Este texto tece uma reflexão, de natureza qualitativa, acerca do aumento de episódios de violência doméstica de gênero - sobretudo nas relações conjugais - em tempos de pandemia da COVID-19, no Brasil, hipótese confirmada por meio do levantamento de dados obtidos em relatórios oficiais, informações veiculadas pela mídia - jornais impressos, digitais, e telejornais - bem como do mapeamento de artigos sobre a temática coletados no Google Acadêmico. O necessário isolamento domiciliar, visando à contenção da pandemia, agravou situações preexistentes das assimétricas relações de gênero, em um momento em que o agressor e a agredida estavam confinados no mesmo espaço, e restavam poucas possibilidades de escape, o que faz pensar que o lugar mais perigoso é dentro de casa. E pari passu caiu o total de medidas protetivas face à diminuição de registros de boletins de ocorrência formalizados presencialmente; muitas mulheres não conseguiam sair de casa para registrar a denúncia ou temiam represálias caso denunciassem as violências sofridas, que acabavam sendo subnotificadas. Restava às mulheres agredidas o recurso às redes sociais e de vizinhança, os telefonemas direcionados aos números 180 - Central Nacional de Atendimento à Mulher em Situação de Violência - e 190 - Polícia Militar - ou ainda, pelo whatsapp ou outros aplicativos (isso, quando o companheiro não danificava ou escondia o aparelho celular), e por criativos mecanismos de pedidos de socorro através de senhas secretas, tal como uma cruz assinalada em batom vermelho na face interna da mão, que era discretamente mostrada a atendentes de estabelecimentos comerciais, principalmente farmácias. Os Relatórios do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, de abril e de maio de 2020 traziam alarmantes registros dessa violência doméstica de gênero, que já havia se elevado e seguiria num crescendo no decorrer da pandemia. Existem, no Brasil, dispositivos legais para coibir tais atos, haja vista a Lei Maria da Penha, de 2006, considerada pela Organização das Nações Unidas como uma das três melhores legislações do mundo no enfrentamento à violência contra as mulheres. Mas é necessária a sua aplicação efetiva, e acima de tudo, há que erradicar a estrutura sexista androcêntrica, a sistêmica opressão de gênero que a pandemia revelou e continua revelando. A Covid-19, ao produzir uma compulsória proximidade e excessivo convívio entre as quatro paredes do lar, exacerbou os conflitos de gênero e escancarou o sexismo vigente. O presente trabalho, estruturado sob a perspectiva sociológica de gênero, e ancorado nas elaborações teóricas de Joan Scott, Pierre Bourdieu, além de outras estudiosas brasileiras da temática de gênero e violência, como Heleieth Saffioti, Miriam Grossi, Lourdes Bandeira, pretende contribuir para o imprescindível debate acerca da violência doméstica de gênero no Brasil, acirrada em tempos de Covid-19.
Introducción:
No momento em que o resumo deste artigo foi submetido ao XXXIII Congresso ALAS acreditávamos, erroneamente, que a pandemia já fosse, no momento do evento, um triste passado. Desta forma o título do artigo, assim como o título deste congresso, traz o termo “pós-pandemia”. A Covid-19 ainda não acabou, a despeito de encontrar-se em nova fase, na qual há decréscimo de casos de contaminação e mortes graças, sobretudo, à vacinação (no Brasil, negligenciada pelo governo negacionista de Bolsonaro, cujo mandato estende-se de 2018 a 2022, o que por certo ocasionou mais mortes do que haveria caso houvesse uma responsável e eficiente política sanitária).
Pensamos que a verdadeira pandemia é o sistema capitalista - hoje hegemonicamente neoliberal – gerador de crises, dentre elas, as crises sanitárias. Referimo-nos sempre à expectativa de retorno à normalidade. Mas, voltar à qual normal? Não foi este mesmo normal o ventre da crise sanitária da Covid-19? E não se descarta a possibilidade do “novo normal” gerar outras crises, quiçá, ainda mais graves, posto que elas encontram-se no D.N.A. do sistema; para Boaventura de Sousa Santos a pandemia vem desnudar a incapacidade deste para responder às crises, às tragédias ambientais, às pandemias.
As pandemias mostram de maneira cruel como o capitalismo neoliberal incapacitou o Estado para responder às emergências. As respostas que os Estados estão a dar à crise variam de Estado para Estado, mas nenhum pode disfarçar a sua incapacidade, a sua falta de previsibilidade em relação a emergências que têm vindo a ser anunciadas como de ocorrência próxima e muito provável. (2020, p. 28).
Também a violência doméstica de gênero não é novidade, mas as fontes que pesquisamos – relatórios oficiais, jornais impressos e digitais, telejornais, informações capturadas em sites da internet – revelam seu significativo aumento em tempos de pandemia. É importante ressaltar também a imensa quantidade de artigos sobre a temática que localizamos no Google Acadêmico, o que vem atestar a importância e urgência da presente reflexão, neste momento crucial. As medidas restritivas adotadas para controle da contaminação resultaram em um maior isolamento domiciliar que agravou situações preexistentes, em momentos em que o agressor e a agredida ficam confinados (as) no mesmo espaço físico, com reduzidas possibilidades de escape desta, o que faz pensar que o lugar mais perigoso é dentro de casa.
