Resumen de la Ponencia:
Estudos feministas consideram que o Estado pode realizar ações específicas com o objetivo de alterar as condições estruturais das mulheres na sociedade. Um governo pode criar mecanismos institucionais de mulheres na estrutura estatal, os quais baseiam-se tanto em políticas públicas como na inclusão de mulheres na estrutura política e administrativa do Estado. A criação de programas de governo permitem que a problemática das mulheres e a questão de gênero adquira status de interesse público e integre a agenda pública. A criação de programas para as mulheres com visão das diferentes dimensões simbólicas, é uma das estratégias para reduzir as desigualdades. Os programas de governo para as mulheres proporcionam uma rede em âmbito da administração pública e se constituem na difusão de novas ideias e propostas de gestão. Nas últimas três décadas o município de São Paulo registrou experiências de políticas públicas para as mulheres. Essas políticas não têm ocorrido de forma contínua, mas pode-se observar uma melhora na configuração institucional do órgão responsável por sua implementação. Nesse período, São Paulo tem sido um importante centro de debate e desenvolvimento de ações institucionais em relação as mulheres no campo dos direitos sexuais e reprodutivos, educação, combate à violência sexista, planejamento urbano e geração de emprego e renda. As medidas de isolamento social aplicadas para o enfrentamento da pandemia de Covid-19 suscitou o problema de violência contra mulheres. Entre março e abril de 2020 foi registrado em 12 estados brasileiros aumento de 22,2% de casos de feminicídio e uma queda no número de registros de boletim de ocorrência denunciando violência contra mulheres em relação ao ano de 2019 (OMS, 2020). No mês de março de 2020 houve um aumento de 44,9% de assassinatos de mulheres em São Paulo em relação ao mesmo mês do ano anterior (OMS, 2020). O problema de pesquisa foi: quais programas de governo foram desenvolvidos para mulheres em meio ao agravamento da violência na pandemia? O objetivo da pesquisa é identificar as características institucionais e os programas de governo no período de pandemia por Covid-19. O objeto de estudo é a Prefeitura Municipal de São Paulo entre os anos de 2020 e 2022. O tipo de pesquisa é exploratório-descritiva com a análise documental de leis, decretos, relatórios financeiros, plano de cargos e programas de governo. Os resultados da pesquisa apontam para um déficit nos programas de governo para mulheres na cidade de São Paulo no período de pandemia quando comparado a período anteriores. Com isso, a conclusão foi de que não houve uma melhora de políticas públicas para mulheres no período de agravamento da violência contra mulheres em meio a crise de COVID-19.
Introducción:
Ao longo de três décadas, o município de São Paulo registrou experiências de políticas públicas para as mulheres (1989-2022). Essas políticas não ocorreram de maneira contínua, através de diversos arranjos institucionais, inclusive experimentando um modelo com autonomia administrativa e orçamentária, denotando um aprimoramento do mecanismo institucional responsável pela implementação das políticas para as mulheres. Cabe ressaltar que nesse período, São Paulo tornou-se um importante centro de debate e formulação de ação institucional sobre essa temática nas áreas dos direitos sexuais e reprodutivos, educação, combate à violência sexista, emprego e geração e renda e planejamento urbano.
A institucionalização das políticas para as mulheres está relacionada a duas iniciativas distintas. A primeira está pautada pela crítica elaborada pela teoria feminista sobre os limites dos princípios da democracia liberal ao propor a igualdade formal entre os indivíduos, a universalização dos direitos e a neutralidade das instituições, cujos pressupostos não consideram a condição de subordinação das mulheres. A outra, igualmente importante, pertinente à repercussão dos diferentes documentos propostos pelos organismos multilaterais com o objetivo de promover esforços em defesa dos direitos das mulheres.
Dessa forma, essa nova institucionalidade proposta está relacionada aos fundamentos de democracia e ao exercício da cidadania, e para sua implementação faz-se necessário um novo projeto cujo desafio é garantir a instituição de mecanismos democráticos e com transparência que assegurem estabilidade na articulação e implementação de políticas públicas voltadas para que endossar o exercício dos direitos políticos, civis, sociais e econômicos das mulheres.
