Resumen de la Ponencia:
Esta pesquisa propôs-se a investigar como crianças se sentem diante do contexto pandêmico a partir de suas falas, desejos e posicionamentos. Para isso, apresenta expressões das crianças e outros dados produzidos, a partir de uma consulta online realizada com crianças entre 10 e 14 anos de diferentes regiões do Distrito Federal. Inseridas dentro das estratégias de isolamento social, as políticas de fechamento das escolas ocorreram em função de diretrizes do campo biomédico que orientaram o confinamento como forma de atenuar a disseminação do vírus. Uma decisão central no esforço de controle da doença. No entanto, pouco foi debatido, em termos de estratégias e ações concretas de autoridades, sobre a necessidade de dar atenção especial às crianças e à garantia de seus direitos em um cenário de vulnerabilidades. Relatórios da ONU[1] e pesquisas acadêmicas[2] cada vez mais avançam na escuta de crianças e evidenciam os impactos e desdobramentos das condições sociais e emocionais das crianças em função do tempo em isolamento. Além disso, a perda de familiares e outras consequências diretas e indiretas do vírus se apresentam como desafios reais na vida de muitas delas. O reconhecimento das crianças como um grupo social amplamente afetado pela pandemia impõe o desenvolvimento de um raciocínio que compreenda suas perspectivas sobre o problema, sobre suas perdas e também sobre possibilidades imaginadas e encontradas diante dos desafios vividos. Torna-se fértil um saber construído a partir das crianças, um exercício de aproximação sensível às suas realidades. Podemos, então, neste entendimento, reconhecer as vozes das crianças e seu valor heurístico para a compreensão de processos históricos que vivemos como sociedade. Mais que isso, é o reconhecimento que a participação de crianças é fundamental para a construção de uma vida cidadã. Há um sentido político e epistêmico nesta abordagem proposta. Tal aproximação tem implicações teóricas e metodológicas: precisamos escutar as crianças para, assim, orientar a nossa discussão e entender os pontos relevantes de suas experiências. O desenvolvimento teórico da investigação se dá dentro dos marcos referenciais que compreendem a criança enquanto sujeito que vive relações sociais geradoras de um processo de produção da cultura, e não como resultado dela. Isto será articulado ao entendimento de que a espacialização é um aspecto relevante para a configuração dos processos de constituição da criança enquanto sujeito do cotidiano. É fundamental pensar que as relações com o meio estão na base do desenvolvimento das crianças enquanto sujeitos sociais.
Introducción:
Inseridas no âmbito das estratégias de isolamento social, as políticas de fechamento das escolas ocorreram em função de diretrizes do campo biomédico que orientaram o confinamento como forma de atenuar a disseminação do coronavírus. Uma decisão central no esforço de controle da doença, que, no entanto, foi pouco foi debatida, em termos de estratégias e ações concretas das autoridades sanitárias e governamentais, acerca da necessidade de dar atenção especial às crianças e à garantia de seus direitos em um cenário de crise que acentua as desigualdades e vulnerabilidades presentes em suas vidas. O reconhecimento das crianças como um grupo social amplamente afetado pela pandemia exige que trabalhemos para ampliar a visibilidade de suas perspectivas sobre como esse momento histórico particular as impactou.
Diferentes relatórios de organismos internacionais (UNESCO, 2021) destacam vulnerabilidades e violências que se fazem presente na vida de crianças em tempos de crise. Concordamos com Marta Muñoz (2020) quando afirma que é urgente e necessário escutar as crianças em suas diversas perspectivas e posições em relação ao contexto do confinamento durante a pandemia de Covid 19. Este projeto de pesquisa nasceu da situação emergencial de confinamento social vivida em 2020 decorrente da pandemia de COVID-19.
Esta iniciativa se associa à pesquisa desenvolvida pela Associação Enclave de Evaluación y Derechos Humanos, que iniciou, na Espanha, o projeto intitulado Infância Confinada, visando entender o que pensam e sentem meninas, meninos e adolescentes sobre a questão do COVID-19 no que diz respeito aos impactos em suas vidas e à construção de significados tanto individual como coletivamente. A pesquisa foi conduzida por uma equipe multidisciplinar e teve como proposta mapear a realidade dessas crianças e jovens, observando diferentes questões - estruturais, emocionais, familiares e escolares - assim como buscar entendimento sobre os significados que elas têm dado à situação vivenciada.
O objetivo central foi propor a criação de oportunidades de fala e escuta sobre o que pensam e sentem meninas, meninos e adolescentes a respeito de suas vivências no contexto da pandemia de COVID-19, em particular no âmbito do Distrito Federal brasileiro. Para isso, buscou formas de chegar até as crianças para conhecer como elas elaboram sentidos e significados particulares sobre a pandemia. Identificou impactos da pandemia na perspectiva de crianças e jovens, sobretudo em relação às condições sociais, educacionais/escolares, econômicas e sanitárias a que estavam submetidas. Tratou-se de uma pesquisa exploratória, com abordagem quali-quantitativa, no sentindo que busca levantar, além de estatísticas de crianças que vivem nas distintas condições estruturais, também suas emoções, pensamentos e construções de significados e sentidos.
Também revelou a fragilidade de políticas públicas referentes ao apoio às famílias, no que diz respeito a: segurança financeira, alimentar, condições de moradia, acesso aos equipamentos para as aulas remotas, conexão à rede de internet, entre outros. Por isso, percebe-se que a crise vivenciada deve ser um ponto de reflexão para qualificar e integrar políticas públicas que se voltem à proteção das infâncias. Por esta e outras razões se assume o território enquanto contexto e experiência das infâncias na intenção de contemplar suas desigualdades estruturais e suas diferentes leituras, expectativas e possibilidades.
A pesquisadora argentina Silvia Grinberg (2022) destaca que a pandemia marca um momento de acirramento das desigualdades estruturais da sociedade, e chama a atenção para o processo de desigualdade educativa, de acesso à escola e e outros direitos de participação na vida coletiva.
La interrogación por la desigualdad educativa tanto como no es nueva se ha revitalizado en los últimos decenios y especialmente en 2020, resultado de una pandemia que expuso la injusticia de una sociedad que hace decenios hace gala de la precariedad (Grinberg, p. 15, 2022).
A investigação com crianças em contexto pandêmico tem sido abordada pelo campo acadêmico desde o primeiro semestre de 2020 e diferentes esforços têm sido feitos para registrar a experiência de crianças em suas diferentes condições de vida. No caso brasileiro, apresentamos duas abordagens que dialogam com a pesquisa que trazemos sistematizada neste artigo. Os pesquisadores: Gabriela Tebet, Anete Abramowicz e Jader Janer Moreira Lopes (2021) destacam que a pesquisa com crianças nesse momento e contexto aporta para a compreensão de como a pandemia gera efeitos e impactos para uma pluralidade de infâncias em um contexto excludente, marcado por desigualdades e perda de direitos. Entender as condições sociais e geográficas das crianças e como estes aspectos configuram diferentes experiências diante da pandemia demanda o desenvolvimento de dispositivos e abordagens políticas de atenção às infâncias.
Temos ainda a pesquisa: Infância e pandemia: escuta da experiência das crianças, realizada em 2020 por Isabel de Oliveira e Silva; Iza Rodrigues da Luz; Levindo Diniz Carvalho e Maria Cristina Soares de Gouvêa todos ligado à Universidade Federal de Minas Gerais que teve como objetivo compreender como crianças de 8 a 12 anos da região metropolitana de Belo Horizonte - RMBH, vivenciam a Pandemia de COVID-19. Um ponto de destaque dessa pesquisa é que dela emergem “Recomendações ao poder público”, entre as quais ressaltamos: a escuta das crianças por meio de “rodas de conversa”, “assembleias”, entrevistas individuais e “fóruns”, mas também a partir da análise sensível das suas diferentes formas de expressão, mediadas pela imaginação: o desenho, a fotografia e o brincar a fim de subsidiar a tomada de decisões que afete suas vidas.
No âmbito da América Latina, o livro Infancias, voces y esperanzas ante el confinamiento del Covid-19 en México de Melgarejo, Patricia M.; Linares, Roberto S. (2021) traz as expressões e elaborações de crianças indígenas mexicanas em suas vivências durante a pandemia. É importante observar que o trabalho amplia a percepção dos impactos do problema pandêmico a partir de um entendimento amplo de saúde e educação que articula corpo, práticas culturais, memória, identidades e territórios.
