Resumen de la Ponencia:
O capitalismo, na sua etapa de dominância do capital fictício, acentuado pelas dimensões de sua crise pandêmica, econômica e ecológica tem intensificado a superexploração da força de trabalho no mundo e, particularmente, no Brasil. Nessa perspectiva, o presente artigo tem como objetivo analisar as manifestações da superexploração da força de trabalho entre trabalhadores(as) da saúde num contexto de pandemia de Covid-19 no Brasil. O artigo está estruturado em três partes. A primeira discute os mecanismos de superexploração da força de trabalho. A segunda discorre acerca das manifestações da superexploração entre os/as trabalhadores(as) da saúde, nos últimos anos. A terceira parte apresenta dados de como tem se dado a superexploração no cenário atual da pandemia de Covid-19 no Brasil. Atualmente, num cenário de pandemia de Covid-19 observa-se um percentual significativo de profissionais da saúde com sobrecarga de trabalho, com jornadas para além das 40 horas semanais, alguns tendo que recorrer a mais de um vínculo de trabalho para poder sobreviver. Tais manifestações representam as péssimas condições de trabalho dessa categoria de trabalhadores, além de contribuir para o adoecimento e o elevado número de acidentes de trabalho.
Introducción:
Ao analisar concretamente a história do capitalismo do ponto de vista da sua totalidade é possível identificar a existência de elementos constitutivos desse sistema. Entre tais elementos estão as formas de exploração da força de trabalho, que determinam as relações de produção na sociedade moderna. Para que se mantenham os padrões globais de acumulação, no modo de produção capitalista, a produção da riqueza social implica, necessariamente, a ampliação do grau de superexploração da força de trabalho.
A classe trabalhadora vivencia desde sempre formas intensas de exploração da força de trabalho e de precarização ilimitada, no Brasil não é diferente. O capitalismo na sua atual fase (com a predominância do capital fictício) e sua crise na inter-relação com as crises pandêmica, econômica de “longa depressão” e a ecológica (Mendes, 2022) tem intensificado uma massiva desigualdade de classe, raça, etnia e gênero na sociedade como um todo e demonstrado a incapacidade do sistema de metabolismo antissocial do capital de suprir as necessidades básicas da humanidade.
Para almejarmos compreender como tem se dado a superexploração da força de trabalho entre trabalhadores(as) da saúde, no atual cenário de crise do capitalismo e de pandemia de Covid-19, se faz necessário empreender uma análise da estrutura e dinâmica do capitalismo dependente brasileiro, que permeie a sua consolidação, o seu desenvolvimento e as condições que determinam suas crises. Nesta perspectiva, o objetivo deste artigo é analisar as manifestações da superexploração da força de trabalho entre trabalhadores(as) da saúde num contexto de pandemia de Covid-19 no Brasil.
Deste modo, o artigo se ampara em pesquisa bibliográfica tendo como unidade de análise os trabalhadores da saúde. Para tanto, o artigo encontra-se dividido em quatro seções. Na primeira, apresentamos uma discussão sobre as dimensões do valor da força de trabalho. Na segunda, discorremos sobre os mecanismos de superexploração da força de trabalho. Na terceira, expomos as manifestações da superexploração entre os/as trabalhadores(as) da saúde, nos últimos anos. Por fim, na quarta seção apresentamos como tem se dado a superexploração no cenário atual da pandemia de Covid-19, que aprofundou a crise contemporânea do capitalismo, intensificando a exploração, a miséria e o sofrimento da classe trabalhadora brasileira, e evidenciamos as repercussões da superexploração nas condições de vida e saúde dos trabalhadores da saúde.
Desarrollo:
1. Os mecanismos de superexploração da força de trabalho
É possível identificar quatro mecanismos principais de superexploração da força de trabalho (que atuam de forma isolada ou combinada) que possibilitam a continuidade do processo de acumulação na periferia, são eles: a) o prolongamento da jornada de trabalho; b) o aumento da intensidade do trabalho; c) a apropriação, por parte do capitalista, de parcela do fundo de consumo dos (as) trabalhadores (as) - então convertido em fundo de acumulação capitalista -, sendo que esse mecanismo atua no sentido de criar as condições pelas quais o capital viola o valor da força de trabalho; e d) a ampliação do valor da força de trabalho sem que seja pago o montante necessário para tal (Amaral; Carcanholo, 2012).
Para que possamos entender o mecanismo de prolongamento da jornada de trabalho, analisaremos, inicialmente, as formas de existência de mais-valia do ponto de vista da totalidade e da reprodução. Afinal, é “a partir do conceito de mais-valia que se chega ao conceito de exploração, de exploração do trabalho pelo capital”, afirma Carcanholo e Sabadini (2011, p. 131).
O primeiro passo significa entender que o dinheiro recebido pelo trabalhador na forma de salário, é um título (um papel ou papéis) que lhe dá direito para comprar, para se apropriar de um conjunto limitado de bens. Tais bens foram produzidos anteriormente por outros (as) trabalhadores (as), ou seja, os próprios trabalhadores (as) produziram antes o que vão se apropriar agora. Importante ter em mente que os trabalhadores só se apropriam de uma parte do produto do seu trabalho (Carcanholo; Sabadini, 2011).
