionais. Neste período, o Estado recebeu 26,4 mil estrangeiros. Analisa-se que há também um número crescente de solicitações de refúgio. Segundo dados do Comitê Nacional para Refugiados (CONARE), vinculado ao Ministério da Justiça, ocorreram mais de mil solicitações de refúgio somente na capital cearense, entre os anos de 2011 e 2019. Os venezuelanos lideram os pedidos, seguidos pelos africanos de Guiné-Bissau e pelos cubanos (Baeninger, Demétrio & Domeniconi, 2019). Estes dados, contudo, não abrangem as pessoas que se encontram na ilegalidade.
Nos últimos anos, essa presença imigrante no estado do Ceará, especialmente em Fortaleza, tem suscitado recorrentes representações difundidas pelos meios de comunicação de massa que apontam, sobretudo, as condições de vida e trabalho dos imigrantes, as ações no âmbito da assistência pública e da atuação solidária de entidades religiosas e da sociedade civil, conforme o jornal O Povo (2019) em matéria intitulada “Cerca de 90 venezuelanos estão vivendo em situação sub-humana no Centro”. Em “Imigrantes buscam alternativas de vida no Ceará” (2016), O Estado alerta para as dificuldades encontradas pelos imigrantes em Fortaleza e a construção de alternativas de subsistência. E matérias com títulos similares do Diário do Nordeste “Imigrantes buscam melhores condições de vida no Ceará” (Redação, 2015) e em “Imigrantes buscam recomeço e enfrentam mercado de trabalho no CE” (Mesquita, 2019), e no website de O Povo, “Ceará é o 2º estado do Nordeste que mais recebe migrantes internacionais” (Moura, 2019) são retratados estrangeiros que migram atraídos pelo turismo e pela possibilidade de investimento, e profissionais qualificados que se inserem no mercado formal de trabalho ou que estão em busca de oportunidades para construir uma carreira profissional.
Essas matérias jornalísticas põem em movimento mecanismos de construção de imagens sobre os estrangeiros que os associam à pobreza, à busca de melhores condições de vida e ao trabalho. Assim, embora fossem identificadas representações relativas à alocação de mão-de-obra qualificada e a iniciativa de turistas investidores, predominam as que retratam os imigrantes como sujeitos de menor escolaridade e ocupações desvalorizadas, geralmente com baixo status social. Dentre tais percepções que caracterizaram a situação dos imigrantes destacam-se as imagens relacionadas a um sujeito ambivalente, que une dimensões contrárias de partida e chegada, pertencimento e não pertencimento. Outras imagens sugerem representações vinculadas à violência, desvio, quebra de laços familiares, vulnerabilidades, desagregação social e entrelaçam-se com processos de marginalização, desqualificação social e estigmatização dos imigrantes. Conforme Said (2003) esses discursos são construídos em função da ressignificação que são feitas do imigrante.
Nas representações, trazidas por estas matérias de jornais locais, sobre as motivações que ocasionaram as migrações, chama-se a atenção as causas relacionadas às situações de guerra, conflitos políticos, pobreza nos países nativos e busca por trabalho e sobrevivência daqueles que migram e de suas famílias. É dominante a representação da pobreza atrelada as causas e as consequências da migração. Ao tratar dos efeitos das migrações são apontadas as formas de inserção do migrante no país receptor com enfoque na situação de pobreza vivenciada por eles. É recorrente a imagem de que, ao chegar nos países receptores, os imigrantes se deparam com condições precárias de sobrevivência, ausência de locais especializados de atendimento, processos de preconceito e estigmatização, barreiras linguísticas e culturais que dificultam a inserção no mercado de trabalho formal, dificuldade com relação ao custeio e a regulamentação da documentação civil. O aumento do número de migrações para o Ceará, por sua vez, é explicado pelas especificidades turísticas da região e por seu caráter hospitaleiro. O Ceará é retratado paradoxalmente como um lugar de investimento do capital transnacional, que apresenta oportunidades de trabalho e de estudo.