O município de São Paulo é uma metrópole com mais de 12 milhões de habitantes, configurando-se como a mais populosa do país e a oitava do mundo, sendo responsável por 10,3% do Produto Interno Bruto (PIB), com o orçamento anual previsto para 2022 em R$ 82,7 bilhões, o quinto do país. Nesses dados superlativos, se destaca o percentual de mulheres entre os habitantes (52,6%), superando os índices percentuais do estado (51%) e do país (51,8%).
Em 2020, em razão da pandemia do novo coronavírus, o governo do estado de São Paulo adotou medidas de restrição de circulação, adoção de uma série de cuidados sanitários que implicaram no isolamento social de uma parcela expressiva da população. Esse cenário trouxe um grave impacto econômico para os diferentes setores, público e privado, e evidenciou a necessidade de políticas públicas para combater e enfrentar as desigualdades de gênero, a violência contra a mulher e a crise econômica. Esses fatores ameaçam a autonomia das mulheres, em especial as mulheres pobres que compõem as camadas mais vulneráveis da população.
Nesse trabalho exploratório, apresentamos os arranjos institucionais de implementação das políticas públicas de 1989 a 2022, como também os elementos orçamentários e financeiros da prefeitura de São Paulo relacionados à implementação de políticas para as mulheres. A análise tem como marco inaugural o governo de Luiza Erundina, do PT, primeira prefeita eleita. Em seu governo ocorre a primeira experiência institucional de políticas para as mulheres, uma estrutura criada para assegurar ações que promoveram a inclusão das mulheres através de políticas de combate da desigualdade e discriminação, com o propósito de inserir na agenda governamental a transversalidade de gênero nas diferentes áreas da administração pública. Nos anos subsequentes as atividades que compunham essa política foram suspensas (1993-2000), e retomadas e ampliadas em 2001, com a eleição da segunda prefeita da história de São Paulo Marta Suplicy, do PT. Após quatro anos, novamente o serviço foi secundarizado e somente retomado em 2007, através de parceria firmada com o governo federal.
O estudo apresenta ainda uma análise de elementos importantes da gestão do prefeito Fernando Haddad, PT (2013-2016), no que diz respeito às políticas para mulheres. Para tanto, foi realizado um estudo mais detalhado dessa gestão com foco nos seguintes aspectos: 1) instituição da Secretaria de Políticas para Mulheres, 2) Metas do Programa de Metas 2013 – 2016, 3) Ações na área de políticas para mulheres, 4) Arranjos participativos relacionados à Políticas para Mulheres, 5) Análise do orçamento da Secretaria entre 2014 e 2016. Segundo Bugni (2016: 168) a gestão da Prefeitura de São Paulo que governou a cidade entre 2013 e 2016 merece uma atenção especial, na medida em que:
“O primeiro ponto que destacamos desta última gestão, refere-se à preocupação com a promoção dos direitos da mulher, enquanto uma deliberação de governo que contou com o apoio desde o Prefeito. Da mesma forma que ocorreu no Governo da Marta Suplicy, essa postura contribuía para a receptividade da temática nos demais setores, fortalecendo a legitimidade da política em todo o governo municipal. Vale notar também que, neste momento, a política de gênero foi apresentada a partir de uma concepção mais ampla, ressaltando preocupações não apenas com questões de ordem social, mas também econômica, política e cultural.”
A pesquisa busca descrever o alinhamento de fatores que contribuíram para o desenvolvimento de políticas públicas para mulheres. O estudo precede de uma revisão bibliográfica sobre o desenvolvimento dos diferentes governos da cidade de São Paulo desde 1989 que estimularam reformas políticas institucionais no tocante às políticas para mulheres. A conquista de direitos, avanços socioeconômicos e à modernização dos costumes implicaram em transformações institucionais no município de São Paulo.
Sob uma abordagem qualitativa que se utilizou de pesquisa bibliográfica e documental, foi realizado um constructo histórico que apresenta a evolução do arranjo institucional das políticas para mulheres na cidade de São Paulo. Para tanto será realizada a analise descritiva de documentos como decretos, portarias e leis da Prefeitura de São Paulo no período entre 1989 e 2022. O marco de início da análise, em 1989 justifica-se pelo fato desse ano representar o início de um conjunto de debates e iniciativas em torno da temática de políticas para mulheres.