Desarrollo:
Neste artigo, elaborado sob a perspectiva sociológica e feminista, trazemos dados do Brasil que, infelizmente, não é caso isolado, posto que o quadro de acirramento da violência de gênero na Pandemia é mundial; cenário comum à grande parte dos países, que atinge não só mulheres europeias, mas também de outras nacionalidades, que residem em solo europeu.
Em matéria publicada na Folha de São Paulo, a articulista Ana Estela de Sousa Pinto destaca que:
No primeiro mês de quarentena europeia (de meados de março a meados de abril), a Revibra [Rede Europeia de Apoio às Vítimas Brasileiras de Violência Doméstica – Europa] atendeu a 22 desses casos, quase o dobro dos 12 registrados no mês anterior nos oito países em que atua (Portugal, Bélgica, Alemanha, França, Holanda, Itália, Luxemburgo e Reino Unido).Não é uma medida estatística, mas reforça a tendência apontada pela polícia francesa (crescimento de 30% nas queixas), pelo governo espanhol (18% mais ligações nas duas primeiras semanas de quarentena) e pelo continente todo. E fora da Europa também, diz a eurodeputada tcheca Radka Maxová, uma das nove que na semana passada pediram um plano de emergência ao Poder Executivo da UE. (PINTO, Folha de São Paulo, 17.04.2020, Caderno A, p. 14).
Mas, falaremos do Brasil, cujos dados integram o mosaico mundial, e onde a pandemia ocorre sob um governo autoritário, com um presidente sexista e misógino, o que potencializou os danos. Vale registrar, a título de exemplo que, em dezembro de 2014 quando o presidente era, então, deputado federal pelo PP – Partido Progressistas, do Rio de Janeiro, no plenário da Câmara Federal, agrediu verbalmente a deputada federal Maria do Rosário Nunes, do PT – Partido dos Trabalhadores do Rio Grande do Sul, afirmando que não a estupraria porque ela não merecia, por ser feia[1].
Costa et al. corroboram esta responsabilização do governo bolsonarista, em artigo no qual analisam as representações da violência de gênero na pandemia em memes e vídeos que circularam nas páginas do Facebook, Twitter, Instagram e WhatsApp:
No caso brasileiro, há um fator agravante, pois, as desigualdades de gênero são minimizadas pelo atual poder federal. Fato que se traduz na ausência de políticas públicas para o enfrentamento do aumento das violências de gênero durante a pandemia e que, em grande medida, legitima e reforça o discurso misógino e violento de uma parte da população brasileira, que é reproduzido nas redes sociais. (COSTA, et al., 2021, p. 161).
O ápice da violência doméstica de gênero no Brasil ocorreu no ano de 2020, mais precisamente a partir de março de 2020 quando começaram as medidas restritivas de circulação que resultaram em maior isolamento doméstico. Segundo o documento intitulado Violência contra as mulheres em 2021, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública – FBSP -, que tem como fonte os boletins de ocorrência das Polícias Civis das 27 Unidades da Federação, “houve um aumento dos casos [de feminicídio] entre os meses de fevereiro e maio de 2020, quando houve maior restrição nas medidas de isolamento social”. (2021, FBSP, Oficina 22, p. 5).
Em 2020, foram registradas mortes com violência de 1351 mulheres; um crescimento de 22,2% de feminicídios no período entre 2019 e 2020, segundo o documento Violência doméstica durante a pandemia da Covid-19, de 29/05/20, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública – FBSP, a pedido do Banco Mundial.
Ao mesmo tempo em que cresciam os casos de violência contra a mulher, houve decréscimo da notificação de casos, por meio de Boletins de Ocorrência – B.O.s – formalizados presencialmente e decorrente queda de medidas protetivas. Em matéria publicada na Folha de São Paulo, Pinho, com base em levantamento do FBSP, ressalta que “a redução de registro é incoerente com o aumento de assassinatos de mulheres e dos chamados ao, 190 por violência doméstica [...] o número de mulheres assassinadas dentro de casa quase dobrou no período de quarentena em comparação com o período similar 2019” (PINHO, 2020, Caderno B. p.2). Ou seja: muitas mulheres não conseguiam sair de casa para registrar a denúncia ou não a faziam por temer represálias se denunciassem as violências sofridas. Pode-se concluir que os índices de violência excessivamente altos, ainda eram subnotificados; o panorama real era ainda mais grave do que os dados revelavam.
Restavam às mulheres em situação de violência doméstica, os telefonemas ao número 190, da Polícia Militar, ou o disque 180 – Central de atendimento à mulher, canal de denúncia, como política pública de enfrentamento à violência contra a mulher em âmbito nacional e internacional, que no Brasil atualmente é oferecido pela Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos – MMFDH[2]. Isso, quando o companheiro não escondia ou danificava o seu aparelho celular, o que também a impedia de recorrer a aplicativos, tal como o whatsapp, para pedir ajuda.
Algumas vezes elas utilizavam estratagemas, como pedidos de socorro por meio de senhas, dentre estas, uma cruz assinalada com batom vermelho na palma da mão, discretamente mostrada a atendentes em estabelecimentos comerciais, sobretudo farmácias, centros de saúde, e hospitais.