Logo, é presumível que o dinheiro que inicialmente saiu do bolso dos capitalistas, no fim das contas volta para eles, uma vez que os/as trabalhadores (as) vão gastar seus salários comprando bens essenciais. Isso significa que os capitalistas se apropriam da mais-valia sem dar nada em troca; só permitem que os trabalhadores se apropriem de parte de algo que já produziram (Carcanholo; Sabadini, 2011).
Assim, para Carcanholo e Sabadini:
a relação salarial (que produz mais-valia) é e não é ao mesmo tempo uma relação de exploração. Do ponto de vista da essência, é exploração; na aparência, pode ou não ser exploração. Com certeza, mesmo na aparência, será exploração quando os salários são baixos e/ou quando as condições de trabalho são insatisfatórias para a reprodução dos trabalhadores (Carcanholo; Sabadini, 2011, p. 136).
Mais-valia é o valor produzido pelo trabalho que supera o valor da força de trabalho, ela é um produto da exploração do trabalho (Marx, 2013). A mais-valia absoluta, por sua vez, é a forma que o capital utiliza para incrementar a massa de mais-valia produzida pelos (as) trabalhadores (as). Por exemplo, no prolongamento da jornada de trabalho, mantém-se constante a parte que é destinada ao pagamento da força de trabalho sob a forma de salário.
Numa jornada de trabalho de 8 horas diárias, por exemplo, suponhamos que 2 horas sejam destinadas à reprodução da força de trabalho, e as demais 6 horas caracterizem a mais-valia que é apropriada pelo capitalista. Se a jornada é ampliada para 10 horas, então está se produzindo um excedente. Tal prolongamento da jornada de trabalho sem alterar o tempo de trabalho necessário (o salário), ou mesmo aumentando-o, exigindo, portanto, maior esforço dos (as) trabalhadores (as). Aqui está uma das formas de se alcançar a mais-valia absoluta.
O segundo mecanismo consiste na intensificação da jornada de trabalho. “Dada uma quantidade determinada de horas de trabalho por dia, a intensificação consiste em elevar o ritmo de trabalho dos trabalhadores, de maneira que se produza um volume maior de valores de uso, no mesmo tempo”, nos lembra Carcanholo e Sabadini (2011, p. 138).
A produção da mais-valia absoluta, por um lado, implica um esforço adicional do trabalhador, por outro, a decisão de ampliar ou intensificar a jornada em certa magnitude tende a ser tomada pelo capitalista. “O fato de que o salário do trabalhador seja elevado em certa medida não impede que a massa de mais-valia produzida cresça com a mais-valia absoluta”, acrescenta Carcanholo e Sabadini (2011, p. 138).
Outra maneira que o capital encontra para aumentar a massa de mais-valia sem que para isso tenha que ampliar a jornada de trabalho para além dos limites estabelecidos e nem intensificá-la, é diminuindo a parte da jornada de trabalho que é paga ao trabalhador sob a forma de salário, aumentando consequentemente a parte do trabalho excedente. A massa de mais-valia produzida através desse mecanismo é denominada mais-valia relativa (Marx, 2013).
Nesse processo o trabalhador não recebe necessariamente um salário real menor, pois continuará a receber uma remuneração que lhe permite adquirir os meios de subsistência básicos para a reprodução. A redução do valor da cesta de consumo dos (as) trabalhadores (as), permitindo que estes a comprem (mesmo tendo seu tempo de trabalho socialmente necessário reduzido) só é possível com o aumento da força produtiva do trabalho (produtividade) nos setores que produzem os bens de consumo dos trabalhadores ou os insumos e os meios de produção necessários.
Existem outros métodos que, aplicados de maneira conjunta com os anteriores, contribuem para que os capitalistas aumentem o volume total de lucro obtido do trabalho: diminuição do salário real e a remuneração abaixo do mínimo necessário à subsistência do trabalhador. Logo, o pagamento de um salário insuficiente para que trabalhadores (as) e suas famílias consigam reproduzir adequadamente a sua força de trabalho, ou seja, uma remuneração abaixo do valor da força de trabalho correspondente a superexploração da força de trabalho.
2. Superexploração e saúde
A “saúde” no modo de produção capitalista é uma mercadoria (meio de subsistência) que contribui para a reprodução da força de trabalho, ou seja, o valor (ou magnitude do valor) da mercadoria saúde se incorpora ao valor da força de trabalho.
Se o trabalhador é privado de “saúde”, ele acaba sendo privado de uma condição fundamental para sua reprodução e isso diminui a sua vida útil, consequentemente diminuindo o valor total da força de trabalho, já que este é mensurado com base no tempo total de vida útil do trabalhador ou no total de dias em que o possuidor da força de trabalho vende sua mercadoria no mercado, em boas condições.