Ainda em espanhol, citamos o relatório Infancia Confinada: ¿Cómo viven la situación de confinamiento niñas, niños y adolescentes? de Martínez Muñoz; Rodríguez Pascual e Velásquez Crespo (2020) que constitui também um esforço em registrar vivências, falas e posicionamento de crianças espanholas durante o fechamento de escolas frente ao confinamento. Todos esses trabalhos mostram como as crianças são perspicazes em fazer leituras do que está acontecendo em suas vidas e entendem que toda a sociedade está enfrentando um problema sério. Elas se sentem parte da experiência pandêmica, identificam de que maneiras são afetadas por esse contexto e ao mesmo tempo são propositivas e têm muito a contribuir para o nosso entendimento deste problema.
Desarrollo:
As atuais discussões acerca da infância em sua pluralidade vêm reconhecendo as crianças como sujeitos de direitos. Isso pressupõe que, para a compreensão desse universo, se articule perspectivas macro estrutuais ao mergulho ao universo micro. Assim é que, considerando que as crianças são “indiscutivelmente parte da sociedade e do mundo e é possível e necessário conectar a infância às forças estruturais maiores” (Qvortrup in Nascimento, 2011, p. 201), bem como a de que precisam ser escutadas e livres para expressarem suas opiniões e interesses sobre questões que envolvem os diferentes aspectos e contextos da sociedade na qual estão inseridas de forma a serem compreendidas como atores sociais implica em irromper em um giro teórico e metodológico que deixa de pesquisar crianças para pesquisar com crianças (GAITÁN MUÑOZ, 2006), ou seja, uma investigação do mundo considerando as leituras das crianças.
Nesse entendimento, infância é uma categoria social estrutural que vem passando por transformações ao longo dos tempos, principalmente após os séculos XVII e XVIII, como bem pontuaram Pinto e Sarmento (1997). E como categoria, a infância precisa ser compreendida não como uma etapa da vida, mas, sim como um “componente da cultura e da sociedade” (Rego, 2018, p. 15) que carrega em si fatores intergeracionais, e que, portanto, pode ser objeto de análise sociológica “articulando-a a variáveis sociológicas clássicas, como a classe social, o gênero, ou o pertencimento étnico” (Rego, 2018, p. 15).
Nesta pesquisa, considera-se ainda que crianças reelaboram os espaços-tempos e vivenciam diferentes relações com o mundo e a vida como parte fundante dos seus processos de espacialização (LOPES & FERNANDES, 2018). Esta abordagem se afasta de uma interpretação da infância como fase transitória, em que a criança é concebida na perspectiva do permanente vir a ser, ainda não pronta, uma tábula rasa. Assim, afirma-se a criança como participante deste mundo, dos espaços e tempos partilhados, dos processos vividos em coletividade. (Lopes &; Fernandes, 2018; Aitken, 2019). A infância é pensada como categoria social estrutural do tipo geracional, (Qvortrup, 2011) e não como momento de pura maturação para uma vida adulta.
A nossa perspectiva teórica busca articular estruturas e subjetividades, de forma que, ao mesmo tempo em que contextualiza a estrutura social, considera as trajetórias históricas de crianças e seus saberes, dores, experiências e esperanças. Ao situar as infâncias e suas expressões em processos históricos e políticos afastamo-nos de compreensões reducionistas das experiências infantis, tendo em vista que, quando se concebe a diversidade de infâncias como um processo dado, sem situar as trajetórias infantis e, sem considerar os relatos e narrativas das próprias crianças, o pesquisador assume uma contradição, cujo resultado poderia levar a uma coisificação das infâncias (Medina Melgarejo, 2018).
Assim, a necessidade de articular a perspectiva macroestrutural ao diálogo na esfera micro permitiria perceber movimentos próprios, práticas situadas em espaços e tempos únicos. Partimos, então, da afirmação da criança como sujeito relacional, implicado na vida social e coletiva, que lança ao mundo suas narrativas e expressões próprias, emergentes de processos históricos singulares. Buscamos uma prática de estudo com as infâncias, e não sobre elas, pois as crianças não podem ser apenas objeto do conhecimento: já se sabe muito sobre as crianças, agora buscamos acessar sua condição de sujeitos de saber próprio sobre suas vidas.
A presente investigação se articula em termos metodológicos à experiência de pesquisa desenvolvida inicialmente na Espanha e em seguida em outros países, pela Associação Enclave de Evaluación y Derechos Humanos, que iniciou o projeto intitulado Infância Confinada, com a intenção de entender o que pensam e sentem meninas, meninos e adolescentes sobre a questão do COVID-19.
No caso brasileiro, a pesquisa, de abordagem qualitativa, foi desenvolvida a partir do mesmo questionário espanhol adaptado à realidade brasileira, contendo 65 questões que variaram entre múltipla escolha, caixa de seleção, escala linear e resposta discursiva curta. A seleção dos participantes desta etapa foi feita de forma voluntária, convidados a partir da circulação de um questionário on-line, via aplicativo de mensagens whatsapp. O questionário apresenta perguntas sobre aspectos estruturais, emocionais, relacionais e sobre expectativas e desejos. A amostra inicial constituiu-se de 492 crianças, com 18 questionários excluídos por não concordarem com o termo de responsabilidade e participação.
Com esses formulários respondidos, os dados obtidos foram analisados com base no método de análise de conteúdo, proposto por Bardin (2011). Para tanto, fizemos a leitura flutuante (Bardin, 2011) dos formulários respondidos, como uma forma de estabelecer uma leitura inicial desses textos, de modo a “conhecer o texto, deixando–se invadir por impressões e orientações” (Bardin, 2011, p. 37). Em seguida, passamos ao processo de categorização das respostas escritas pelas crianças, de modo a transformar os dados iniciais em informações organizadas que nos permitiram estabelecer categorias. Com essas categorias de analise, foi possível, então, realizar interpretações e inferências dos textos obtidos nos formulários.
Este estudo foi realizado via questionário Google Forms on-line, com 474 crianças do Distrito Federal, em sua maioria vivendo no Plano Piloto (23,7%) e na região do Gama (21,8%), enquanto 57,2% dos respondentes estão em outras regiões do DF. Em relação a identificação das crianças pesquisadas, 53,6% se identificam com o gênero feminino e 46,4% com o gênero masculino.
Pouco mais da metade das crianças estudam na rede particular de ensino (54,4%) e os demais participantes em escola pública (45,6%). Destas crianças, 98,1% estão cumprindo as atividades escolares de forma remota. Em relação aos direitos das crianças 66% dos respondentes reconhece que possui direitos enquanto criança.
No entanto, foi perceptível nas respostas, que as crianças se dividiram quanto ao entendimento de se seus direitos estão ou não sendo cumpridos. Destas respostas, 31,6% não concordam nadinha que os direitos estejam sendo cumpridos de forma igualitária para todas as crianças. Aproximadamente 47% dos respondentes indicam que concordam em algum grau, e do total, apenas 15% das crianças concorda totalmente que os direitos de todas as crianças estejam sendo cumpridos.
Grande parte dos respondentes pertencem a uma região do DF com maior poder aquisitivo. Muitas crianças não relataram dificuldades ao acesso às tecnologias, recorrendo inclusive a este uso para amenizar os efeitos do sentimento de ócio causado pelo confinamento referente a pandemia de Coronavírus. No entanto, a pequena faixa de crianças que relatou não ter acesso às tecnologias se encontra nas regiões não centrais do DF
Em relação aos direitos das crianças 66% dos respondentes reconhece que possui direitos enquanto criança. No entanto, foi perceptível nas respostas, que as crianças se dividiram quanto ao entendimento de que seus direitos estão ou não sendo garantidos. Entre as respostas, 31,6% não concordam nadinha que os direitos estejam sendo cumpridos de forma igualitária para todas as crianças. Aproximadamente 47% dos respondentes indicam que concordam em algum grau, e do total, apenas 15% das crianças concorda totalmente que os direitos de todas as crianças estejam sendo cumpridos. Quanto à pandemia, 74,1% delas concordam sobre a necessidade de estarem isoladas para não contrair o Coronavírus, o que aponta uma compreensão da gravidade da doença.
As crianças que participaram da pesquisa apresentaram preocupações variadas em relação à vida financeira de suas famílias durante o confinamento, aproximadamente 48% das crianças se preocupa com a possibilidade de a família empobrecer, devido a diferentes reflexos gerados pela pandemia. No entanto, quase 30% não se preocupa com essa possibilidade. Neste seguimento, 25,4% das famílias das crianças já́ sofreram com a pandemia e estão mais pobres. As dificuldades financeiras se apresentam como uma limitação imposta pela pandemia que afetou muitos trabalhadores e suas famílias. As crianças imersas neste contexto também apresentam inquietações e sentimentos relacionados a esta situação. 42,6% das crianças não se preocupam se faltará comida na mesa, e 21,9% declaram que se preocupam muito com a falta de comida em casa durante este período.