Marques et al. (2020) afirmam que “segundo dados do Ligue 180 disponibilizados pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos houve um aumento de cerca de 17% no número de ligações com denúncias de violência contra a mulher durante o mês de março, período inicial da recomendação do distanciamento social no país”. E, trazendo dados de algumas unidades da Federação, os (as) autores (autoras) prosseguem informando que:
No Rio de Janeiro, dados do plantão do Ministério Público Estadual revelam um aumento de 50% nos casos de violência doméstica já no primeiro final de semana após os decretos estaduais que propuseram o distanciamento social, sendo a maior parte das denúncias envolvendo violência contra a mulher. Do mesmo modo, no Paraná, houve um aumento de 15% nos registros de violência doméstica atendidos pela Polícia Militar no primeiro fim de semana de distanciamento social (MARQUES et al., 2020).
Não se pode deixar de assinalar que da mesma forma que não podemos falar de mulheres, abstrata e genericamente, também é preciso pensar nas marcas interseccionais de gênero e raça-etnia da violência contra as mulheres, na medida em que os eixos de dominação, opressão e exploração são imbricados e impactam de forma desigual os sujeitos sociais. No evento denominado 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher, a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher e a Secretaria da Mulher na Câmara discutiram a situação específica da violência contra as mulheres negras no contexto da pandemia ressaltando que a violência contra a mulher é agravada pelo racismo estrutural: “mulheres negras foram em 2020, 51% das vítimas de lesão corporal e 52% das vítimas de estupro” (BRASIL, 2021).
O documento Violência contra as mulheres em 2021, anteriormente referido, registra que relativamente a 2020, período de mais rígido confinamento domiciliar, assiste-se em 2021 o decréscimo do número de mulheres vítimas de feminicídio – ainda que se mantenha assustadoramente elevado - já em momento de início de abrandamento das medidas restritivas de circulação em espaços públicos, o que comprova o quadro de violência vivenciado pelas mulheres e também pelas crianças do sexo feminino durante a pandemia.
Em 2021, ocorreram 1.319 feminicídios no país, recuo de 2,4% no número de vítimas registradas em relação ao ano anterior. No total, foram 32 vítimas de feminicídio a menos do que em 2020, quando 1.351 mulheres foram mortas (...)
Em 2021, em média, uma mulher foi vítima de feminicídio a cada 7 horas. (...)
A taxa de mortalidade por feminicídio foi de 1,22 mortes a cada 100 mil mulheres, recuo de 3% em relação ao ano anterior, quando a taxa ficou em 1,26 mortes por 100 mil habitantes do sexo feminino. (2021, FBSP, Oficina 22, p.3).
Não restam dúvidas quanto ao aumento da violência no confinamento doméstico em tempos de Covid-19. Se entre quatro paredes, “o inferno são os outros” (SARTRE, 2022), por que os números gritam a violência contra a mulher? Por que não gritam a violência contra o homem? Não que estas não possam acontecer ou não tenham acontecido, mas as estatísticas são irrisórias, haja vista que segundo o Conselho Nacional de Justiça, no presente ano de 2022 a população carcerária brasileira está constituída por 867 mil homens e 49 mil mulheres; estas perfazem, pois, aproximadamente 6% da totalidade de pessoas aprisionadas.
Estamos diante de um sexismo estrutural que não se caracterizaria como patologia ou desvio individual, mas como permissão social[3] concedida aos homens (BANDEIRA, 2019).
Joan Scott (1995), desde o seminal texto dos Estudos de Gênero, publicado em 1980, vem progressivamente auxiliando-nos a entender o gênero como a organização social da diferença sexual, marcada pelo poder, com supremacia do homem. E, especificamente, acrescentamos, do homem branco, de elite e heterossexual.
Essas relações hierárquicas com privilégio masculino, e em desfavor das mulheres e de todas as pessoas que subvertem a cisheteronormatividade, configuram-se como violências de diferentes dimensões: a desigual divisão sexual do trabalho também é uma forma de violência; a sub-representação da mulher nos espaços político-institucionais é mais uma forma de violência. Há tantas outras violências de gênero, em diferentes formatos, em diferentes âmbitos, em diferentes instâncias e espaços sociais. A violência das desigualdades nas relações sociais reverbera nas relações interpessoais, tais como as que constituem o escopo deste artigo: a violência doméstica de gênero.
Heleieth Saffioti (2001) alerta que o conceito de violência de gênero, que materializa o sistema de sexagem é amplo, e pano de fundo de diversas formas de violência; a autora distingue a violência doméstica (que pode ser contra não parentes, por exemplo, contra empregadas domésticas) e a violência intrafamiliar (que recai entre os membros da família, não apenas sobre as mulheres, mas também sobre idosos (as), crianças e adolescentes, não se restringindo necessariamente ao território físico do domicílio).
Destarte, é necessário enfatizar o tipo de violência doméstica sobre a qual este artigo versa. Ele propõe-se, especificamente, a refletir sobre a violência de homens contra mulheres - cisgênero ou transgênero - com as quais mantêm vínculo conjugal, e que é exercida a partir do território domiciliar, em situação de confinamento pandêmico.