Em nota técnica publicada em setembro de 2019, intitulada “Reforma trabalhista e os trabalhadores da saúde”, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) argumenta que existem algumas especificidades relacionadas ao mundo do trabalho na saúde, que precisam ser consideradas ao analisar o mercado de trabalho neste setor específico. Em primeiro lugar, verifica-se que o capital constante no setor saúde não é necessariamente substitutivo da força de trabalho. A partir desta constatação decorrem duas considerações: (1) sendo o trabalho na saúde uma atividade-fim (diferente de uma atividade desenvolvida no setor industrial, por exemplo, que é uma atividade-meio), os investimentos no setor saúde (ou seja, a destinação de maiores gastos em capital constante, desta forma, elevando a produtividade) são geradores de novos postos de trabalho, ao contrário de outros setores da economia, em que o aumento da massa de capital constante em relação a força de trabalho (capital variável) leva à formação de um exército industrial de reserva (EIR); e (2) o aumento de produtividade no setor saúde é mais limitado (DIEESE, 2019).
A mesma nota técnica defende ainda que as atividades na área da saúde são suscetíveis a ‘falhas de mercado’, dada a elevada incerteza quanto à qualidade do produto ou serviço prestado, já que, ao contrário de outros produtos e setores de atividade, não pode ser testado antes de sua aquisição. Ao se acrescentar mais à frente que “diante disto, a melhor maneira de se garantir a qualidade do serviço prestado não é tão somente o padrão tecnológico, mas, sobretudo, o processo de trabalho que deveria ser a base de orientação para ações de gestão do trabalho em saúde” (DIEESE, 2019, p. 5).
O Anuário dos Trabalhadores da Saúde, publicado pelo DIEESE em 2018, apresenta uma série de indicadores da situação de trabalho dos profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS), no período de 2012 a 2016, que permitem analisar, em alguma medida, dados (por exemplo: vínculos de trabalho; estabilidade no emprego; jornada de trabalho etc.) sobre a força de trabalho na saúde naqueles anos e constatar (ainda que de maneira superficial) o grau de exploração com os quais trabalhadores e trabalhadoras da saúde estão submetidos no Brasil (DIEESE, 2018).
Por exemplo, entre os anos de 2012-2016 observa-se uma variação percentual positiva para os vínculos CLT (16%) e estatutários (5%) e negativa para outros vínculos (-2%). Contudo, ao segregar o período 2012-2016 em dois outros períodos, 2012-2014 e 2014-2016, observa-se para o segundo período uma variação percentual negativa nos vínculos estatutários (-0,7%) e outros (-14,1%). Para o DIESSE esta é uma constatação que revela como tem crescido no SUS as ocupações cuja natureza do vínculo é mais flexível e menos protegida. “Tanto no governo federal como nos estados e municípios, cresceram as contratações por CLT, cooperativas de trabalho, além da terceirização e dos contratos com organizações sociais”, destaca a nota técnica (DIEESE, 2019, p. 9).
Outra característica de grande expressão é a rotatividade do trabalho nos estabelecimentos vinculados ao SUS. O DIEESE estima que em 2016, 20% dos contratos de trabalho ativos foram encerrados no mesmo ano. Ainda neste ano, a taxa de rotatividade global para estatutários foi de 11,1%, para celetistas foi de 29,5% e, para os demais tipos de contrato foi de 83,3%. Técnicos (as) e auxiliares de enfermagem estiveram entre as categorias com o maior número (32,6% do total, ou 872 mil vínculos, sendo que, destes, 65,7% eram celetistas e 32,7% estatutários) de vínculos profissionais no SUS, em 2016. Em segundo, terceiro e quarto lugares estão os trabalhadores (as) nos serviços de promoção e apoio à saúde (12,9% do total, ou 345 mil vínculos, sendo 69,7% estatutários e 26,5% celetistas), as/os enfermeiras(os) (10,4% do total, ou 279 mil vínculos, sendo 60,3% celetistas) e as/os médicas(os) clínicas(os) (8,7% do total, ou 234 mil vínculos), respectivamente (DIEESE, 2019).
Os vínculos adicionais são outra modalidade de prolongamento da jornada de trabalho que se tornou usual no âmbito da saúde, na qual, muitas vezes, a uma jornada diária de 8 horas em algum estabelecimento público ou privado, é agregado horas extras (seja naquele mesmo estabelecimento ou em outro) com o intuito de complementar os rendimentos, uma vez que são baixas as remunerações pagas e limitadas às políticas de valorização da carreira. O DIEESE constatou um aumento, entre 1998-2008, no número de pessoas ocupadas, em algum trabalho principal, mas que mantinham trabalho adicional, em cinco (Belo Horizonte, Distrito Federal, Porto Alegre, Recife e Salvador) das seis regiões analisadas, a exceção foi a região de São Paulo, cuja variação negativa foi de 5,9% (DIEESE, 2009).
Ao se analisar um período mais recente, o mesmo DIEESE encontrou que quase um quarto dos (as) trabalhadores (as) do SUS tem mais de um vínculo de trabalho, ou seja, trabalhavam em mais de um estabelecimento de saúde, no ano de 2016. Entre as categorias com maior número de vínculos adicionais, destacam-se os/as técnicos(as) e auxiliares de enfermagem (218 mil), médicas(os) (121 mil), enfermeiras(os) (75 mil) e farmacêuticas(os) (32 mil), totalizando 596 mil trabalhadores da saúde, de um total de 2,68 milhões de trabalhadores(as) no SUS, ou seja, 22% do total (DIEESE, 2019).