Perante uma abordagem quantitativa foi realizada a análise orçamentária entre os anos de 2020 e 2022 com o propósito de identificar as despesas destinadas a políticas para mulheres. O período da análise orçamentária fundamenta-se pelo fato de ter sido a etapa posterior ao período no qual existiu uma Secretaria Municipal de Políticas para as Mulheres na São Paulo, marco institucional que permitiu o estabelecimento de dotação orçamentária destinada exclusivamente às políticas para mulheres. A estratégia utilizada tem o propósito de gerar evidências que permitam caracterizar marcos das políticas para mulheres em diferentes governos municipais.
Desarrollo:
A institucionalização da política para mulher na cidade de São Paulo: governo Fernando Haddad (2013 – 2016)
Entre os anos de 2013 e 2016 o prefeito de São Paulo foi Fernando Haddad do PT. Com a Lei 15.764/13 foi criada a Secretaria de Políticas para as Mulheres, a qual ficou responsável por:
“[...] assessorar, coordenar e articular junto à Administração, na definição e implantação de políticas públicas voltadas para a promoção dos direitos das mulheres, visando à sua plena integração social, política, econômica e cultural.” (São Paulo, 2013c)
A Secretaria para as Mulheres tinha como atribuição: assessorar as políticas para mulheres, elaborar um plano de igualdade de gênero, cooperar com organismos nacionais e internacionais, articular políticas transversais, realizar ações para a participação das mulheres e implementar planos, programas e políticas para mulheres. A Secretaria possuía duas coordenadoria: a de enfrentamento à violência e a de autonomia econômica das mulheres. A supervisão de equipamentos da secretaria ficou responsável pelas casas Elaine de Grammont, Helenira Rezende de Souza Nazareth e pelos centros de atendimentos à mulher, de referência a mulher e de cidadania da mulher. Ainda foi criada duas assessorias: de participação e controle social e de ações temática. A institucionalização das políticas para mulheres na forma de secretaria fez com que essa frente passasse a ter dotação orçamentária própria.
O Decreto Nº 54.660/13 instituiu o Comitê Intersecretarial de Políticas para Mulheres composto por representantes de vinte secretarias e com o objetivo de elaborar o plano municipal de políticas para as mulheres, garantir que as políticas de gêneros fossem incorporadas às diversas secretarias, construir indicadores de políticas para mulheres. O comitê, que também ficou conhecido como Conexão Mulher, também tinha a atribuição de formular, implantar, implementar, monitorar e avaliar políticas para o público feminino em perspectivas transversais e matriciais.
O Programa de Metas 2013-2016 foram estabeleceu metas que faziam referência a questões das mulheres, sobretudo às do “Eixo 1: Compromisso com os direitos sociais e civis”. Como pode ser observado no Quadro 1, as metas 40, 41, 59 e 60 propunham um enfrentamento direto de problemas relacionados às mulheres. Ao final do governo, as metas relacionadas a mulheres tinham sido cumpridas parcialmente ou integralmente. Ao aderir ao Pacto Nacional de Enfrentamento à Violência contra as mulheres e ao Programa Mulher, Viver sem Violência, o governo federal conseguiu repasses de recursos federais necessário para a implantação da Casa da Mulher Brasileira, centro de referência que reúne serviços de assistência à mulher (Fernandes et al. 2021).
O Projeto de Formação de Grupos Produtivos e de Economia Solidária permitiu a formação de grupos produtivos de economia solidária compostos por 175 mulheres. Também foram realizadas oficinas de formação cultural para as mulheres no ano de 2015. O Decreto 56.702/2015 garantiu que 30% dos profissionais de transporte tinham que ser mulheres. O Decreto 56.021/2015 determinou que os conselhos municipais de participação social deveriam ter um mínimo de 50% de mulheres. Em 2014 foi criada a unidade móvel de atendimento à mulher vítima de violência, que visitou 280 bairros e realizou 450 atendimentos individuais e 23 mil orientações gerais. Em 2016 foram criados mais dois centros de referência das mulheres e foi instituído o Programa Guardiã Maria da Penha que permitiu com que a Guarda Civil Metropolitana atendesse 340 mulheres vítimas de violência (Fernandes et al. 2021).