O Brasil tem dispositivos legais contra a violência de gênero, reconhecidos internacionalmente, tal como a Lei 11.340/ 2006, denominada Lei Maria da Penha, em homenagem à luta da farmacêutica brasileira Maria da Penha Maia Fernandes por justiça e punição de seu marido, Marco Antônio Heredia Viveros, que a tornou paraplégica após tentativa de feminicídio.
No cenário da violência doméstica e familiar contra a mulher, a Lei 11.340/2006, define cinco formas dessa violência, que visa coibir:
I - física - entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
II - violência psicológica - entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação. (esta não é a redação original, mas, a alterada pela Lei nº 13.772, de 2018).
III - sexual - entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - patrimonial - entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - moral - entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
A Lei Maria da Penha foi considerada pela ONU como uma das melhores legislações do mundo no enfrentamento à violência contra as mulheres. E ainda assim, a violência de gênero não cessa de aumentar; os instrumentos jurídicos não têm dado conta de reverter a estrutura sexista androcêntrica, a opressão sistêmica de gênero, que a pandemia veio escancarar.
Tamanha violência justifica a instituição da Lei 13.104/2015, durante o governo da presidenta Dilma Rousseff[4], nomeada Lei do Feminicídio que altera o Código Penal de 1940, qualificando os assassinatos de mulheres, cometidos simplesmente por elas serem mulheres; crimes de ódio motivados pelo sentimento de posse.
Os feminicídios têm sido cruéis, sádicos, e não raro praticados diante dos próprios (as) filhos (as) ou outros (as) familiares. Quando não resultam em morte, a tentativa deixa profundas sequelas, não raro incapacitantes. Recentemente telejornais e sites da internet veicularam o caso da jovem Tayane Caldas, de 18 anos, que em 24/05/22, teve sem permissão, sem consentimento, o nome do ex-namorado tatuado em seu rosto e partes íntimas; ato de violência que a tem obrigado a passar por sucessivos procedimentos médicos na tentativa de apagar a indesejada e humilhante tatuagem.
Faz lembrar o trecho da música Disparada, de Geraldo Vandré, que na voz de Jair Rodrigues foi a 2ª classificada no Festival da Música Popular Brasileira de 1966, organizado pela TV Record: “porque gado a gente marca; tange, ferra, engorda e mata; mas com gente é diferente”. Entretanto, parece que não, para os homens imbuídos da masculinidade tóxica e agressiva que o sexismo androcêntrico forja.
Diante do horror de tais atos, o feminicídio foi incluído - como precisava ser - no rol de crimes hediondos, com aumento da penalidade, a ser cumprida em regime fechado, sem possibilidade de indulto, anistia, graça, além de outras restrições jurídicas.
Diuturnamente têm sido tomadas medidas paliativas, tais como a disponibilização de boletins de ocorrência eletrônicos que possibilitam o registro de ocorrências de forma remota, pela Internet; campanhas de divulgação de serviços de proteção à mulher; fortalecimento de redes locais de apoio mútuo; círculos de vizinhança; diversificação de canais de denúncias, dentre outras, com limitado êxito para debelar o cenário de violência.
Nem sempre a violência é material e deixa marcas visíveis no corpo, no patrimônio; a violência pode deixar marcas profundas no psiquismo, no sistema emocional, na “alma”. Deixemos que Bourdieu fale sobre essa violência simbólica:
Sempre vi na dominação masculina, e no modo como é imposta e vivenciada, o exemplo por excelência desta submissão paradoxal, resultante daquilo que eu chamo de violência simbólica, violência suave, insensível, invisível a suas próprias vítimas, que se exerce essencialmente pelas vias puramente simbólicas da comunicação e do conhecimento, ou mais precisamente, do desconhecimento, do reconhecimento ou, em última instância, do sentimento. (BOURDIEU, 1999, p.7,8).
Mas, nem sempre a violência simbólica é suave, insensível, invisível, como conceitua o sociólogo francês, no excerto acima transcrito.
E fica no passado o dito popular “em briga de marido e mulher não se mete a colher”. Hoje, não meter a colher em briga de marido e mulher é omissão, é conivência. Inclusive, o documento Violência doméstica durante a Pandemia da Covid-19, 26/04/2020, do FBSP registra o aumento de 431% nos relatos de brigas entre casais vizinhos no Twitter entre fevereiro e abril de 2020.
Em outra matéria publicada na mesma edição da Folha de São Paulo anteriormente citada, a articulista Thaiza Pauluze informa a existência de vídeos na internet durante a quarentena, que ensinam a autodefesa às mulheres: “como evitar um agarrão de pulso, soco, puxão de cabelo, estrangulamento ou estupro (...)”. (PAULUZE, 2020, B1). Foram muitas e variadas as estratégias adotadas para a sobrevivência.
[1] Em 2019 a deputada Maria do Rosário foi vitoriosa em uma ação judicial movida contra Jair Messias Bolsonaro, recebendo R$ 20.114,01, como indenização por danos morais, valor este que doou a entidades de combate ao feminicídio e à violência contra a mulher.
[2] O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos – MMFDH, do governo Bolsonaro representa um retrocesso no enfrentamento da violência contra a mulher e comunidade LGBTQIA+, posto que retira da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres/SNPM - criada em 2003, no governo Lula - o status de ministério e extingue diversos órgãos colegiados e comitês que respondiam por tal enfrentamento.