Sobre os limites que assinalam a duração possível de uma jornada de trabalho, Osorio expõe:
[...] o prolongamento da jornada tem como consequência uma elevação do valor da força de trabalho, ao requerer maior quantidade de bens necessários para repor o desgaste das horas extras. Porém quando ultrapassado certo ponto, a partir do qual o desgaste físico e mental não pode ser reposto, o aumento de horas diárias não consegue ser compensado pelo aumento do salário. Nesses casos, o capital está se apropriando hoje de anos futuros de trabalho, o que não só viola o valor da força de trabalho, mas implica a redução da vida útil do trabalhador e de sua expectativa de vida de acordo com as condições normais dominantes (Osorio, 2012, pp. 71-72).
Ainda que se tenha observado um aumento no contingente de trabalhadores (as) da saúde – segundo o DIEESE – entre os anos de 1998-2008, isso não refletiu na valorização destes (as) trabalhadores(as), pelo contrário, constatou-se naquele período uma redução na magnitude das remunerações. Ao se comparar os rendimentos médios reais pagos por hora aos ocupados do setor saúde em 2008, com aqueles auferidos em 1998, evidenciou-se a acentuada redução observada em praticamente todas as regiões analisadas, com destaque para a variações percentuais negativas identificadas na região metropolitana de São Paulo (-32,9%), de Recife (-25,0%) e de Salvador (-21,3%) (DIEESE, 2009).
A diminuição dos rendimentos na saúde, na maioria das regiões, reflete a retração dos salários em estabelecimentos privados que registraram reduções entre 32,0% em São Paulo, e 4,5% em Recife. Na esfera pública da saúde, houve queda do rendimento apenas em duas regiões: Recife (-23,3%) e Belo Horizonte (-3,4%). Nesta última região, identificou-se ainda uma variação percentual positiva (10,2%) no salário-hora de trabalhadores(as) vinculados a estabelecimentos de saúde privada (DIEESE, 2009).
Dando um salto no tempo e alcançando o ano de 2016, observa-se que entre as categorias ocupacionais na saúde, os médicos clínicos recebiam naquele ano a maior remuneração (R$ 9.913,00, com crescimento real, descontada a inflação, de 8,8% em relação a 2012), ao passo que cuidadores (as) recebiam a menor (R$ 1.377,00). Enfermeiras (os) tinham uma remuneração média de R$ 4.713,00 e crescimento de 3,4% em relação a 2012, já os técnicos de enfermagem recebiam uma remuneração média de R$ 2.203,00, com aumento real de 7,1% em relação a 2012. Técnicos (as) de enfermagem ganhavam 46,7% do recebido por Enfermeiros (as), que, por sua vez, auferiam 47,5% da remuneração de médicos(as). A distância entre a maior e a menor remuneração no SUS, em 2016, era de sete vezes (DIEESE, 2019).
Outra característica bastante expressiva quando se analisa o componente da remuneração entre trabalhadores celetistas vinculados a estabelecimentos do SUS é a desigualdade de gênero e raça, por exemplo, as mulheres recebiam, em 2016, 75% da remuneração dos homens (R$ 2.878,00 contra R$ 3.828,00). As mulheres negras (pretas e pardas) recebiam 60% da remuneração dos homens não negros (brancos, amarelos e indígenas): R$ 2.561,00 contra R$ 4.302,00. Os (as) trabalhadores (as) negros (as) têm remuneração equivalente a 80% da remuneração dos (as) não negros(as): R$ 2.711,00 contra R$ 3.396,00 (DIEESE, 2019).
As diferenças de remuneração que, por um lado, podem ser explicadas pela natureza dos postos de trabalho, como por exemplo, a constatação de que existem menos mulheres negras médicas (DIEESE, 2019), por outro lado, tem sua origem atrelada a formação do proletariado brasileiro, que foi profundamente marcada pelos fenômenos históricos, econômicos e sociais no Brasil, a exemplo da sua trajetória enquanto resultado de uma colonização predatória, na qual o país funcionou como espaço de apropriação de recursos naturais e financeiros para a metrópole portuguesa, com o trabalho escravo se estendendo por mais de 300 anos, ou mesmo depois da abolição da escravatura com a transição para o trabalho assalariado, não tendo sido proporcionado aos/às ex-escravizados(as) garantias de assistência social ou qualquer amparo estatal que lhes permitissem melhores condições de vida.
Mesmo numa comparação entre pessoas com escolaridade de ensino superior similares, os dados indicam que trabalhadores (as) negros (as) recebiam 12,5% menos que os/as brancos (as): R$ 3.981,00 ante R$ 4.549,00 (DIEESE, 2019). “Assim, foi em grande parte sobre a escravidão africana e indígena que se constituiu o proletariado brasileiro, e as contradições que residem na atualidade em relação a empregabilidade, taxas de mortalidade e natalidade, escolaridade dessa população resultam, essencialmente, desta origem” (PCB, 2021, p. 5).
Para o DIEESE, “faltam perspectivas de carreiras mais atrativas no SUS, inclusive para o reconhecimento da experiência tácita no trabalho, pois os dados indicam que a remuneração aumenta, na medida em que aumenta o grau de instrução” (DIEESE, 2019, p. 15). Contudo, de acordo com Martins (2011), a elevação da qualificação do trabalhador sem a remuneração equivalente ao incremento de valor da formação de trabalho é um dos mecanismos pelos quais se desenvolve a superexploração da força de trabalho, que se caracteriza pela queda dos preços da força de trabalho por baixo do seu valor.