As informações até aqui são uma base para compreender melhor o contexto no qual estas crianças estão inseridas. A segunda análise, a seguir, abordará mais especificamente as questões sobre o que dizem as crianças em suas expressões relativas às suas vivências da pandemia.
Conclusiones:
As crianças retrataram que o fato de estarem confinadas, sem a liberdade de circular em ambientes externos, os fazem sentir-se mais tristes. Importante destacar que os ambientes citados pelas crianças foram os da casa que residem, relacionada ao confinamento; a escola, retratada na saudade que sentem; e o uso de aparelhos tecnológicos para estreitar laços e encontros sociais de forma virtual. Ficou perceptível que as crianças, em geral, expressaram um dilema entre sair e ficar em casa, demonstrando que compreendiam a necessidade de permanecer em isolamento, porém com o desejo de retomar a sua liberdade para sair. A exemplo: “sinto vontade de sair”; “gostaria de poder brincar na rua”, encontrados com frequência ao longo do corpus textual.
Foi colocada a importância dos amigos e do contato físico para as crianças participantes frente ao confinamento imposto pela pandemia do Coronavírus. Somos sujeitos sociais e este estudo evidenciou a necessidade do contato com outras pessoas (amigos e parentes) para o bem estar dessas crianças. Muitos relataram que o confinamento gerou um sentimento de “prisão” que revelou reflexos de ansiedade e tédio, percebidos nas falas:
“Estar confinado me deixa em uma prisão.”
“Estar confinado é uma prisão.”
“A pior coisa do confinamento é a ansiedade.”
“Estar confinado gera ansiedade.”
“Estar confinado me deixa com tédio.”
Destacamos a importância dos jogos e brincadeiras on-line para o enfrentamento do ócio gerado pela quarentena. Foram recorrentes nas respostas o uso dos videogames, computadores e celulares para a realização de suas brincadeiras. Devido ao isolamento social, estes esquipamentos tecnológicos foram os recursos para os momentos de lazer das crianças. Outro destaque nas respostas foi o uso do verbo jogar, referindo-se ao fato das crianças não poderem jogar e encontrar-se pessoalmente:
“O que me deixa triste é o fato de querer jogar futebol com os meus amigos.”
“O que me deixa triste é não poder jogar bola na quadra.”
“O que me deixa triste é não poder ir pra escola nem jogar na quadra aqui do prédio.”
As últimas três falas citadas remetem ao tema “o que me deixa triste.”, demonstrando o quanto o contato físico com os amigos influencia no sentimento de alegria das crianças. Na análise das respostas às questões discursivas, as crianças retrataram que o fato de estarem confinadas, sem a liberdade de circular em ambientes externos, os fazem sentir-se mais tristes e por muitas vezes entediados. No entanto, de acordo com as respostas, demonstraram compreender a gravidade do contexto de pandemia atual.
Muitas crianças citaram o quanto sentem falta dos amigos da escola e como conversar com os amigos utilizando as mídias sociais tem ajudado a escapar ou a ludibriar o sentimento de aprisionamento. Entre as principais alegrias citadas durante o período de confinamento, jogar; brincar e conversar com os amigos; ficar com a família, foram as de maior destaque. As crianças deste estudo demonstraram em suas respostas se posicionar a favor do isolamento, mesmo que isso tenha gerado um contexto de incertezas e insegurança em seus lares. Relataram o medo do adoecimento de seus avós, pais e parentes próximos.
As crianças também manifestam percepções diante da restrição espacial imposta pela nova rotina imposta pelo isolamento, a exemplo das sentenças a seguir: não encontrar; não sair; não ir; não abraçar, além da recorrência das respostas “não sei”, ou “não sabe explicar”, o que pode indicar a ocorrência de dúvidas e incertezas perante a situação vivenciada. A palavra família aparece frequentemente ao longo das respostas, destacando a importância do núcleo familiar, seja como segurança, presença e/ou preocupação. Nas respostas, ficou demonstrado o quanto as crianças se sentem felizes na presença da família e o quanto se preocupam com a saúde e o bem-estar de seus familiares, quando relacionado ao risco de contaminação, como é possível identificar nas falas a seguir:
“A melhor coisa do confinamento são os amigos e a família.”
“O meu medo é minha família morrer.”
“O meu medo é pegar covid ou alguém da minha família.”
“Corona, não infecta a minha família.”
“O que me deixa triste é a distância e a saudade da minha família e amigos.”
A partir das respostas obtidas foi possível verificar a relação das crianças com a nova rotina, a falta do ambiente escolar e o descontentamento das crianças com a educação à distância. Relato este recorrente: “acabem com as aulas online!”. Na fala destes jovens ficou visível o papel da escola, educadores e a necessidade de se desenvolver e se adequar ao novo panorama tecnológico, e não replicar um modelo tradicional de forma virtual. As crianças estão cansadas e sentem falta da vida presencial na escola, seja em função da saudade dos amigos, como também da rotina escolar.
Outro fator retratado pelas crianças foi o excesso de atividades escolares remotas e tarefas online. Muitas crianças disseram não aguentar mais as aulas on-line, que estas não estão cumprindo o seu papel educacional, pois as crianças não estão assimilando os conteúdos. Da mesma forma que no trabalho de Carvalho, Gouveia e Fernandes (2022) , aqui foi questionado o papel das instituições de educação neste momento, que, mais do que instituições para entregar conteúdos e atividades, deveriam estar focadas em fortalecer o papel relacional, de proteção e cuidado com a infância.
“Cancelem as aulas online ninguém aguenta mais!”
“Voltar aulas aqui no Brasil urgente, pensar mais nas Crianças”.
“Estudos virtuais são fracos.”
Ficou claro que as crianças participantes estão atentas aos privilégios e angústias da população, se posicionando para as questões no cerne da política, mostrando sua voz, de acordo com o relato: “Essa pandemia é como um alívio para algumas pessoas e um estrangulamento para outras, seja pela injustiça, pelos desejos, pelas metas...” e “que o governo DEVE ajudar os cidadãos ao invés de dizer que é apenas uma "gripezinha”. Assim, demonstrando que as crianças e o jovens exercem a participação e o protagonismo, portanto, expressam suas opiniões e interesses sobre questões que envolvem a sociedade na qual estão inseridas (MARTÍNEZ MUÑOZ, 2019).
Este projeto trouxe um panorama da rotina de crianças em diferentes contextos, com sonhos, desejos, dificuldades, e principalmente realidades muito diferentes, comprovados por falas que vão desde “retornar as viagens à Disney” até “fico preocupado com a minha mãe que sai para trabalhar todos os dias”.
Por fim, trazemos algumas nuvens de palavras sobre alegrias tristezas das crianças, as nuvens ficaram muito parecidas, evidenciando que as relações sociais são a principal fonte de alegria para as crianças participantes e, a ausência, ou supressão dessas, são a principal fonte de tristeza.
Figura 1: Nuvem de palavras sobre alegrias durante o confinamento
https://drive.google.com/file/d/1EozKkaDsnO70J4aBV_57fKgYUMsHc_iI/view?usp=share_link
Elaborado por Marcela Pesci Peruzzo a partir das respostas discursivas do questionário com o uso da ferramenta Iramuteq
Figura 2: Nuvem de palavras sobre tristezas durante o confinamento
https://drive.google.com/file/d/1cGdqueBzaR3--39aG_qzlgp8GHJewqqg/view?usp=share_link
Elaborado por Marcela Pesci Peruzzo a partir das respostas discursivas do questionário com o uso da ferramenta Iramuteq
As alegrias destacaram as amizades, com a palavra “amigo” tendo centralidade, seguida da palavra “família”, bastante próxima. As análises das respostas discursivas também mostraram que os momentos de descontração das crianças durante o confinamento eram realizados de forma virtual, seja realizando uma videochamada; falando pelo celular com os amigos, utilizando o WhatsApp; ou mesmo, jogando jogos on-line. O vídeo game foi muito citado como mecanismo de distração pelas crianças.