[3] O grifo é nosso.
[4] Dilma Rousseff, a única mulher presidenta do Brasil, eleita em 2010 e reeleita em 2014, foi deposta por um golpe jurídico-midiático-parlamentar em 2016, tendo sido, durante as suas gestões, alvo de grosseiros ataques misóginos.
Conclusiones:
As perguntas que ficam são: por que a necessidade de tais instrumentos legais e de medidas paliativas? E por que não conseguem erradicar a violência contra as mulheres?
Para responder, basta retornar à Lourdes Bandeira (2019): é a trama do sexismo sistêmico, do sexismo estrutural.
Heleieth Saffioti (2019) em profunda reflexão ontológica contribui para localizarmos a origem dessa violência masculina contra a mulher no entendimento que o homem dela tem como objeto, e não sujeito. No âmago está a reificação, a coisificação da mulher, ou a sua secundarização social como ser que é periférico; não central.
Simone de Beauvoir publica, em 1949, O Segundo Sexo, texto precursor dos Estudos de Gênero estruturados na década de 1970, que é de fundamental importância para se entender a construção da mulher como este ser secundário, periférico, como o outro: “a mulher determina-se e diferencia-se em relação ao homem e não este em relação a ela; a fêmea é o inessencial perante o essencial. O homem é o Sujeito, o Absoluto; ela é o Outro” (BEAUVOIR, 1980, p. 10).[1] A filósofa feminista e existencialista demonstra que nada há de biológico capaz de justificar essa primazia do homem; há, sim, uma perversa construção histórica e sociocultural.
Assim sendo, se nada há de natural nessa desigualdade entre pessoas de diferentes identidades sexuais e de gênero, se ela foi historicamente construída, pode haver desconstrução e construção de vivências mais saudáveis e não violentas.
Essa mulher-outro, que é objetificada, inferiorizada e agredida, pode e precisa ser o sujeito da denúncia contra a agressão que a atinge; sujeito da luta contra a violência de gênero; sujeito edificador de relações humanas em bases mais justas, igualitárias e harmônicas.
[1] Bourdieu corrobora que o princípio masculino é tomado como a medida de todas as coisas. (1999).
Bibliografía:
BANDEIRA, Lourdes. (2019). Violência de gênero: a construção de um campo teórico de investigação. IN: HOLLANDA, Heloisa Buarque (org.). Pensamento feminista brasileiro - formação e contexto. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, p. 293 – 313.
BEAUVOIR, Simone. (1980) O segundo sexo. Vol 1- Fatos e Mitos. Rio de janeiro: Ed. Nova Fronteira.
BOURDIEU, Pierre. (1999). A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.
BRASIL, Lei nº. 11.340, de 7 de agosto de 2006, (Lei Maria da Penha). Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm. Acesso em 06.01.23.
BRASIL. Lei nº 13.104, de 09 de março de 2015 (Lei do Feminicídio).Disponível em https://legislacao.presidencia.gov.br/atos/?tipo=LEI&numero=13104&ano=2015&ato=defMTS65UNVpWTacb. Acesso em 09.01.2022.
BRASIL. Debatedores dizem que violência contra a mulher é agravada pelo racismo estrutural, 18/11/2021. Fonte: Agência Câmara de Notícias. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/828714-debatedores-dizem-que-violencia-contra-a-mulher-e-agravada-pelo-racismo-estrutural/. Acesso em 13.08.22.
COSTA, Patrícia; GROSSI, Miriam; VALCUENDE DEL RÍO, José; COSTA, Luísa; OLIVEIRA, Maria. (2021). Violência contra as mulheres na pandemia da COVID-19: uma análise de noticias, memes e vídeos. Revista del Laboratorio Iberoamericano para el Estudio Sociohistórico de las Sexualidades, 5 art. 7, 143–186. https://doi.org/10.46661/ relies.5705.
FORUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA – FBSP. (2020 a). Violência doméstica durante a Pandemia da Covid-19, ed. 26/04/2020. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2018/05/violencia-domestica-covid-19-v3.pdf. Acesso em 06.01.22.
FORUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA – FBSP. (2020 b). Violência doméstica durante a Pandemia da Covid-19, ed.2, 29/05/2020. Disponível em https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2020/06/violencia-domestica-covid-19-ed02-v5.pdf. Acesso em 06.01.22.
FORUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA – FBSP. (2021). Violência contra as mulheres em 2021. Oficina 22. Disponível em https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2022/03/violencia-contra-mulher-2021-v5.pdf. Acesso em 06.01.23.
MARQUES, Emanuele Souza, et al. (2020) A violência contra mulheres, crianças e adolescentes em tempos de pandemia pela COVID-19: panorama, motivações e formas de enfrentamento. Cadernos de Saúde Pública. 36 (4), 2020. Disponível em
https://www.scielo.br/j/csp/a/SCYZFVKpRGpq6sxJsX6Sftx/. Acesso em 06.01.2023.
PAULUZE, Thaiza. (2020). Vídeos ensinam a mulheres autodefesa na quarentena. Folha de São Paulo, 20/04/20, B1.
PINHO, Ângela. (2020). Cai total de medidas protetivas contra violência doméstica. Folha de São Paulo, 20.04.2020, Caderno B, p. 2.