Observa-se ainda um processo de diferenciação da condição de ser migrante. As reportagens trazem a oposição daqueles imigrantes que buscam “oportunidades” de vida e trabalho em Fortaleza em distinção dos que são passageiros atraídos pelos pontos turísticos. Ou dos que estão em situação temporária, que solicitaram o visto para trabalhar ou estudar, e dos imigrantes considerados permanentes, como aquelas pessoas que constituíram família com outros brasileiros. Nos discursos de autoridades oficiais, explicitados por estas matérias, é realçado a figura do imigrante “pobre” atrelado à noção de pessoas em situação de vulnerabilidade social, dependentes da assistência pública ou privada, e susceptíveis às práticas de ilegalidade e ao envolvimento com a criminalidade. A falta de regulamentação da documentação civil, tendo em vista seus custos, é percebida reiteradamente como fator da inserção destes imigrantes em empregos precários, ou em práticas ilegais. São também apontadas as barreiras do idioma e a não validade dos diplomas universitários como dificuldades para a inclusão no mercado de trabalho formal.
Assim sobressam as práticas de legalidade e ilegalidade, em parte, representada pela própria condição de imigrante em situação de pobreza vivendo na “terra do outro”, que os fazem transitar entre o emprego, o desemprego e a informalidade, expondo-os a diversas estratégias de sobrevivência (Telles, 2010). Faz-se referência à matéria do jornal O Povo (2019) sobre a presença de imigrantes e refugiados venezuelanos que estão no Centro de Fortaleza (bairro comercial) em situação de extrema pobreza, dependendo de doações para custear aluguel diário e alimentação mínima para sobrevivência. Estes imigrantes estavam nas ruas e/ou sinais do Centro da cidade na condição de “pedintes” na ocasião da intervenção das instituições de assistência. Conforme destaca a matéria citada, diante desse quadro, foi organizada uma rede de acolhimento para assistir as famílias e “encaminhar os direitos humanos básicos: moradia, educação, saúde”, que englobava a ação da igreja, da sociedade civil e do poder público.
A organização dessa rede de atendimento pressupõe o estabelecimento de conexões interdependentes e complexas que comporiam uma relação de assistência, constituída por fluxos conectados de recursos humanos, materiais e simbólicos. Essa relação de assistência é o que definiria a condição de pobreza para Paugam e Simmel. Segundo Paugam (1999), a desqualificação social surge em decorrência da exclusão do indivíduo do mercado de trabalho e da necessidade de recorrer ao sistema de assistência social. Embora com trajetórias diferentes, Simmel (2014) expõe que o pobre se assemelha ao estrangeiro, pois a condição sociocultural de “ser pobre”, pode ser determinada pela assistência que alguém recebe publicamente do Estado ou da coletividade. Essa relação torna-se necessária, segundo o autor, pois o estrangeiro ao chegar à terra do outro está em uma posição externa e marginal em relação à comunidade de destino, que lhe expõe ao risco econômico e social relativo à inserção precária ao trabalho e aos vínculos afetivos fragilizados. Para ele, somente a categoria política da cidadania ultrapassaria o caráter estigmatizante do assistido.
Mapeando as instituições sociais e as relações de assistência, apontadas pelas matérias, que foram instituídas no atendimento aos imigrantes em busca de proteção social põe em evidência as interlocuções com o CRAS (equipamento público no âmbito da administração municipal) e a Pastoral do Imigrante (entidade religiosa). De acordo com a lei nº 8.742/1993, o CRAS é uma unidade de proteção social básica do Sistema Único da Assistência Social brasileiro (SUAS), que tem por objetivo prevenir a ocorrência de situações de vulnerabilidades e riscos sociais nos territórios, por meio da articulação dos serviços socioassistenciais e à prestação de serviços, programas e projetos socioassistenciais. A oferta dos serviços no CRAS deve ser planejada conforme as particularidades do território de abrangência e das famílias que nele vivem, suas necessidades e potencialidades, bem como da identificação de situações de vulnerabilidade social existentes (Brasil, 1993).
No âmbito das organizações não governamentais, a Pastoral do Migrante integra a Comissão Episcopal para o Serviço da Caridade, Justiça e Paz e o Pastoral da Mobilidade Humana da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Fundada em 1995 na capital cearense, a Pastoral do Migrante é coordenada por imigrantes e religiosas cristãs scalabrinas, tendo sua prática social fundada em representações de cunho religioso, que propõe acolhimento, proteção, promoção e integração ao imigrante. De acordo com a Pastoral, suas ações sociais partem da premissa de acolhimento ao imigrante carente de assistência. Como pessoas que necessitam de acolhida, os imigrantes “encontram-se em busca de uma vida melhor, longe da pobreza, da fome, da exploração e da injusta distribuição dos recursos do planeta (Papa Francisco)”.