Neste sentido, as alegrias estavam vinculadas a poder socializar de alguma forma, seja com as amizades mais próximas, ou familiares, e brincar. A família foi uma das menções mais recorrentes ao longo das respostas, evidenciando a importância da representação familiar, seja como segurança, presença e/ou preocupação. Nas respostas, ficou exposto o quanto as crianças se sentem felizes na presença da família e o quanto se preocupam com a família, quando relacionado ao risco de contaminação por Coronavírus.
Já ao se analisar a nuvem de palavras que retratam as principais tristezas das crianças durante o confinamento, a palavra que mais ressalta aos olhos também é a palavra “amigo”. Ou seja, enquanto a socialização é o principal motivo de alegria, a impossibilidade de socializar se torna o principal motivo para a tristeza. Como a família esteve presente na vida da maior parte das crianças durante o confinamento, não aparece na nuvem de tristezas de forma destacada.
Tendo apontado a impossibilidade de encontrar os amigos como a principal razão para as tristezas, as crianças revelam o quanto a escola tem um papel crucial no processo de socialização delas. Ir à escola significa encontrar com os amigos, brincar e estabelecer relações sociais mais sólidas, que vem a complementar as relações familiares e são muito importantes para os sentimentos das crianças.
Na nuvem de palavras da resposta das crianças para a pergunta: “Qual a pior coisa do confinamento para você?” aparece de forma recorrente o incômodo em não poder sair de casa e circular, junto à falta que faz ir para a escola.
Figura 3: Nuvem de palavras sobre a pior coisa do confinamento
https://drive.google.com/file/d/1PpDj2kjzkLrVv6xUIRLIFf9ht6oO4hWq/view?usp=share_link
Elaborado por Marcela Pesci Peruzzo a partir das respostas discursivas do questionário com o uso da ferramenta Iramuteq
A palavra “não” ganha destaque por vir compondo cenários de restrições, como: “não poder sair de casa”, “não ver meus amigos”, “não poder jogar bola na quadra”, etc. No entanto, é possível perceber destaque na palavra “escola”, que vem compondo frases como: “não poder ir à escola”, “não ir à escola”, “ficar sem ver meus amigos na escola”.
Percebe-se, com isso, a exaltação das amizades e a relevância do convívio social para as crianças e jovens possibilitado pela frequência na escola. Embora as tecnologias da informação tenham possibilitado o encontro mediado pela internet, a restrição física aos espaços, em especial o da escola, gera o sentimento de tristeza por reduzir as trocas relacionais.
As falas das crianças expressam sofrimentos e inseguranças, preocupações e medos, tal como o medo de perder membros da família ou ver pessoas próximas ser contaminadas pelo vírus. Falam da saudade que sentiram dos amigos, das brincadeiras em grupo, dos familiares que não podem ver, como avós e avôs e outros parentes. As famílias são colocadas, na visão delas, como fontes de apoio e suporte. As crianças dizem que estar em casa com suas famílias as ajudava a lidar com o medo e a se sentir relativamente seguras.
Também foi possível verificar o pedido de muitas crianças por políticas públicas eficientes no combate a esta pandemia, pedindo pela cura e pela retomada de suas atividades rotineiras. As crianças pesquisadas esperam poder realizar seus sonhos em um futuro próximo e declaram que o fim da pandemia é o passo inicial para retornar ao percurso para alcançá-los.
É fundamental observar práticas cuidadosas ao fazer pesquisa com crianças acerca de temas complexos, que podem gerar emoções e sentimentos no curso da sua participação. O conteúdo de suas falas e expressões não são dados prontos que as crianças entregam ou disponibilizam, mas sentidos próprios sobre o sofrimento e a angústia que experimentaram em suas histórias concretas.
Por meio de suas falas foi possível concluir que há impasses na maneira como o ensino à distância está sendo conduzido, como isso pode refletir em seu futuro e trazem importantes críticas ao modelo tradicional de ensino, agora replicado de forma virtual. Até a vacinação em massa como será este processo de aprendizagem? Quais os efeitos a longo prazo deste formato de ensino?
Esta pesquisa encontrou limites em seu alcance de uma diversidade de infâncias e crianças em diferentes condições de vida e acesso a direitos. Ainda que a maior parte das participantes tenha afirmado ter pleno acesso às tecnologias necessárias para estar presente nas aulas virtuais, há uma enorme brecha digital (MARTINEZ LOPEZ, 2020) nas condições de acesso que também constitui um elemento de vulnerabilidade, pois muitas crianças ainda se encontram sem equipamentos apropriados e conexão de internet disponível que lhes permita frequentar as aulas no ensino remoto.
As crianças têm muito a falar, mas suas vozes encontram a resistência para sua participação, sua inserção nos debates da sociedade. As vozes e saberes das crianças são fundamentais para entender como os processos sociais e históricos afetam a elas e a suas famílias de maneira particular, e para que avancemos na criação de espaços e oportunidades de participação, precisamos ampliar as condições de relação que estabelecemos com as crianças, e construamos possibilidades de encontro com os horizontes infantis, com a perspectiva da criança como experiência coletiva e relacional.
Acredita-se que este trabalho possa nortear futuras pesquisas sobre os reflexos causados pela pandemia na rotina de crianças e jovens, e a necessidade da escuta sensível para com estas crianças. Não só por demonstrarem inseguranças e medos frente a este panorama atual, mas por serem agentes protagonistas deste cenário, que possuem desejos, sonhos e preocupações com o futuro do território que vivem.
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Palabras clave:
Crianças; Pandemia; Covid 19; Infância
Resumen de la Ponencia:
A crise desencadeada pela Covid-19 afetou vários aspectos das relações humanas de todas as faixas geracionais, dentre elas, a infância. Embora pouco se saiba sobre as reais consequências da pandemia para a infância, nos próximos anos serão observados os efeitos do distanciamento e do isolamento social impingidos às crianças, principalmente as mais vulneráveis, colocando-as no centro das preocupações, como aponta a ONU.Este estudo apresenta uma reflexão sobre como a Antropologia da Criança, em diálogo com a Saúde, pode contribuir para reformular os olhares de adultos no entendimento de que a temática infantil é relevante para a discussão sobre o papel central das crianças para se compreender a realidade. O trabalho apresenta algumas questões abordadas na pesquisa de doutorado realizada em uma unidade de Educação Infantil do Município de Santos, São Paulo, Brasil, que teve como objetivo geral, por meio do diálogo entre as Ciências Sociais, particularmente a Antropologia da Criança e a Saúde, investigar as formas de comunicação das crianças a partir dos aspectos socioculturais envolvidos. Buscou-se problematizar as interações das crianças, entre elas e com os adultos, e observá-las enquanto sujeitos sociais completos e em transformação. Os resultados obtidos mostraram que as crianças se expressam o tempo todo e é por meio da liberdade de manipular a comunicação que elas adquirem, elaboram, mas também produzem e expressam a cultura. Essas são questões que nos fazem refletir sobre o lugar das crianças e suas formas de comunicação no atual contexto da pandemia da Covid-19, em que as relações ficaram restritas e interditadas. Este cenário traz o desafio de continuarmos ouvindo as crianças, reconhecendo que não se trata apenas de uma questão de lhes dar voz, mas compreender as suas linguagens e o que elas mobilizam na cultura e sociedade.Concorda-se que as crianças são sujeitos sociais e históricos, mas não partem do zero, pois o potencial das crianças por si só não é suficiente para que elas deem conta do complexo processo de socialização, comprometido pelo isolamento social e interrupção da rotina escolar durante a pandemia. Pergunta-se, nesse contexto, sobre a relação entre as crianças, mas também com e entre os adultos. Consideramos, assim, que a abordagem a essas questões demanda maior escuta das crianças, pois elas podem apontar caminhos diferentes e consideráveis ao serem ouvidas sobre suas experiências, suas percepções e opiniões sobre o confinamento social. Escutar as crianças e suas experiências no contexto da pandemia, conhecer os porquês, os conteúdos, para quem e como as crianças se comunicam, ouvindo, vendo e vivendo com elas, pode possibilitar uma interpretação aprofundada dessas experiências, acessando outras dimensões sobre o grande desafio das relações sociais, no contexto pós-pandêmico.Resumen de la Ponencia:
La presente ponencia tiene por propósito presentar e interpretar algunas esperas experimentadas por niños y adolescentes durante el tiempo en que duró la atención, tratamiento y seguimiento por COVID 19 de algunos de sus familiares en el Estado de México. Concretamente, busca mostrar las esperas que vivenciaron desde el momento en que sus familiares fueron diagnosticados con COVID 19 hasta que les otorgaron el alta médica, abundando en las ideas y emociones que sintieron en esos momentos. Para tal tarea, me basaré en conversaciones telefónicas tenidas con tres niños (una mujer y dos varones) miembros de una familia mexiquense donde la mamá fue hospitalizada en una institución de salud privada durante la llamada primera ola de la pandemia y dos niños más (una mujer y un varón) integrantes de otra familia, en la cual la mamá fue tratada desde su hogar por un médico especialista por vía telefónica durante la llamada segunda ola dicha pandemia. Asimismo, me basaré en las aportaciones teóricas de Pierre Bourdieu sobre la experiencia temporal, donde quedan enmarcadas las esperas, para considerar tanto elementos objetivos como subjetivos que aparecieron implicados en los relatos de los niños. El supuesto que sustentaré a lo largo de la ponencia es que, además de vivenciar distintas esperas obligadas por la pandemia como otros miembros de sus familias, el ubicárseles como seres vulnerables dentro de estas los llevó a sentir mayor presión de acatar tales esperas. Presión que, además, se robusteció con la condición socioeconómica de su familia y las relaciones de género que se manejaba en ellas.Resumen de la Ponencia:
Em diversos países, a pandemia de Covid-19 trouxe profundas modificações à cotidianidade de milhões de crianças. Um dos principais resultados desse cenário é o significativo aumento do tempo de tela dos sujeitos infantis, que, em quarentena, dependeram da conectividade à Internet para realizar boa parte de suas atividades diárias. Para além do amplamente discutido ensino remoto, o lazer infantil intensificou-se no consumo de mídias online e na participação dessas crianças em espaços de sociabilidade virtual. Tal advento é mais uma instância que potencializa a gradativa privatização do lazer infantil (Buckingham, 2007), que circunscreve a crescente atuação de crianças no ciberespaço. No Brasil, houve um crescimento de 10% no número de crianças entre 9 e 17 anos conectadas, de 2015 a 2019 (CETIC, 2021). De acordo com a pesquisa TIC Kids Online 2019, duas das atividades mais proeminentes desempenhadas por crianças e adolescentes brasileiros nos espaços online são o consumo de vídeos — 83% das crianças conectadas o fazem — e o uso de redes sociais — 69% dos indivíduos entre 9 e 17 anos presentes na Internet desempenham essa atividade — (CETIC, 2020). Já a edição 2020 do documento parece corroborar o dado acima, uma vez que o Instagram (35%) e o TikTok (27%), plataformas de sociabilidade centradas no compartilhamento de vídeos, são reportadas como as redes sociais mais utilizadas por crianças e adolescentes da mesma faixa-etária anterior (CETIC, 2021). Dentre outros propósitos, esses espaços são apropriados por crianças para a construção e a expressão de suas identidades (Lopes, 2021). Uma forma oportuna de analisar processos de construção identitária na infância é por meio da Teoria da Estruturação (Giddens, 2003), cujos conceitos de Estrutura e Agência são amplamente difundidos e aplicados à Sociologia da Infância (Qvortrup, 2010; James, 2010), também para contrapor a histórica visão adultocêntrica da Infância (Quapper, 2016). No contexto do trabalho identitário performado por crianças, uma das estruturas que têm crescente impacto sobre tal atividade é a cultura do consumo (Schor, 2007; Buckingham & Tingstad, 2010). Em contrapartida, a agência infantil é reificada pelo papel ativo que crianças exercem nos seus próprios processos identitários online, em um trabalho que se assemelha ao da bricolagem (Willett, 2008; Weber & Mitchell, 2008). Sumariamente, crianças se apropriam do que têm em mãos, levando em consideração as limitações estruturais às quais são submetidas — dentre as quais as da cultura do consumo —, para manipular e constituir suas próprias identidades. Logo, esta pesquisa se objetiva em compreender, a partir de uma análise do conteúdo audiovisual (Bardin, 1973; Rose, 2015) publicado por influenciadores mirins brasileiros em plataformas de vídeos curtos como TikTok e Instagram Reels, como se dá a interação entre cultura de consumo (representada pela recorrência a produtos e marcas) e agência individual na construção / expressão identitárias infantis online.Resumen de la Ponencia:
O trabalho apresenta como a leitura literária foi trabalhada no ensino remoto nos três primeiros anos do ensino fundamental em escolas públicas municipais de Belém, Pará, durante a pandemia da Covid-19. Aprender a ler e a escrever, incluindo textos literários, é um direito das crianças na faixa etária de 6 a 8 anos e a escola é a instituição chave para a socialização, ampliação cultural, desenvolvimento e aprendizagem, e também desempenha papel relevante na rede de proteção à infância. No contexto da pandemia Covid-19, em virtude das medidas sanitárias de distanciamento social, as crianças deixaram de frequentar às escolas, ficando às famílias encarregadas de criar as condições ao direito social à educação e à alfabetização de crianças. A questão norteadora da investigação foi: como se deu o trabalho com textos literários nos três primeiros anos do ensino fundamental no ensino remoto durante a pandemia da Covid-19?. De cunho qualitativo e documental, a pesquisa, desenvolvida de outubro de 2020 a março de 2021, compreendeu entrevista com educadores da Secretaria Municipal de Educação e análise de materiais impressos e digitais produzidos durante a pandemia no ensino remoto da literatura pela equipe do Centro de Formação de Professores. Na análise dos dados, observou-se que, para a formação de crianças leitoras, recorreu-se ao uso de sequências didáticas, materiais impressos, videoaulas e tecnologias para mediar a leitura e a contação de histórias na alfabetização. No processo de alfabetização, a mediação de leitura literária é imprescindível para a formação de crianças leitoras. No entanto, no ensino remoto, as crianças deixam de participar de atividades coletivas de mediação e contação de histórias no espaço da sala de aula e de ter acesso ao livro de literatura infantil nas bibliotecas escolares e/ou salas de leitura, pois elas passaram a realizar atividades em ambiente familiar, sob os cuidados de seus responsáveis, utilizando materiais impressos ou assistindo a vídeos e, assim, vivenciando novas formas de interação com os textos literários. Dentre os desafios que o ensino remoto impôs ao desenvolvimento de atividades de leitura literária, na pandemia, a entrega do material didático com textos literários cria a possibilidade da realização da leitura compartilhada de textos literários na família. No entanto, devido às condições sociais e materiais das famílias das crianças das escolas públicas, podemos conceber que as formas de acesso aos textos literários foram diversas e nem sempre favoráveis à ambiência de leitura e às experiências de leitor, ampliando, assim, as desigualdades no acesso ao direito à educação.
Introducción:
Palavras iniciais
Segundo a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, “a alfabetização é uma questão de dignidade e direitos humanos” (UNESCO, 2020, p.1). Aprender a ler e a escrever, incluindo o acesso à leitura literária, é um direito das crianças. A escola deve proporcionar ambiência de ensino e aprendizagem propícia para que as crianças a partir dos seis anos de idade desenvolvam o processo de alfabetização e, dominando o sistema alfabético da escrita, possam participar de atividades de leitura e escrita com autonomia e, assim, prosseguir seus estudos nos anos subsequentes de escolaridade. No entanto, durante a pandemia, por medidas sanitárias de distanciamento social, as crianças deixaram de frequentar a escola e passaram a realizar atividades de ensino remoto em casa.
O presente estudo, que ora apresentamos, integra a pesquisa em rede: “Literatura nos anos iniciais do ensino fundamental durante a pandemia da Covid-19”, coordenada por Marly Amarilha (UFRN) e Elisa Maria Della-Bona (UFPR), realizada em quatro regiões do Brasil (Norte, Nordeste, Sudeste e Sul), onze estados e doze cidades brasileiras, a saber: Amazonas, Humaitá; Pará, Belém; Maranhão, São Luis; Ceará, Fortaleza; Rio Grande do Norte, Natal; Minas Gerais, Belo Horizonte; Espírito Santo, Serra; Rio de Janeiro, Niterói; São Paulo, Sumaré e Guarulhos; Paraná, Curitiba e Rio Grande do Sul, Canoas. A pesquisa teve por objetivo acompanhar e refletir sobre os desafios que o ensino remoto impôs ao desenvolvimento de atividades de leitura literária nos anos iniciais do ensino fundamental no Brasil. Os resultados foram publicados no E-book “Literatura nos anos iniciais do ensino fundamental durante a pandemia da Covid-19” (Amarilha; Della-Bona, 2022).