PINTO, Ana Estela de Sousa. (2020). Pandemia eleva denúncias de violência doméstica na Europa. Folha de São Paulo, 17.04.2020, Caderno A, p. 14.
SAFFIOTI, Heleieth. (2019). Violência de gênero: o lugar da práxis na construção da subjetividade. IN: HOLLANDA, Heloisa Buarque (org.). Pensamento feminista brasileiro - formação e contexto. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, p. 139 – 161.
SAFFIOTI, Heleieth. (2001) Contribuições feministas para o estudo da violência de gênero. Cadernos pagu (16), p. 115 – 136.
SANTOS, Boaventura de Sousa. (2020). A cruel pedagogia do vírus. Coimbra: Almedina.
SARTRE, Jean-Paul. (2022). Entre quatro paredes. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.
SCOTT, Joan W. (1995). Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade. Porto Alegre, vol.20, n.2, jul./dez. 1995, p. 71- 99.
Palabras clave:
Gênero. Violência Doméstica. Brasil. Covid-19
#00244 |
Mulheres negras e representação política no cenário brasileiro – desafios interseccionais e decoloniais: antes , durante e pós-pandemia
O artigo propõe analisar a representação política das mulheres negras no espaço institucional do poder legislativo no contexto brasileiro contemporâneo. Procura-se problematizar o “lugar” de representação das mulheres negras através das teorias do feminismo negro interseccional e decolonial, articuladas à crítica da sociologia política sobre a participação- representação de vereadoras negras eleitas nas Eleições Municipais de 2016, tomando como base o CENSO de 2010 e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE, 2016) nos Estados da Bahia, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Esses dados serão confrontados e analisados numa linha de evolução com os dados obtidos sobre as Eleições Municipais de 2020, na cidade de Salvador, na Bahia, no contexto da pandemia da COVID-19. Nosso objetivo é demonstrar, através dos dados do TSE de 2020, quais foram os marcadores que influenciaram na eleição de mulheres negras à vereança no contexto da pandemia em 2020, em comparação às eleições de 2016, antes da pandemia. Interessa-nos identificar se houve mudanças, evoluções e ou permanências acerca da representação/ sub-representação das mulheres negras nos espaços legislativos de poder durante o início da pandemia até o pleito eleitoral em 2020; quais foram os avanços das lutas das feministas negras contra à exclusão, o racismo, o patriarcalismo, à violência e a sub-representação política nos e dos espaços do poder legislativo no Brasil durante a pandemia e na pós-pandemia? As pesquisas atuais sobre a participação e representação das mulheres brasileiras no parlamento apontam uma baixa participação feminina nas esferas de representação no poder Legislativo. Segundo tais estudos, o índice de participação das mulheres no parlamento no ano de 2012, não ultrapassou o percentual 8,6% no total. (MATOS 2011, 2015; ALVES; 2014; p.57). Se o debate sobre a baixa participação das mulheres nos espaços institucionais de poder exigiu um repertório do campo dos estudos feministas na denúncia contra a supremacia masculina nos referidos espaços, quando analisamos a participação e a representação política institucional das mulheres negras brasileiras, este debate é praticamente silencioso nos centros acadêmicos brasileiros, ou pelo menos era, até o assassinato da Vereadora negra brasileira, Marielle Franco. Argumentamos (PACHECO, 2013; GONZÁLEZ, 1984) que existem vários sistemas múltiplos de representações simbólicas colonialistas produzido sobre os corpos das mulheres negras brasileiras que as afeta e as exclui dos espaços do poder parlamentar.
#00262 |
VIOLÊNCIA DOMESTICA E DE GENERO CONTRA MULHERES NO BRASIL: REFLEXÕES A PARTIR DA PANDEMIA COVID-19
O objetivo deste trabalho é refletir sobre a proteção das mulheres no combate à violência, sobretudo a de gênero e doméstica; sobre a criação de legislação que estabeleça proteção e direitos e sua efetivação no território brasileiro. Este caminho se fez(az) com as leis de cotas na política, do aborto, de combate a importunação sexual e do feminicido, como forma de garantir direitos e proteçao às mulheres, tanto na América Latina quanto Brasil. No caso brasileiro, à exceção do voto feminino estabelecido em 1942, outras legislações que conferem direitos e proteção às mulheres surgem a partir dos anos 1980, destaque para a criação das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deam’s - 1985); Lei Maria da Penha (lei 11.340/2006), objetivando coibir a violência doméstica e familiar por meio de uma legislação mais especifica que imputava ao agressor penas mais duras e à mulher maior proteção. Lei das domésticas (lei 150/2015) que regulamenta o trabalho doméstico. Lei do feminicidio (lei 13.104/2015). Todavia, em terras brasileiras, os dados não corroboram com esta tese de que maior punição e mais legislação diminuem o índice de violência: após 13 anos da instituição da referida lei, os índices não retrocederam. Se tomarmos a primeira década deste século para refletir sobre a taxa de mortes de mulheres por 100 mil habitantes, veremos que apenas em 2007, os números decresceram levemente. No caso particular do Tocantins, estado que conta com 139 municípios e 14 delegacias especializadas de atendimento à mulher (Deam), a situação parece ser o reflexo do cenário latino e nacional. Perspectivas acerca da equidade de salários e tributação do trabalho de homens e mulheres são ainda desafios postos e podem ser um instrumento de redistribuição e reconhecimento dos papeis e ações dos sujeitos nas sociedades. O cenário de violência se acentuou durante a pandemia de covid-19. Se nas epidemias e Ebola e Zika as mulheres foram mais afetadas em virtude da sua condição de pobreza, na Sars-coc-2 ‘a conta’ veio em razão de todos estarem em casa por causa das restrições (lockdown, trabalho remoto, escolarização das crianças, etc) e, como sabemos de antemão, o principal violentador da mulher está, na maioria das vezes, debaixo do mesmo teto e faz parte de sua rede de relações parentais. Além de uma reflexão mais abrangente e de cunho teórico, este texto pretende verificar o caso especifico de uma cidade pequena – Tocantinópolis (TO) - no interior do Brasil, ao analisar os dados da delegacia de proteção à mulher vitima de violência durante a pandemia de covid-19.