O Decreto 56.021/15 estabeleceu uma participação mínima de mulheres em conselhos e o Decreto 56.702/15 criou o Conselho Municipal de Políticas para Mulheres. Em 2015 foram realizadas oito conferências municipais para mulheres. EM 2016 foiram instituídos cinco fóruns regionais de políticas para mulheres para a proposição, acompanhamento, discussão e fiscalização de políticas para mulheres (Fernandes et al. 2021).
Ao criar a Secretaria de Políticas para Mulheres em 2013, o governo permitiu que se tivesse dotação orçamentária destinada exclusivamente às políticas para mulheres a partir de 2014. No entanto, chama a atenção que o maior percentual do orçamento da secretaria em relação ao da Prefeitura foi em 2016, sendo de: 0,04%. Entre 2014 e 2016 os valores reais de dotação orçamentária da secretaria aumentaram ano a ano, no entanto o valor do orçamento executado sempre foi inferior ao orçado no período. Nos anos de 2014 e 2016 o total do orçamento executado em relação ao orçado foi de 61,9% e em 2015 foi de 82,2%. Entre os anos de 2014 e 2016 72% das dotações correspondiam a despesas correntes e 28% correspondiam a despesas de capital (Fernandes et al. 2021).
Fim da institucionalização e enfrentamento da violência contra as mulheres em tempos de pandemia
Em 1 de janeiro de 2017, o decreto municipal 57.576 editado pelo prefeito João Dória promoveu uma reforma administrativa que extinguiu a Secretaria Municipal de Políticas para as Mulheres e resultou no fim da autonomia e classificação orçamentária, como também no fim da coordenação centralizada dos serviços. Esta situação acometeu o processo de acompanhamento, controle e fiscalização das políticas públicas. Em vista desse fato e do aumento dos índices de violência contra as mulheres, incluindo dos casos de feminicídio, foram 101 crimes registrados no período janeiro a julho de 2020, serão apresentados e analisados os dados relativos aos projetos e programas destinados ao enfrentamento à violência contra a mulher e de gênero (São Paulo, 2017a).
Nesse sentido, nessa etapa apresentaremos informações sobre o funcionamento dos equipamentos públicos de 2017-2022. Houve o fechamento do Centro de Referência da Mulher de São Miguel Paulista, localizado no extremo leste da periferia da cidade. As obras da Casa da Mulher Brasileira foram concluídas em novembro de 2019, com um atraso de três anos (São Paulo, 2017a).
A implementação de políticas para as mulheres foi transferida para a Coordenação de Políticas para as Mulheres que compõe a estrutura da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC), com objetivo de elaborar, propor, articular, planejar e fomentar a implantação de políticas públicas para a defesa dos direitos das mulheres e equidade de gênero (Gonçalves, 2018).
A rede de atendimento para as mulheres sofreu pouca variação se considerados os dados de 2016, composta por quatro centros de Referências da Mulher, cinco Centros de Cidadania da Mulher, uma Casa Abrigo e uma Casa de Passagem, e a Casa da Mulher Brasileira. Foram criados três postos avançados de atendimento às mulheres vítimas de violência em estações de Metrô – nas estações Santa Cecília e da Luz e no terminal de ônibus Sacomã (São Paulo, 2018).
Também compõem a rede de atendimento à mulher vítima de violência os Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS), que oferecem acompanhamento técnico especializado desenvolvido por equipe multiprofissional para atendimentos a pessoas em situação de violência, sendo: 1 no Centro, 7 na região norte, 8 na região sul, 12 região leste e 2 na região oeste (São Paulo, 2018).
As políticas para as mulheres nos instrumentos de planejamento público – Programa de Metas e PPA
Nesse tópico serão apresentadas as propostas contidas nos Programas de Metas no qual estão contidas as prioridades da gestão para os quatro anos de mandato, traduzidas em metas, projetos, ações estratégicas e indicadores para cada setor da Administração Pública.