3. Crise pandêmica, superexploração e os rebatimentos na saúde dos trabalhadores
No cenário atual de crise pandêmica temos visto um contingente considerável de trabalhadores(as) da saúde adoecidos física e psiquicamente. Ou seja, são trabalhadores(as) que apresentam alguma dificuldade na reposição de sua energia e saúde para voltar a trabalhar na jornada seguinte. Estes trabalhadores não têm os meios de subsistência suficientes para reproduzir a sua força de trabalho. Essa situação se configura enquanto sendo uma superexploração da força de trabalho.
Se somarmos a esse cenário a precarização histórica dos trabalhadores(as) do Sistema Único de Saúde (SUS), que através da sua assistência à saúde e serviços (mas não somente isso) confere o aporte de saúde necessário para que a classe trabalhadora reproduza a sua força de trabalho e continue trabalhando com melhores condições de vida, é possível conceber o quanto essa precariedade da saúde pública brasileira contribui para o rebaixamento do valor da força de trabalho, logo para superexploração da força de trabalho, para extração de excedente do trabalho, a mais-valia.
É o sistema capitalista se beneficiando de diversas formas e maneiras do campo da saúde. Seja através da privatização, desfinanciamento e desmonte do SUS (Mendes, 2022), seja por meio da superexploração da sua principal engrenagem (quem movimenta e constrói o SUS) que é a força de trabalho na saúde.
A pandemia de Covid-19 aprofundou as mazelas sociais manifestadas pelo capitalismo, impactando diretamente nas condições de vida e trabalho da população, ampliando os índices globais de mortalidade, de desemprego, de pobreza, de fome etc., além de aumentar o grau de exploração de trabalhadores(as) e intensificar as desigualdades de classe, raça e gênero na sociedade como um todo.
Nesse cenário de crise pandêmica, as pessoas que trabalham direta ou indiretamente na área da saúde foram especialmente afetadas. Projetos como o Observa Covid e Rede CoVida mostram em algumas de suas publicações e estudos, a situação particularmente preocupante daqueles que atuam nos estabelecimentos do SUS ou cuidam de pessoas com Covid-19, principalmente os que se encontram na linha de frente do combate à pandemia, garantindo o funcionamento dos leitos, além dos atendimentos ambulatoriais na rede de atenção básica e especializada (OBSERVA COVID, 2021; REDE COVIDA, 2020).
Silva et al. (2021) ao analisarem registros de inspeções sanitárias realizadas no estado da Bahia, no período de abril a novembro de 2020, verificaram, por exemplo, um maior número de casos no setor de serviços (n = 39), com destaque para os serviços de saúde com metade das inspeções (n = 20).
Já Mendes et al. (2021) ao analisarem casos de trabalhadores(as) da saúde contaminados com a Covid-19, na cidade de Salvador-Bahia, no período de abril a agosto de 2020, verificaram uma predominância feminina (75,9%), sendo maior na faixa etária de 20 a 39 anos (54,5%), além de uma predominância de casos entre pessoas autodeclaradas pretas/pardas (76,8%), bem como entre trabalhadores(as) que apresentam jornada de trabalho entre 40 e 60 horas semanais (88,4%). As autoras argumentam que a “multiplicidade de vínculos, encontrada em cerca de um terço dos trabalhadores investigados, e a extensão da jornada de trabalho são primordiais nesta análise, pois são fatores que aumentam a exposição do trabalhador” à Covid-19 (Mendes et al., 2021). No entanto, vale acrescentar que são estes procedimentos (prolongamento da jornada de trabalho e multiplicidade de vínculos) que caracterizam o modo de produção fundado na superexploração da força de trabalho e se apresentam enquanto elementos constitutivos do capitalismo dependente (Marini, 2011), como mencionado nas seções anteriores deste artigo
De acordo com “Carta aberta dos trabalhadores da saúde atuantes nas UBS do município de São Paulo”, publicada em janeiro de 2022, são muitos os problemas vivenciados por trabalhadores(as) no curso da emergência sanitária de Covid-19, entre os quais pode-se citar: a sobrecarga de trabalho; o número reduzido de profissionais; o aumento exponencial do número de atendimentos; a ampliação da jornada de trabalho (sem a devida remuneração das horas extras); o acúmulo de funções; a adição de atividades extras nas rotinas de alguns profissionais, com manutenção da cobrança de metas (de maneira truculenta) de atividades habituais; a realocação de profissionais, deixando setores específicos com sobrecarga e a população sem atendimento adequado (SIMESP, 2022).
Além disso, questiona-se também a falta de insumos mínimos para o atendimento da população (por exemplo: medicamentos essenciais para o tratamento das infecções; lençol para maca hospitalar; oxigênio; luvas; testes de gravidez e espéculos vaginais etc.).
De acordo com o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho (SmartLab), ao tratar e analisar os dados do INSS/CATWEB e INSS/BENEFÍCIOS, o setor econômico com mais acidentes de trabalho (2012 a 2021) é o de atividades de atendimento hospitalar, sendo que a ocupação de técnico de enfermagem foi a que apresentou o maior número de acidentes de trabalho para o mesmo período, no Brasil (Smartlab, 2022).