#00459 |
Ajustes en las jornadas de trabajo de las mujeres durante la pandemia del COVID-19, Ecuador.
Sheila Janet Rangel Gómez1
;
Fernando Fredi Rea García
1
;
Yonaiker del Mar Navas Montes
1
;
Allison Camila Vasquez Aldaz
1
En el momento actual, las sociedades mundiales atraviesan un conglomerado de crisis que ha conllevado a los Estados a formularse diversas preguntas, entre ellas la explicación o repercusiones que tienen las sociedades durante y después de la pandemia, pero sobre todo el cómo solucionar o reactivar la economía. Pero, es común que se le tome una menor importancia a los actores principales que movilizan la economía de los países, que son las sociedades en su conjunto a través del trabajo, esa labor constante y muchas veces invisible de los grupos vulnerados como son: los indígenas, los niños, los adultos mayores y las mujeres, es sin duda, la que tiene la posibilidad de reactivar la economía, siempre y cuando se desarrolle en condiciones adecuadas y en pro de la mejora de la calidad de vida. Sin embargo, en estos años de pandemia se han incrementado las desigualdades sociales. En este sentido, el objetivo que se persigue en la investigación es vislumbrar el trabajo invisible de las mujeres y las horas que han presentado ajustes a causa de la pandemia, implementando el concepto doble jornada, aunando a que el trabajo se ha convertido en una forma de cautiverio trasladándolo al hogar que se ha trasformado en el lugar principal en donde se cumple la jornada laboral duplicada o en ocasiones triplicada. Es así, que se aborda una metodología de recolección bibliográfica y de análisis de datos estadísticos con información que tiene como resultado la evidencia de esta doble jornada, abordando el caso de las mujeres en el Ecuador. Finalmente, es de suma importancia denotar las desigualdades de la vida productiva y reproductiva que llevan a cabo las mujeres en la privacidad de los hogares.
#00469 |
A precariedade tem rosto de mulher pobre - relatos de auxiliares de cozinha da cidade de Santa Maria (BR) sobre o trabalho na pandemia da COVID-19.
O seguinte trabalho é parte da pesquisa de conclusão de curso da autora, que visou compreender a percepção dos auxiliares de cozinha em relação à participação política e jornada de trabalho, além do impacto da pandemia na ocupação e na vida privada. Nos primeiros momentos da pandemia da COVID-19 já se evidenciava que as mulheres seriam as mais afetadas. No Brasil, a primeira morte causada pelo vírus foi a de uma trabalhadora doméstica contaminada pelos patrões vindos da Itália. Cleonice, 63 anos, foi muitas das vítimas que precisam trabalhar presencialmente diante de uma pandemia global. Mesmo sob pressão contrária, prefeitos e governadores incluíram o trabalho doméstico como essencial logo nos primeiros dias de pandemia, no Brasil. Na cidade de Santa Maria (BR), no primeiro trimestre do ano de 2020, restaurantes e lancherias também se unem para a categoria de trabalho essencial, podendo abrir apenas para a produção de alimentos de entrega via entrega. Dada a feminização do trabalho, no Brasil a ocupação de cozinharira e auxiliar de cozinha são-maiores compostas por mulheres. Dessa forma, a autora contatou 5 trabalhadores auxiliares de cozinha de um shopping da cidade, que relataram suas percepções frente ao trabalho na pandemia. O medo do desemprego, o contágio com o vírus e a preocupação com os familiares foram os pontos mais comentadores nas entrevistas. Essas trabalhadoras, vistas como essenciais diante da crise sanitária, política e econômica, precisaram se desdobrar tanto em suas casas quanto aos estabelecimentos, vivenciando ainda mais precarização e uma rotina extenuante. Elas relataram o cotidiano de trabalho e os novos cuidados para manter a segurança dos alimentos e da equipe, além do medo do contágio, do desemprego e da preocupação com os familiares. Uma das entrevistadas contou que para evitar o transporte público lotado, ela estava fazendo o trajeto a pé, outros relataram levar mudas de roupas para trocar antes de voltar para a casa. O fusivo com o governo brasileiro, tanto na esfera presidencial, quanto estadual e municipal também foi um ponto levantado, elas apontaram que a política dos governos era de preocupação com as empresas privadas e não com a saúde pública, deixando a desejar a fiscalização do transporte público, não oferecendo máscaras e álcool em gel para os trabalhadores além da campanha de amenizar a gravidade da pandemia. Em relação ao que esperava o governo, todas elas responderam que o ideal seria uma quarentena eficaz e uma capaz política de assegurar o direito de sobrevivência de toda a população. Sem garantias, segurança, com aumento de trabalho e instabilidade salarial a rotina e percepções dessas trabalhadoras frente a pandemia escancarou aquilo que nós, pesquisadores do mundo do trabalho já sabe, que a precariedade tem rosto de mulher pobre.