Este trabalho apresenta, particularmente, como a leitura literária foi abordada no ensino remoto, nos três primeiros anos do ensino fundamental, em escolas públicas municipais de Belém - Pará, durante a pandemia da Covid-19. No estado do Pará, localizado na região norte do Brasil, o lockdown foi deferido pelo Decreto Nº 729 de 5 de maio de 2020. Com o decreto estadual, as atividades não essenciais, incluindo o funcionamento das escolas, no âmbito dos municípios foram suspensas. O isolamento social trouxe reflexos diretos na educação e na vida social, devido à reclusão das pessoas em casa e ao fechamento de escolas, de espaços de recreação e lazer frequentados pelas crianças.
De modo geral, a temática da pesquisa evidencia que aprender a ler e a escrever, incluindo textos literários, é um direito das crianças na faixa etária de 6 a 8 anos e a escola é a instituição chave para a socialização, ampliação cultural, desenvolvimento e aprendizagem, e também desempenha papel relevante na rede de proteção à infância. Entendemos que é função da escola promover a socialização, ampliação cultural, desenvolvimento, ensino e aprendizagem, além disso, a escola desempenha papel relevante na rede de proteção à infância. No contexto da pandemia Covid-19, a problemática, em destaque neste estudo, foi que, em virtude das medidas sanitárias de distanciamento social, as crianças deixaram de frequentar às escolas, ficando às famílias, muitas vezes desprovidas das condições necessárias, encarregadas de promover o direito social à educação e à alfabetização de crianças.
Desarrollo:
Lócus da pesquisa e delineamento metodológico
O Pará, localizado na região norte, é uma das vinte e sete unidades federativas do Brasil. É o segundo maior estado do país com uma extensão de 1.247.689,515 km2. Geograficamente, tem como limites o Suriname e o Amapá a norte, o Oceano Atlântico a nordeste, o Maranhão a leste, Tocantins a sudeste, Mato Grosso a sul, o Amazonas a oeste e Roraima e a Guiana a noroeste. Os rios principais são: Amazonas, Tapajós, Tocantins, Xingu, Jari e Pará. Sua capital, Belém, reúne em sua região metropolitana cerca de 2,1 milhões de habitantes, sendo a segunda maior população metropolitana da Região Norte (Belém, 2022).
Dadas as dificuldades de acesso às escolas em virtude de seu fechamento e medidas de distanciamento social, tornou-se inviável a coleta de dados nas escolas e o diálogo presencial com os professores. Então, o lócus da pesquisa foi o Centro de Formação de Professores – CFP, da Secretaria Municipal de Educação – SEMEC, Belém, Pará, Brasil, cuja equipe estava trabalhando em regime híbrido, parcialmente em home office e presencial.
Em relação ao perfil dos entrevistados, a equipe, composta por quinze educadores, atua na formação continuada, em encontros mensais e assessoramento à prática docente e conhece bem a realidade das escolas; destes, cinco participaram da pesquisa. Os participantes trabalham na educação há mais de vinte anos, são do quadro efetivo da SEMEC e têm formação em pedagogia; três deles são especialistas e dois mestres em educação.
A escolha desses profissionais para contribuírem na coleta de dados se deu porque eles acompanham o trabalho docente e discente nas escolas, durante a pandemia, realizando atividades de formação on-line e orientações às práticas docentes mediadas por tecnologias digitais (Google Meet, E-mail, WhatsApp, YouTube, TV, blog e videoaulas).
Quanto à abrangência do público da pesquisa, em 2020, a SEMEC - Belém, Pará, contou com: 632 professores dos três primeiros anos do ensino fundamental (Ciclo I); 15 formadores (CFP); 71 escolas e 20 unidades pedagógicas. Sobre o quantitativo de discentes, foram 17.840 alunos do Ciclo I (Belém, 2021).
Sobre o delineamento metodológico, de cunho qualitativo e documental, a pesquisa ocorreu em três etapas, devidamente interligadas, a saber:
(1) entrevista semiestruturada de vinte e seis questões com cinco educadores da Secretaria Municipal de Educação, respondida por escrito e enviada por E-mail;
(2) análise documental de materiais impressos, fornecidos pela equipe do Centro de Formação de Professores, e digitais produzidos durante a pandemia no ensino remoto da literatura pela equipe e disponibilizados no blog Expertise em Alfabetização;
(3) descrição e análise de decisões tomadas e de atividades desenvolvidas.
A pesquisa foi desenvolvida de outubro de 2020 a março de 2021, compreendendo seis meses. A questão norteadora da investigação foi: como se deu o trabalho com textos literários nos três primeiros anos do Ensino Fundamental no ensino remoto durante a pandemia da Covid-19?. Na seção seguinte, apresentaremos, parcialmente, os resultados do estudo.
Resultados e discussões: mediação de leitura literária na alfabetização
Além de compreender o sistema alfabético da escrita e aprender a escrever, um dos requisitos para se estar alfabetizado é aprender a ler. Uma condição para se aprender a ler é estar integrado a um grupo que usa a escrita para viver e não apenas para aprender a ler (Foucambert, 1993). Essa condição ressalta a relevância da heterogeneidade no processo de alfabetização. Isso porque o grupo no qual se aprende a ler deve ser composto de leitores mais experientes, no caso da sala de aula, a professora que ensino e cria a ambiência de aprendizagem, e de leitores menos experientes, os aprendizes, que buscam desvendar os textos a fim de compreendê-los, alcançando gradativamente o estatuto de leitor autônomo.
Dentre as atividades de alfabetização, comumente, realizadas em sala de aula com as crianças, destacamos a leitura em voz alta pela professora, que ao ler histórias e textos significativos constitui um auditório coletivo de leitura, no qual as crianças constroem sentidos a partir do texto que lhes chega aos ouvidos e das imagens mostradas na atividade de leitura.
Quanto à mediação de leitura em voz alta pela professora, em uma atividade compartilhada e coletiva de leitura, Amarilha (2013) esclarece que, além de necessária para a aprendizagem, a experiência de leitura de literatura na escola é de natureza mediada em dois sentidos: a mediação pela palavra, portanto simbólica; a mediação pela presença do outro (adulto leitor ou pares), portanto social. Em uma atividade coletiva de narração da história, “a voz do contador define limites acústicos e comunitários” (Amarilha, 2013, p. 36). De fato, a alfabetização de crianças requer a presença de um leitor mais experiente para organizar condições favoráveis ao processo de aprendizagem da leitura e da compreensão do sistema alfabético da escrita.
A mediação da leitura de histórias, em uma atividade social e coletiva em sala de aula, constitui uma comunidade de ouvintes e cria uma relação de pertencimento a uma comunidade de leitores, concedendo às crianças em fase de alfabetização o estatuto de leitor (Foucambert, 1993). É a narrativa que chega pela palavra do outro e instiga na criança o desejo de participar do ato de ler, aprender a ler e se tornar leitora, e também, gradativamente, a buscar novas leituras e a contar e escrever suas próprias histórias com autonomia.
Destacamos que a mediação de leitura literária é imprescindível para a formação de crianças leitoras, nos três primeiros anos do ensino fundamental. No entanto, no ensino remoto, as crianças deixam de participar de atividades coletivas de mediação e contação de histórias no espaço da sala de aula e de ter acesso ao livro de literatura infantil nas bibliotecas escolares e/ou salas de leitura, pois elas passam a realizar atividades em ambiente familiar, utilizando materiais impressos ou assistindo a vídeos, no caso de nossa pesquisa, fornecidos pela Secretaria Municipal de Educação de Belém, Pará, assim vivenciando novas formas de interação com os textos literários.
Na pandemia, as escolas municipais de Belém iniciaram o trabalho com as crianças, no ensino remoto, a partir de março de 2020, com atividades impressas, vídeos com dicas de atividades para as crianças durante a quarentena e de como se prevenir contra o coronavírus e também com videoaulas. A SEMEC mudou a formação dos professores de presencial para on-line, com estudo de sequências didáticas e orientação ao trabalho docente, forneceu kits pedagógicos aos alunos, juntamente com alimentos da merenda escolar, favoreceu a produção e veiculação na TV de videoaulas, porém o planejamento de atividades síncronas e assíncronas dependeu do encaminhamento dado pelos professores em cada escola e do modo como cada família se organizou para que as crianças estudassem em casa.