No Programa de Metas de 2017-2020 publicado pela prefeitura e entregue à Câmara Municipal não consta nenhum programa ou ação destinado a promover a manutenção, fortalecimento das políticas para as mulheres. Existem no documento três menções às mulheres na ficha técnica do eixo de Desenvolvimento Humano: Garantir 100% de encaminhamentos das denúncias recebidas referentes a populações vulneráveis. A outra menção, também no mesmo eixo, faz parte do projeto Centros de Cidadania com o propósito de integrar os diferentes equipamentos de atendimento e orientação a populações específicas (negros, mulheres, população LGBT e imigrantes), Segundo o documento:
“Garantir que populações com vulnerabilidades específicas sintam-se apoiadas pela rede de acesso a direitos humanos, gerando ampliação do número de pessoas mais informadas e confiantes de seus direitos e no poder público municipal (...)Garantir 100% de encaminhamentos das denúncias recebidas contra populações vulneráveis.” (São Paulo, 2017b).
Acrescente-se ainda, nas linhas de ação, a proposta de finalizar a Casa da Mulher Brasileira, focada em integrar os diversos serviços de direitos humanos oferecidos à mulher no mesmo espaço, como: serviços judiciários, psicológicos, entre outros (São Paulo, 2017b).
No eixo Desenvolvimento Urbano, o projeto “Construção ou reforma de unidades habitacionais para locação social”, consta da linha de ação a iniciativa de “Construir ou reformar 1000 unidades habitacionais de locação social para atendimento de famílias com renda até três salários mínimos”. Segundo a ficha técnica: “A demanda desse programa são as famílias que hoje recebem o auxílio moradia entre elas idosos de baixa renda, mulheres vítimas de violência doméstica, imigrantes e população em situação de rua” (São Paulo, 2017b).
No que se refere ao Programa de Metas 2021-2024 foram encontradas duas ações relacionadas às políticas para as mulheres na área de enfrentamento à violência. A meta 18 estabelece a ampliação em 50% o número de atendimentos realizados nos equipamentos exclusivos para mulheres, cujo relatório de acompanhamento apontou o cumprimento de 57,15%, em 2022. A outra ação está prevista na meta 31 que se destina a ampliação da capacidade da guarda civil metropolitana (GCM) para a realização de ações protetivas para 2.500 mulheres vítimas de violência /ano, o índice de cumprimento em 2022 alcançou 76,72% (São Paulo, 2017b).
Na análise do PPA 2018-2021, outro importante instrumento de planejamento público, o achado da pesquisa foi no Programa 3013 “Prevenção e Proteção às Vítimas de Violência da Coordenação de Políticas para as Mulheres da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC)”, que prevê a ampliação no atendimento de mulheres (em números absolutos por ano) em situação de violência atendidas pela rede especializada de enfrentamento à violência, conforme aponta o quadro abaixo:
Segundo o PPA, para a ação foi considerado o número de registros de entrada realizados (preenchimento da ficha de cadastro) nos Centros de Referência da Mulher em situação de Violência, Casa Abrigo, Casa de Acolhimento Provisório e Unidade Móvel. Numa análise detida desse ponto é possível encontrar uma incongruência entre os números adotados para elaborar essa ação, e os números apresentados no site da SMDHC. Segundo dados da secretaria, em 2020 foram realizados 24.113 atendimentos (Passafaro e Peres, 2022).
No período da pandemia houve uma redução nos atendimentos se considerado o ano de 2019: em março foram atendidas 2886 mulheres, nos meses subsequentes os atendimentos sofreram uma redução de 65% no período mais rígido da quarentena, em razão das restrições de circulação das pessoas, conforme o quadro abaixo:
No período entre janeiro e julho de 2020, o relatório da SMDHC apontou 101 crimes de feminicídios, um recorde da série histórica iniciada em 2016. Segundo Samira Bueno, a pandemia acentuou a quadro de vulnerabilidade das vítimas de violência de gênero considerando que muitas estavam confinadas com seus agressores, e afirma:
“É difícil cravar no caso de São Paulo que foi a epidemia que determinou o aumento dos feminicídios porque eles já vinham crescendo, mas o que podemos dizer é que a pandemia colocou essas mulheres que já viviam em situação de violência doméstica em uma situação ainda maior de vulnerabilidade” (Bueno, 2021: n.p)
Os números de registros de violência contra à mulher na capital paulista, segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP/SP) foram 23.920 casos, sendo que os casos de lesão corporal dolosa e violência sexual segundo o registro estatístico vinham crescendo apresentaram uma queda. Segundo Bueno (2021), tal situação reflete os problemas no acesso ao registro e não na redução dos casos. Na verdade, a mulher vítima de violência passou a ter dificuldade de sair de casa para se deslocar até uma delegacia, em razão das restrições de mobilidade urbana, ou ainda por conta das mudanças de regime de funcionamento das delegacias de polícia, ou pelo fato de estar confinada com o agressor.