#01273 |
Mujeres rurales de Yucatán en tiempos de pandemia y pospandemia. Reflexiones situadas e implicadas
La pandemia provocada por el virus SARS Co-V2 develó que el hogar no siempre es un espacio seguro, particularmente para Yucatán, estado que desde un discurso oficial se reconoce como el más pacífico de México. Entre agosto y septiembre del año 2020, el Sistema Nacional de Seguridad Pública informó un incremento en un 37% de quejas por violencia familiar, repuntando el delito de feminicidio con seis hechos hasta el mes de septiembre de ese año. Si bien la pandemia ha sido ante todo un fenómeno de corte urbano, es en el ámbito rural donde se conjugan viejas y nuevas vulnerabilidades por las condiciones que históricamente ha presentado ese espacio y su población, sobre todo la indígena. Por ejemplo, los datos del documento Covid-19 México: panorama en población que se reconoce como indígena mostraron ininterrumpidamente el rostro de la epidemia en los sectores menos favorecidos del país, y Yucatán, estado donde el 65.4% de su población total se reconoce como indígena (INEGI, 2016) encabezaba la lista en número de contagios y defunciones. En el caso de las mujeres rurales-indígenas de esa entidad los datos estadísticos muestran cómo han vivido la contingencia, evidenciando la desigualdad y acceso a los servicios de salud y, que los virus de las violencias pueden ser más letales que la Covid-19. Estos datos se confirman con investigaciones como la que actualmente desarrollo, que resalta la trascendencia de continuar documentando lo que acontece en territorios rurales desde miradas que ponderen la diferencia signada a partir del dato biológico.En correspondencia, en esta ponencia reflexiono el fenómeno de las violencias experimentadas por mujeres rurales de Yucatán en tiempos de pandemia y pospandemia. Empleo datos estadísticos oficiales, notas hemerográficas y fuentes científicas como material complementario para encauzar la discusión; los datos cualitativos emanan del trabajo de campo en municipios del centro y sur de estado, contextos donde he desarrollado mis investigaciones en los últimos años. El acercamiento es de corte etnográfico, con una perspectiva interseccional que me permite identificar las aristas y vectores que configuran las desigualdades.
#03159 |
El efecto rebote de las violencias en contra de las mujeres derivado de la pandemia por la Covid-19 y las medidas de aislamiento en México y Colombia
Martha Nateras
1
;
Paula Valencia2
1 - Universidad Autónoma del Estado de México.2 - Universidad de Medellín.
La crisis provocada por la Covid-19 afectó de manera rápida y progresiva a América Latina y ubicó a las mujeres entre los grupos poblacionales con mayor impacto por la pandemia. Esto no solo desde el punto de vista estructural, por los altos niveles de desocupación y desempleo, y un retorno a las labores de cuidado no remunerado y a la dependencia económica; sino por las violencias directas que se incrementaron en el ámbito doméstico. Sin embargo, en países como Colombia y México, dichas violencias conviven con contextos de violencia criminal, lo que obliga a revisar la variación en el comportamiento de dichas violencias, tanto en el periodo de aislamiento y reducción de la movilidad social, como en el momento posterior de liberación de esas medidas restrictivas. Según Vargas et al.(2022) “el contexto covid–19 transformó los repertorios del delito que lo dinamizan y el comportamiento de los actores criminales, reflejando cambios sustanciales tanto en las formas que tomaron los delitos como en los tipos de actores y la intensidad del crimen en los microterritorios.” (p. 97). Por tanto, durante la cuarentena el crimen se transformó, pues los actores se adaptaron al nuevo contexto, luego de una breve curva de aprendizaje criminal. Esas transformaciones y reacomodos del crimen dependieron de los cambios en las dinámicas sociales, permeadas por las restricciones de movilidad y nuevas formas de interacción. No obstante, después de este cambio inesperado de los contextos socio-criminales, por las medidas de contención por la emergencia sanitaria, a partir de que inicó la fase de “normalización”, se empezó a observar un fenómeno que en criminología se denomina “efecto rebote en el delito”, el cual muestra cómo luego de la reducción que se registró de los índices delictivos, durante el periodo de resguardo, se presenta un aumento súbito. Por tanto, el objetivo de esta ponencia es analizar el efecto rebote de las violencias en contra de las mujeres derivado la pandemia y las medidas de aislamiento en México y Colombia. FuentesVargas, L., Ib ez, R., Norza, E., & Casilimas, E. (2022). Enfoque de policía proactiva en los cambios recientes del crimen durante el escenario de pandemia del covid-19. Revista Criminalidad, 64(1), 95-108.