Na análise dos materiais impressos, observamos que o texto literário, apresentado em uma ficha de leitura, veio na primeira página do material do aluno (kit pedagógico), enviado às escolas com atividades a serem realizadas pelas crianças, de março a dezembro 2020. Em uma proposta interdisciplinar, seguidos de uma variedade de atividades. Os textos do material do 1º ano foram: Pirata de palavras, de Jussara Braga; Por que não posso ir lá fora? (Coronavírus), de Tatyanny F. Araújo; A casa e seu dono, de Elias José; Estela conta estrelas, de Hubert Schirneck e Sylvia Graupner; Esse rio é minha rua, de Paulo André Barata; Água, de Iva Rothe; Turma da Mônica economizando água, de Mauricio de Sousa; Gente tem sobrenome, de Toquinho; Os direitos das crianças, de Ruth Rocha. Como se vê, textos literários, extraídos das páginas coloridas de livros infantis e histórias em quadrinhos, foram reproduzidos em preto e branco em papel A4 branco.
No mesmo formato do material do 1º ano, os textos das fichas de leitura do 2º e do 3º ano foram: Rua e brincadeiras, de Keila Monteiro; Doroteia, a centopeia, de Ana Maria Machado; A vaca que botou um ovo, de Andy Cutbill; Meio ambiente – HQ da Turma da Mônica, de Mauricio de Sousa; Que coisa feia!, tirinha do Cascão, de Mauricio de Sousa; Nosso planeta agradece, tirinha da Turma da Mônica, de Mauricio de Sousa; Cuidando da terra, poema de Leila Maria Grilo; São João de todos os tempos, de Mastruz com Leite; Criança não trabalha, de Arnaldo Antunes e Paulo Tatit; e O direito das crianças, de Ruth Rocha. Na ausência de acesso a livros literários e mediação de leitura pela professora em sala de aula, no ensino remoto, a reprodução de textos literários em material impresso foi a maneira encontrada pela SEMEC para oferecer um material de leitura às crianças.
Na análise dos dados, observou-se que, para a formação de crianças leitoras, recorreu-se ao uso de sequências didáticas, materiais impressos, videoaulas e tecnologias para mediar a leitura e a contação de histórias na alfabetização. Nos três primeiros anos do ensino fundamental, a equipe da SEMEC Belém atuou na condução das atividades, pois propiciou formação on-line aos professores com estudo de sequências didáticas e orientação ao trabalho docente remoto (Google Meet, E-mail, WhatsApp e blog), forneceu kits pedagógicos com atividades e fichas didáticas para os alunos, favoreceu a produção e veiculação na TV de videoaulas produzidas pelos professores, envolvendo contação de histórias (Programa Educa Belém).
Convém destacar que a leitura e a escrita na infância acontecem de diferentes modos quando as crianças participam da vida social e da cultura, inclusive na leitura de mundo (Freire, 1989). Por isso, devemos proporcionar múltiplos encontros da criança com diversas modalidades de expressão; alfabetizar não se restringe à leitura em sentido restrito, mas amplo, no sentido de ler o mundo de diferentes modos, o que inclui o uso de tecnologias de comunicação (CERLALC, 2014). O uso dessas tecnologias, no ensino remoto, possibilita novos letramentos, de caráter multimodal (Rojo, 2012).
No processo de alfabetização, a mediação de leitura literária é imprescindível para a formação de crianças leitoras. No entanto, no ensino remoto, as crianças deixam de participar de atividades coletivas de mediação e contação de histórias no espaço da sala de aula e de ter acesso ao livro de literatura infantil nas bibliotecas escolares e/ou salas de leitura, pois elas passaram a realizar atividades em ambiente familiar, sob os cuidados de seus responsáveis, utilizando materiais impressos ou assistindo a vídeos. Além das videoaulas na TV EDUCABELÉM, houve relatos de que professores ministraram aulas utilizando mídias diversas: Whatsapp, Plataforma Zoom, Google Meet, Youtube, Facebook, Instagram, dentre outros.
Novas características no design dos textos podem ser detectadas a partir das aplicações no uso de novas tecnologias (García, 2018). Então, aprende-se sobre o que se estuda e sobre as formas de se comunicar, usando instrumentos da tecnologia, que embora conhecidas das crianças nem sempre estão acessíveis, pela falta de acesso à Internet e aos dispositivos tecnológicos. Daí, destacamos a importância de se manter o texto impresso no ensino remoto, favorecendo a coexistência das mídias digitais e impressas na educação.
Na passagem do ensino presencial para o ensino remoto, os professores recorreram ao uso de tecnologias e mídias digitais para se comunicar com as crianças e tiveram que contar com o apoio dos pais ou responsáveis para proporcionar a mediação da aprendizagem da leitura e da escrita, pois coube à família receber o material na escola, ouvir as orientações dos professores e orientar a criança para realizar as atividades previstas no material fornecido pela escola. Contudo, a alfabetização no ensino remoto, não dispensa a participação do professor, como um profissional articulador do trabalho educativo.
Como se vê, durante a pandemia Covid 19, com o ensino remoto o espaço de alfabetização se deslocou do ambiente escolar para o familiar no qual nem todas as crianças podem contar com pessoas que possam ler para elas, organizar seu ambiente de estudo e proporcionar as tecnologias de acesso aos conteúdos digitais.
Conforme a UNESCO (2020, p. 1), “apesar dos progressos feitos ao longo dos anos, cerca de 773 milhões de adultos em todo o mundo ainda não dominam as competências básicas em escrita e leitura”. No Brasil, em 2019, há 11 milhões de analfabetos, equivale a 6,6% da população, conforme Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD. Na região Norte, a taxa de analfabetismo é de 7,6%; no Pará cerca de 8% da população é analfabeta (IBGE, 2022). Belém tem mais de 11 mil pessoas analfabetas no Cadastro Único para Programas Sociais - Cadúnico, 2020 (Agência Belém, 2022).
O acesso à educação é direito fundamental para o desenvolvimento da cidadania, da participação na vida social e ampliação da democracia. “Os investimentos públicos em educação são de extrema importância para a redução da pobreza, criminalidade e ampliação do crescimento econômico, bem-estar e acesso aos direitos fundamentais pela população” (IBGE, 2022).
Muitas pessoas, embora alfabetizadas, não contam com muitos anos de escolaridade, assim não desenvolveram práticas leitoras (analfabetismo funcional). De modo que, no ensino remoto, nem todas as crianças puderam contar com a orientação de pais e/ou responsáveis nas atividades de leitura e escrita. Agrega-se a esse problema a falta de acesso à internet, ferramentas tecnológicas, ambiente de estudo e livros impressos.
A entrega do material didático com textos literários cria a possibilidade da realização da leitura compartilhada de textos literários. No entanto, devido às condições sociais e materiais das famílias, podemos conceber que o acesso aos textos literários foi diverso e nem sempre favorável à ambiência de leitura e às experiências de leitor; ampliando, assim, durante a pandemia, as desigualdades no acesso das crianças ao direito à educação.
Conclusiones:
Considerações finais
A Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Belém teve uma atuação importante na condução das atividades. Ela propiciou formação on-line aos professores com estudo de sequências didáticas e orientação ao trabalho docente remoto, forneceu kits pedagógicos para os alunos, favoreceu a veiculação na TV de videoaulas. Além disso, a Secretaria realizou duas avaliações da aprendizagem da leitura, escrita e matemática, gerando o Relatório de Aplicação da Atividade Avaliativa das Aprendizagens do Ciclo I – Ensino Remoto/2020.
Os professores recorreram ao uso de tecnologias e mídias digitais para se comunicarem com as crianças. Eles destacaram, como uma das ações bem sucedidas na formação de leitores de literatura, o envio por WhatsApp de vídeos de contação de histórias e o recebimento de resposta do aluno, realizando leituras. De modo que devemos reconhecer o empenho da equipe da SEMEC para orientar os docentes no ensino remoto e oferecer materiais aos professores e aos alunos, durante a pandemia Covid 19, ainda que não se possa mensurar a diversidade com que esses materiais foram explorados pelas crianças.
Os dados analisados neste estudo indicam a mudança de paradigma do ensino presencial para o ensino remoto articulada com a ideia de que a pandemia Covid 19 foi um tempo provocador de incertezas, que nos remete a outras questões: O que ensinamos às crianças nesse tempo de isolamento social? E o que as crianças aprenderam? Essas são algumas das questões que precisamos responder ao retornarmos ao ensino presencial ou híbrido, em que novos desafios se apresentam no sentido de lograr a alfabetização das crianças nos três primeiros anos do ensino fundamental.
Neste contexto, propomos alguns aspectos orientadores das práticas de alfabetização a serem considerados nas discussões acerca do impacto da pandemia no ensino de leitura literária de crianças dos três primeiros anos do ensino fundamental e os desafios da alfabetização durante e pós-pandemia:
- A alfabetização é uma condição essencial para a dignidade e participação social de toda pessoa.