No âmbito da relação de assistência, observa-se que nas suas andanças o imigrante mantém contato com o cenário institucional, recorrendo as ações de organizações governamentais e não governamentais que ofertam serviços socioassistenciais. Os equipamentos de assistência social oferecem benefícios de cesta básica; inclusão no Cadastro Único para políticas sociais; acesso ao Programa Bolsa Família, hoje substituído pelo Auxílio Brasil; acesso a moradia ou alojamento provisório; orientação jurídica; emissão de documentos; cursos de capacitação e encaminhamento profissional; orientações e encaminhamentos a rede de serviços socioassistenciais e as demais políticas públicas, como saúde e educação. Quanto ao atendimento realizado com os imigrantes, nas matérias citadas, é destacado que eles compartilhavam situações de preconceito, experiências de vida, privações materiais, dificuldades jurídico-burocráticas e barreiras simbólicas que vivenciavam no lugar de destino.
Nas práticas dessa rede assistencial, os imigrantes deparam-se com ações que se esbarram em políticas de proteção social focalizadas, de aperfeiçoamento da identificação dos usuários e de compatibilização dos programas aos recursos existentes, reduzindo a ação governamental às funções mínimas ou compensatórias. Por sua vez, os discursos oficiais que permeiam as relações de assistência oscilam entre resiliência, ressignificação e compreensão crítica da condição de imigrante. A dupla contradição, manifesta no estado provisório do ser imigrante que reflete as problemáticas duradouras enfrentadas em sua vida cotidiana, pode ser observada em seus relatos sobre as formas de adaptação na “terra do outro”, que abrange a negociação das tradições originais e a questão do idioma. O aprendizado da língua nativa, o conhecimento das formalidades jurídico-burocráticas, a aquisição dos meios necessários à sobrevivência e a inserção no mercado de trabalho são reconhecidos pelos imigrantes como um sistema de práticas ou padrões de comportamento que englobam os processos de integração dele decorrente.
Entende-se, por fim, que a condição de ser migrante em situação de pobreza abrange um status instituído através das classificações sociais, que marcam as relações de alteridade e os processos de ressignificação identitária, e implica ainda uma intervenção por parte do Estado, no campo das políticas públicas. Segundo Augé (2010), o tensionamento que a presença do imigrante provoca na terra do outro reverbera nos desafios que o imigrante enfrenta para superar as diferenças culturais e materiais encontradas no país de acolhimento. No processo de migração, as fronteiras, que podem ser naturais, linguísticas, culturais e políticas, configuram-se como formas de reafirmar as identidades e revelam os que estão “dentro” e “fora”. Assim, a identidade das pessoas em mobilidade é sentida a partir de sua condição de ambivalência, sendo constituídas pela experiência vivida do cotidiano e como aspecto de diferenciação social. Conforme destaca Castells (2002), os atores que se encontram em posições desvalorizadas e/ou estigmatizadas, por sua vez, desenvolvem uma identidade de resistência. Estas identidades individuais e coletivas do imigrante possibilitam a formação de redes sociais de imigração, incluindo essas redes de atendimento voltadas aos “problemas” decorrentes da imigração, que viabilizam a organização de estratégias de sobrevivência, permeadas por processos de contradições e conflitos.
Conclusiones:
As discussões acerca dos movimentos migratórios evidenciam as identidades do imigrante em um viés relacional e situacional, sendo constituídas pela experiência vivida do cotidiano. Ao chegar na terra do outro, o imigrante se depara com fronteiras físicas e simbólicas entre “nós” e “eles” que dificultam o acesso a diferentes recursos materiais, fazendo-os transitar entre o emprego, o desemprego, a informalidade e expondo-os a diversas estratégias de sobrevivência. As fronteiras do legal e o ilegal são perpassadas ainda pelas exigências, cada vez mais rígidas, colocadas pelos países receptores para impedir a entrada dos outsiders. No contexto em que os imigrantes são vistos como ameaças do ponto de vista cultural, social, econômico, um dos aspectos atuais mais problemáticos procedente da imigração e da globalização é a pobreza e a exclusão social. O estabelecimento de uma rede de assistência é justificado, por sua vez, pela própria condição de “deslocado” vivida pelo imigrante, às margens dos ilegalismos.