Nesse quadro é possível afirmar que as ações propostas nos Programas de Metas e do PPA são insuficientes, tendo em vista os dados considerados para elaboração dos programas e os números de crimes registrados cometidos contra as mulheres (Passafaro e Peres, 2022).
– O desempenho dos programas e atividades no orçamento público
O orçamento é o principal instrumento de realização de políticas públicas. Assim, a finalidade do Estado, ao obter recursos, para gastá-los sob a perspectiva de política pública tem por objetivo realizar os objetivos fundamentais da Constituição Federal. No caso das políticas para as mulheres no município de São Paulo, apesar de constarem em programas e ações no orçamento, nem sempre são destinados recursos para sua implementação, conforme demonstrado no quadro abaixo:
Ao analisar os dados inseridos na tabela acima, é possível verificar que programas e ações foram incluídos na LOA, no entanto a melhor performance no que se refere à destinação de recursos e de 2021: dos seis programas apenas três receberam recursos. Em 2017 e 2019 dos programas propostos, nove receberam recursos orçamentários.
Em referência aos recursos executados pelos programas e ações os valores do quadro 6 apontam que nos anos de 2020 e 2021 retomaram o patamar de 2018, considerando em 2019 depreende-se uma queda de aproximadamente 15% dos recursos orçamentários.
Outro dado a ser ressaltado é o quanto os valores destinados às políticas para as mulheres impactam no orçamento municipal: nos anos de 2020 e 2021 os índices são inferiores a 0,04%, conforme apresentado no quadro 6..
Conclusiones:
A perspectiva feminista aponta para a importância do papel das políticas públicas na alteração das relações sociais de dominação, pois essas podem incidir sobre as relações de poder na sociedade de um ponto de vista de gênero, e garantir às mulheres o acesso a direitos em sua dimensão social, política e econômica. Nesse sentido, é central insistir na ampliação do papel do Estado no provimento de políticas que interfiram na divisão sexual do trabalho e nas possibilidades da participação das mulheres no mundo público.
Por conseguinte, a ausência de políticas públicas e a sua descontinuidade são interpretadas como um sinal de baixa prioridade, ou até mesmo, uma “não questão” para alguns governos. No caso em estudo, da prefeitura de São Paulo, o número reduzido de programas e ações destinadas a políticas para as mulheres nos instrumentos de planejamento, e a quantidade de recursos orçamentários destinados para essa área, reforçam a necessidade ampliação dos equipamentos e serviços públicos. No ciclo analisado, de 33 anos, somente em um mandato, quatro anos (2013-2016), encontramos um arranjo institucional com maior capacidade de articulação de políticas e melhores condições de intervenção, em razão do organismo de governo contar para seu funcionamento tanto com estrutura e orçamentos próprios e basear-se nas deliberações provenientes dos conselhos e conferência municipal.
Outro aspecto diz respeito ao impacto do fim da autonomia institucional e orçamentária, como também da coordenação das ações das políticas para as mulheres, que resultou na ausência de dados que apontem a transervalidade da política nas áreas da saúde, educação, habitação, transporte, trabalho, segurança urbana, urbanismo, em razão da não observância do Plano Municipal de Políticas para as Mulheres.
Cabe ressaltar, ainda, que esse novo modelo institucional dificulta o controle social, e soma-se a isso ausência de dados que apontem a eficácia, eficiência e efetividade da política pública do município de São Paulo.
Dessa forma, as medidas adotadas inicialmente em 1989 continuam necessárias e atuais, tendo em vista os dados que demonstram a vulnerabilidade da vida das mulheres paulistanas.
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Palabras clave:
Análise orçamentária. Cidade de São Paulo. Desenvolvimento institucional. Políticas para mulheres.