- A alfabetização representa um momento importante na trajetória escolar da criança. Se ela não se alfabetiza, não pode prosseguir os estudos.
- Alfabetização é um processo. Cuidar da alfabetização das crianças, na escola, é estratégico para a vida das pessoas e para a democracia.
- A evasão e o baixo rendimento escolar devem ser superados para elevar a qualidade do ensino e combater o analfabetismo.
- Os professores devem estar inseridos em programas de formação continuada que lhes dê apoio e orientações necessárias às boas práticas de alfabetização.
- A mediação de leitura e o acesso a obras literárias são imprescindíveis ao processo de alfabetização.
- O trabalho é de todos (gestores e professores), criança a criança, turma a turma, escola a escola, família a família...
- O maior desafio consiste no ato de alfabetizar, no processo de ensino e aprendizagem que abrange tanto o ambiente escolar quanto o contexto familiar e social.
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Palabras clave:
Palavras-Chave
Alfabetização. Leitura literária. Impacto da pandemia. Infância.
Resumen de la Ponencia:
Panamá ocupa el tercer lugar en desigualdad dentro de la región latinoamericana y caribeña, de acuerdo con la CEPAL. Los efectos de este desequilibrio son severos para el bienestar y desarrollo humano de toda la población de un país, pero afecta gravemente a la infancia y la adolescencia.Las personas menores de edad son sujetos de derechos, establecidos en la Convención de los Derechos del Niño de 20 de noviembre de 1989. Aunque existe una normativa nacional y compromisos internacionales vinculantes, la vulneración de derechos de niñas, niños y adolescentes, es una realidad que les amenaza cada día, en distintas formas, horarios y lugares. La pandemia de COVID- 19 ha evidenciado la desidia en las aplicación de las garantías que deben tener su integralidad física y mental, demostrando las debilidades, falencias y falta de voluntad política de quienes administran el Estado, a la hora de establecer y aplicar políticas públicas de protección integral, las cuales deben estar amparadas en el principio del interés superior del niño y la niña,Por ello, el objetivo de este trabajo es presentar una aproximación del panorama actual relativo a la situación y condiciones en que se encuentra la niñez en Panamá, reconociendo y abordando las complejidades existentes, que salieron a relucir en el contexto de la crisis sanitaria producto de la pandemia de Covid 19. Entre otras, el escándalo por la denuncia pública de maltrato y abusos a personas menores de edad, en albergues regentados por el Estado y el aumento en los casos de embarazos de niñas y adolescentes, en edades cada vez más tempranas. Es necesario adentrarnos en conceptos y modalidades relativos a los abusos, violencia y discriminación, que están siendo ejercidas como formas del poder adultocéntrico hacia las personas menores de edad, incluyendo a las propias instituciones que tienen la obligación de brindarles protección y seguridad. Todos son problemas de vieja data, que afectan principalmente a familias y hogares con niños, niñas y adolescentes, que viven en comunidades de vulnerabilidad socioeconómica extrema. La crisis sanitaria los ha agudizado, empeorando las condiciones de vida y su entorno, en un presente que debieran estar disfrutando: del juego, las artes, el deporte, la escuela, las amistades y más. Sin embargo, todo parece indicar que serán ciudadanas y ciudadanos con un futuro incierto, en los márgenes de un sistema capitalista cada vez más perverso, lleno de políticas neoliberales insensibles a los derechos humanos de la niñez, a menos que se empiece a construir otras formas de convivencia que permitan garantizar los intereses prioritarios de las personas menores de edad.Resumen de la Ponencia:
La contingencia del COVID-19 y sus políticas de aislamiento forzaron a adoptar a la tecnología como una vía para la continuidad educativa, volviéndola ya un referente en la vida de la niñez y, por lo tanto, integrándola a su entorno cotidiano e imaginarios. El proyecto "infancias digitales oportunidades y riesgos para los mundos ideales” bajo este contexto tiene como objetivo el indagar en los procesos de apropiación cultural de las TIC en la niñez, ya sea por su integración o carencia, para dar continuidad a sus estudios. Para lograrlo, se consideró desarrollar una intervención que permita indagar sobre los procesos de apropiación, al tiempo que enseña a la niñez a aprender a aprender sobre las oportunidades de la tecnología, pero también sus riesgos. Este proyecto se integró al proyecto de “Mundos ideales” (PRONACES) con quien coincide en modelo metodológico y lo complementa al indagar en categorías relacionadas a la inclusión digital para la inclusión social, que se suman a las identificadas, para desarrollar los imaginarios posibles de mundos ideales en la niñez. Este trabajo presenta os resultados obtenidos de la aplicación de instrumentos de diagnóstico y su levantamiento información en la escuela primaria ubicada en el municipio de Zapotlán el Grande. Para esta etapa se eligió y trabajó con niños y niñas de quinto grado de la Escuela Primaria Lázaro Cárdenas del Río del turno matutino. Todos los niños y niñas participantes cuentan con 10 años de edad cumplidos. La estrategia metodológica que se siguió durante la evaluación diagnóstica y contextual de participantes está asentada en un enfoque cualitativo (Álvarez-Gayou, 2003; Vasilachis, 2006) pues durante esta fase se buscó obtener las subjetividades vertidas en las narraciones verbales y las diferentes formas en que los niños y niñas representan sus propios mundos ideales y la relación con las TIC a partir del uso de figuras con imanes, dibujos y relatos escritos.Los instrumentos diagnósticos fueron: 1) la técnica de la entrevista semiestructurada con los niños, niñas y sus papás o mamás; y 2) el instrumento de las figuras con imanes de “Mundo ideales” y su variante con dibujos en técnica libre. Esto se realizó con el doble propósito de obtener información sobre los contextos familiares, culturales y de acceso, uso y dominio TIC de cada niño o niña; y para obtener los imaginarios en torno a las TIC que tienen a partir del impacto social de la pandemia en las experiencias educativas de niñas y niños.Resumen de la Ponencia:
Trabajo infantil es toda actividad económica y/o estrategia de supervivencia, remunerada o no, realizada por la niñez, por debajo de la edad mínima de admisión al empleo o no han finalizado la escolaridad obligatoria o no han cumplido los 18 años si es trabajo.Durante 2016 Panamá realizó la IV Encuesta de Trabajo Infantil, la cual reveló que 23,855 niñas y niños en edades de 5 a 17 años están en situación de trabajo infantil. Del total, 50.7% en el rango de 10 a 14 años, 24.8% en el rango de 5 y 9 años y 24.4% en el rango de 15 y 17 años. El análisis de las Encuestas de Trabajo Infantil de los años 2014 y 2016 registró disminución del 11.9% de la niñez en trabajo infantil. La interrupción en la aplicación de encuestas durante los años 2018 y 2020 impide delimitar la tendencia de los últimos años previos a la pandemia.La pandemia, incrementó el riesgo de retrocesos en logros para erradicar el trabajo infantil. El análisis de indicadores sobre interpretación de problemas estructurales orienta el desarrollo de políticas públicas para el desarrollo de la niñez como actor social.El Informe de Análisis de Cierre de Escuelas publicado por UNICEF en marzo de 2021, destacó que en 14 países del mundo las escuelas permanecieron cerradas el primer año de pandemia. El país con más días de escuelas cerradas fue Panamá seguida de El Salvador, Bangladesh y Bolivia.Según cifras del PNUD, el empleo formal en Panamá disminuyó un 25%, que contrasta con la disminución de Latinoamérica cuyo promedio fue de 4.5%. En comparación a países con quienes comparte de cerca ingreso per cápita como Chile, el empleo formal cayó 2%, en Uruguay 7% y en Costa Rica 10%. El desempleo en Panamá pasó de 7% a 18.5% según cifras del Ministerio de Trabajo y Desarrollo Laboral. La economía panameña cayó 20.7% durante el año 2020, según cifras del Banco Mundial. Fue el sexto país del mundo de mayor caída de la economía solo superado por islas Maldivas, la isla de Santa Lucia, el Líbano, la isla de Fiji y la isla de Barbados. La caída representó para Panamá una pérdida de 13,800 millones de dólares con respecto al 2019. Problemas de carácter estructural como el aumento de la pobreza, el desempleo, el empleo precario e informal y el cierre prolongado de las escuelas, han creado condiciones de riesgo que empujan a la niñez al trabajo infantil e inciden en la dependencia de las familias del trabajo infantil. Las medidas para erradicar el trabajo infantil deben responder a las condiciones estructurales que contribuyen a la exclusión y a la desigualdad.