Diferenças, desigualdades e discriminações imbricam-se na experiência de migrantes em condição de pobreza. A dificuldade no acesso à estrutura de oportunidades sociais e econômicas resultam em um aumento das situações de desproteção social e insegurança, o que põe em relevo os problemas de exclusão e marginalidade. Constata-se, assim, que na ausência de uma medida pública de equivalência (dos direitos) referenciada nos valores de justiça, igualdade e equidade sociais, podem implicar em culpabilização e responsabilização dos indivíduos por mudanças de um suposto “seu destino”, sobretudo, quando assentada em uma concepção naturalizada de pobreza ou de inadequação das capacidades. Em concepção contrária, as reflexões, aqui levantadas, sobre as condições de vida dos migrantes em situação de pobreza considera a importância da ampliação das políticas públicas e ações frente à esta situação, amparados na perspectiva de direitos dos imigrantes e suas famílias. Compreende-se a pobreza em sua pluridimensionalidade, a reafirmar a centralidade do Estado garantidor da proteção social.
Bibliografía:
Augé, M. (2010). A noção de Fronteira. In: AUGÉ, Marc. Por uma antropologia da mobilidade. Tradução Bruno César Cavalcanti, Rafael Rocha e Almeida Barros. Lameiras, Maceió: EDUPAL, UNESCO, pp. 17 – 26.
Baeninger, R., Demétrio, N. B. & Domeniconi, J. de O. (2019). Atlas Temático Migrações Internacionais na Região Nordeste. Campinas: Nepo/Unicamp.
Brasil. (1993c). Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Brasília, DF.
Bourdieu, P. (1998). Um analista do inconsciente. In: A Imigração ou os Paradoxos da Alteridade. SAYAD, Abdelmalek. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo.
Castells, M. (2002). O Poder da Identidade. Tradução Klaus Brandini Gerdhardt. 3ª Ed. V. II. São Paulo: Paz e Terra.
Castles, S. & Mark, J. M. (2009). The Age of Migration: International Population Movements in the Modern World. 4ª edição. Londres: Macmillan.
Cerca de 90 venezuelanos estão vivendo em situação sub-humana no Centro (2019). O Povo. Fortaleza, 22 mai. 2019. https://www.opovo.com.br/noticias/fortaleza/2019/05/22/cerca-de-90-venezuelanos-estao-vivendo-em-situacao-sub-humana-no-centro.html.
Ibge. (2010). Censo Demográfico 2010. Nupcialidade, fecundidade e migração. Resultados da amostra. Rio de Janeiro, p.1-349. Disponível em https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/98/cd_2010_nupcialidade_fecundidade_migracao_amostra.pdf. Acesso em 04 de mai. 2022.
Imigrantes buscam alternativas de vida no Ceará. (2016). O Estado. Fortaleza, 04 jul. 2016. http://www.oestadoce.com.br/geral/imigrantes-buscam-alternativas-de-vida-no-ceara/.
Lenoir, R. (1996). Objeto sociológico e problema social. In: Iniciação à prática sociológica. Dominique Merllié, et al. Tradução Guilherme João de Freitas Teixeira. Petrópolis, RJ: Vozes.
Mesquita, C. (2019). Imigrantes buscam recomeço e enfrentam mercado de trabalho no CE. Diário do Nordeste. Fortaleza, 30 abr. 2019. https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/negocios/imigrantes-buscam-recomeco-e-enfrentam-mercado-de-trabalho-no-ce-1.2094111.
Moura, D. (2019). Ceará é o 2º estado do Nordeste que mais recebe migrantes internacionais. O POVO. Fortaleza, 09 set. 2019. https://www.opovo.com.br/noticias/ceara/2019/09/09/ceara-e-o-2---estado-do-nordeste-que-mais-recebe-migrantes-internacionais.html.
Paugam, S. (1999). O enfraquecimento e a ruptura dos vínculos sociais: uma dimensão essencial do processo de desqualificação social. In: B. Sawaia (org.). As artimanhas da exclusão: Análise psicossocial e ética da desigualdade social. Petrópolis, RJ: Vozes.
Redação. (2015). Imigrantes buscam melhores condições de vida no Ceará. Diário do Nordeste. Diário do Nordeste. Fortaleza, 22 ago. 2015. https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/metro/imigrantes-buscam-melhores-condicoes-de-vida-no-ceara-1.1368989.
Said, E. W. (2003). Reflexões sobre o exílio e outros ensaios. Trad. Pedro Maia Soares. São Paulo: Companhia das Letras.
Sayad, A. (1998). A Imigração ou os Paradoxos da Alteridade. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo.
Simmel, G. (2014). Sociologia: estúdios sobre las formas de socialización. Tradução de J. Pérez Bances. México: FCE.
Telles, V. da S. (2010). A cidade nas fronteiras do legal e ilegal. Belo Horizonte, MG: Argvmentvm.
Palabras clave:
Migração. Classificação social. Pobreza. Meios de comunicação.