Estes e outros aspectos acabam por comprometer a segurança e a saúde nos ambientes de trabalho, gerando adoecimento e mortes, bem como problemas de saúde mental associados às condições de trabalho, ao medo de contaminar-se e contaminar familiares e amigos, ansiedade, distúrbios de sono e/ou alimentares e depressão vinculada ao estresse decorrente do trabalho cotidiano, especialmente da atenção e do cuidado dispensado a pessoas com Covid-19.
Os fatores que contribuem para o desenvolvimento e piora do sofrimento mental (mas também das condições de vida e saúde de trabalhadores/as como um todo) perpassam as dimensões econômicas, sociais, ambientais, culturais, fisiológicas etc. Afinal, são fatores historicamente determinados pelo modo de produção capitalista.
Conclusiones:
O Brasil tem vivenciado uma ampliação de ocupações cuja natureza é mais flexível e menos protegida, situação que se reflete também no mercado de trabalho da saúde. Tem-se identificado ao longo dos anos uma diminuição dos vínculos estatutários, além de uma expressiva rotatividade no trabalho em estabelecimentos vinculados ao SUS. Outra grande expressão da superexploração da força de trabalho da saúde é o aumento dos múltiplos vínculos, por meio dos quais trabalhadores e trabalhadoras da saúde se submetem afim de alcançar uma remuneração que lhes permita a reprodução e manutenção da sua força de trabalho, e o mínimo para sua sobrevivência.
O cenário de exploração se completa com a constatação da redução na magnitude das remunerações dos trabalhadores da saúde ao longo dos anos, além da discrepância salarial entre as categorias profissionais na saúde, sobretudo na comparação salarial sob a dimensão do gênero e da raça. Para a apropriação do excedente-valor pelo capital, a força de trabalho da saúde é submetida jornadas extensas e intensas de trabalho, que em última análise só amplia o adoecimento da classe que vive do trabalho, além de o aumento de acidentes de trabalho.
Uma das consequências decorrentes da superexploração da força de trabalho é o aumento de acidentes, do adoecimento (físico e psíquico) e dos óbitos relacionados ao trabalho. É o sistema do capital mostrando suas garras e utilizando-se de todos os mecanismos possíveis e os aparentemente impossíveis, na extração e apropriação dos valores produzidos por trabalhadores e trabalhadoras da saúde.
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Palabras clave:
Superexploração da força de trabalho; trabalhadores da saúde; teoria marxista da dependência (TMD); crise do capitalismo; Covid-19.
Resumen de la Ponencia:
O atual cenário global de crise, chama a atenção para as dinâmicas anticíclicas que caracterizam o sistema capitalista, bem como seu sociometabolismo. O trabalho de consumo de novas formas de valor, reforça o caráter flexível do trabalho, tornando a classe trabalhadora mais complexa e fragmentada. O início do processo de precarização estrutural do trabalho acentuou-se ao longo do século XX com o advento do Taylorismo/Fordismo e logo em seguida a partir dos anos 1970 com o desenvolvimento do Toyotismo e das formas de empresa flexível. Em um contexto no qual a economia é comandada hegemônicamente pelo capital financeiro, as empresas buscam garantir seus altos rendimentos a todo custo, o que acaba por sua vez, exigindo e transferindo para os trabalhadores a pressão pela otimização de tempo, máxima performance, redução de custos com mão de obra e a hiper flexibilização dos contratos de trabalho. É nesse contexto que a terceirização vem ganhando espaço e centralidade na chamada gestão e estratégia empresarial, uma vez que as relações sociais estabelecidas baseiam-se na simbiose entre capital e trabalho que incorrem nos contratos de trabalho por tempo indeterminado e flexíveis, que acabam em consequências profundas que desestruturam a classe trabalhadora. A pandemia que vem assolando o Brasil e o mundo é mais uma expressão do capitalismo, que esbarra em uma crise exacerbada do próprio capital. A pandemia do COVID-19, não diz respeito a uma situação de crise claramente contraposta a uma situação de normalidade, ao contrário, desde a década de 1980, à medida que o neoliberalismo se impunha como a versão dominante do capitalismo, e este sujeitava-se mais e mais à sua lógica, o mundo passara a viver em permanente estado de crise Esta pesquisa se fundamenta na perspectiva do materialismo histórico dialético, pois o mesmo nos permite uma análise sobre a precarização do trabalho a partir da dinâmica do modo de produção capitalista, incorporando elementos da reestruturação produtiva, bem como do ideário neoliberal e das tendências atuais no mundo do trabalho. Desta forma, foi realizada uma revisão de literatura que busca compreender como a nova precarização do trabalho no Brasil se comporta ante o contexto pandêmico, incorrendo diretamente sobre a classe que vive do trabalho bem como seus reflexos na sua reprodução social. Dessa forma, compreendemos que o trabalho mais flexível, e a nova precariedade salarial, tornam-se elementos cruciais da ofensiva do capital na produção, visando desvalorizar o capital variável como meio de reduzir a composição orgânica do capital para aumentar ainda mais sua lucratividade. Tais elementos juntos contribuem para uma compreensão de que a subsunção e exploração da força de trabalho pelo capital, incorre na fragmentação da classe trabalhadora e suas lutas.Resumen de la Ponencia:
Esta ponencia tiene por objetivo dar a conocer las experiencias de conciliación de la vida laboral y familiar de la población de microemprendedora de Chile, en un contexto de pandemia mundial y de crisis socioeconómica nacional. Esta crisis ha derivado no solo del aumento del desempleo y del cierre coyuntural de empresas por el confinamiento obligatorio de la población, sino también por la revuelta social de octubre de 2019 que se mantiene actualmente en estado de latencia. Recogeré el desarrollo de estrategias y recursos individuales, sociofamiliares e institucionales provistos por el mercado y el mercado, que confluyen en las experiencias de conciliación, las que serán interpretadas desde la presencia (o no) de tensiones y paradojas que emergen de los discursos de estos actores sociales. La evidencia muestra para el caso chileno que el microemprendimiento tiene efectos duales en el empleo y la familia. Por un lado, se asocia a peores condiciones laborales y, por otro lado, a una mayor disponibilidad de horas de trabajo doméstico y de cuidado en el hogar y a una mayor satisfacción con el equilibrio de la vida laboral y familiar en comparación al trabajo dependiente. Además, la conformación del mercado laboral indica un incremento paulatino del microemprendimiento para ambos sexos, que acorta la brecha y plantea, a su vez, interrogantes acerca de la tendencia actual de los patrones culturales de género y las condiciones y oportunidades que provee un mercado laboral flexible. En base a un estudio cualitativo a microemprendedoras/es que tienen responsabilidades familiares (domésticas y de cuidado a dependientes), de distintos tramos etarios (entre 35-65 años y más), pertenecientes a dos categorías ocupacionales (empleadores” y “trabajadores por cuenta propia”) y residentes de la Región Metropolitana del país, muestro que la conciliación trabajo y familia está condicionada por el desarrollo de estrategias y recursos socio-familiares, la flexibilidad del mercado laboral y la dominación de género.Resumen de la Ponencia:
Es muy sabido ya que las condiciones laborales han deteriorado considerablemente en las últimas dos o tres décadas. Una muestra de ello está contenida en informe reciente de la Organización Mundial de la Salud y de la Organización Internacional del Trabajo (OMS/OIT, 2021) que reporta, para el periodo que va del 2000 al 2016, cerca de dos millones de muertes y un sinnúmero de enfermedades y trastornos de diversa índole vinculadas a las condiciones de trabajo a nivel mundial. La situación parece tal que una expresión como “el trabajo mata” (le travail tue) usada en diversos video-reportajes franceses y el título del libro de Pfeffer (2017), Muriendo por un cheque (Dying for a paycheck) suenan triviales. De lo que se trata es que el trabajo se ha vuelto contrario a la vida de los individuos; eso lo confirman numerosas situaciones cotidianas, además de los casos paroxísticos contenidos en el informe y libro citados. En esta ponencia, propongo un ensayo de análisis de ese lado oscuro de la realidad del trabajo (asalariado) en nuestros tiempos haciendo uso de las nociones de “cercamiento” (enclosure) (Polanyi, 2011; Béaur, 2021) y de “abaratamiento” (cheapening) (Patel y Moore, 2017). En la Inglaterra del siglo XVI (después en Francia), los “cercamientos” consistieron en la privatización de las tierras rurales comunales expulsando a los campesinos de donde, por tradición, acostumbraban pastorear su ganado, cazar, cultivar alimentos y abastecerse de agua. Para Béaur, “Los cercamientos fueron una catástrofe social” que, a la postre, se volvió uno de los principales impulsos de la revolución industrial. Patel y Moore, por su parte, establecen que la historia del capitalismo se resume en el abaratamiento, para y mediante su explotación, de siete cosas, algunas de las cuales, como la vida, el cuidado y el trabajo, son el cemento mismo de la humanidad. Sin ceder a las facilidades de la amalgama incauta, sugiero un uso analógico de la la noción de “cercamiento” que combino con el de “abaratamiento” para intentar dar cuenta de lo que hace al trabajo mismo y a la vida de los individuos la actual organización del trabajo (asalariado). Así mismo, usaré datos extraídos de las narrativas de los participantes de una investigación empírica en proceso de análisis como testimonios de situaciones laborales que pusieron en peligro la vida de estos y expondré sus intentos de salida de esas condiciones de trabajo deletéreas.Resumen de la Ponencia:
En esta ponencia analizamos las formas de subjetividad que promueven la política pública de emprendimiento en Colombia y los Espacios de Formación en Emprendimiento -EFE- de las Instituciones de Educación Superior -IES- y las fuerzas que intervienen en los procesos de subjetivación de los “emprendedores”. Para esto llevamos a cabo tres estudios empíricos: un análisis de los documentos de política pública en Colombia, entrevistas a directores de los EFE de las IES y entrevistas a “emprendedores”. Como hallazgos podemos resaltar que los discursos que circulan tanto en los documentos de la política pública de emprendimiento como en los EFE de las IES promueven unas formas de subjetividad que pueden leerse en términos del empresario de sí, no obstante, las formas de subjetividad de los emprendedores/empresarios no pueden leerse exclusivamente en términos de una tensión entre sujeción y resistencia al emprendimiento como forma de gubernamentalidad neoliberal. Estudiar el emprendimiento como forma de gubernamentalidad a partir del análisis de los documentos de política pública, los discursos que circulan en los EFE y los “emprendedores”, permite dar cuenta de que el diseño de una política pública, en este caso, la de emprendimiento en Colombia, no se corresponde con su implementación. Aproximarse a los beneficiarios de esta política, los “emprendedores”, permite también acercarse a otras fuerzas distintas a los discursos del emprendimiento que han intervenido en sus procesos de subjetivación y que incluso han sido más potentes que éstos: los propios de la creación de empresa y el trabajo independiente que circulan en la familia y que se entrecruzan con un mundo del trabajo caracterizado por la flexibilidad y la informalidad, y los discursos y las prácticas propios de la espiritualidad y la religiosidad.Resumen de la Ponencia:
O desenvolvimento das tecnologias da informação e da comunicação que acompanhamos nas últimas décadas contribuiu com as metamorfoses do trabalho e tais mudanças incidiram sobre a saúde dos indivíduos. Neste sentido, sob a égide do capitalismo contemporâneo, a saúde dos trabalhadores que realizam trabalho mediado por plataformas digitais se mostra um objeto de estudo necessário. Este artigo tem como objetivo discutir a inter-relação entre as condições de trabalho e a saúde de motoristas e entregadores por aplicativos no contexto da plataformização do trabalho. Nossa proposta de investigação considera o trabalho informal e flexível relacionado à precariedade e às condições de trabalho que se constituíram numa conjuntura política e econômica neoliberal, que se favorece de estruturas legais e de novas tecnologias digitais para explorar, ao máximo, o trabalho humano. A discussão proposta tem como principais métodos de investigação: pesquisa bibliográfica relacionada ao tema e os resultados de pesquisas empíricas recentes que foram desenvolvidas pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) e pelo Projeto Fairwork Brasil, as quais obtiveram resultados provenientes de levantamentos de dados de diversos estados do país. As autoras deste artigo, inclusive, fazem parte da equipe de pesquisadores do Projeto Fairwork no Brasil. Por fim, a partir das formas de regulação e de gestão deste modelo de trabalho plataformizado, foram identificados aspectos que acentuam o desgaste do trabalho como a intensificação da jornada de trabalho, a insegurança e violência urbana, a exposição aos riscos biológicos das atividades, riscos de acidentes de trabalho, a ausência de proteções e seguros sociais, entre outros.
Introducción:
No decorrer da história, as formas de acumulação de capital passaram por diversas transformações. O capitalismo mantém-se vivo por meio da competitividade e da concorrência e, principalmente, do controle sobre o trabalho e de trabalhadores (Antunes, 2009). Do industrialismo manufatureiro ao padrão de acumulação taylorista/fordista, da consequente crise da forma de organização e gestão da produção e do trabalho taylorista/fordista ao toyotismo. A partir da década de 1970, acompanhamos um processo de reestruturação produtiva que inaugurou o modelo de acumulação flexível constituído por processos de produção voltados à demanda e à flexibilização das relações e condições de trabalho.
Hoje, diante da dinâmica concorrencial capitalista, se constituiu uma articulação que possibilita um formato novo e mais atualizado do toyotismo por meio das plataformas digitais. As plataformas digitais têm abrigado inúmeros trabalhadores e trabalhadoras, porém elas operam como mediadoras e não como empregadoras. Desta forma,identificamos a constituição de um novo modo de trabalho no contexto das recentes transformações tecnológicas, que chamaremos aqui de trabalho mediado por plataforma digital (ou por meio de plataformas digitais).
É sabido que em todos os modelos de organização e gestão do trabalho encontram-se formas de controle sobre o trabalho que impactam as condições de trabalho e o processo de trabalho. A partir da reestruturação produtiva ficaram evidenciados os sinais de mal-estar dentro e fora dos locais de trabalho em razão da flexibilização de contratos e do processo de trabalho, do aumento da intensidade e do ritmo de trabalho, etc. Os crescentes índices de doenças relacionadas ao trabalho, como doenças osteomusculares e transtornos mentais, denotam a precariedade que assola o mundo do trabalho e saúde dos trabalhadores (Praun, 2016; OIT, 2013).
Ainda, pesquisas recentes demonstram que por meio do controle e do gerenciamento do trabalho e da ausência da relação de trabalho, tornou-se possível expropriar ainda mais força de trabalho e elevar a lucratividade a níveis altos (Srnicek, 2017; Slee, 2017; Abílio, 2020; Antunes, 2018). Partindo do ponto de vista que as transformações nos sistemas produtivos tendem a também reconfigurar as formas de acidentes e de adoecimento recorrentes do trabalho (Uchôa-de-Oliveira, 2020), entendemos que existe uma relação entre o trabalho mediado por plataformas digitais e o adoecimento dos trabalhadores.
Tendo tudo isso em vista, este artigo tem como objetivo discutir a inter-relação entre as condições de trabalho e a saúde de motoristas e entregadores por aplicativos no contexto da plataformização do trabalho. A discussão proposta tem como principais métodos de investigação: pesquisa bibliográfica relacionada ao tema e os resultados de pesquisas empíricas recentes que foram desenvolvidas pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) e pelo Projeto Fairwork Brasil, as quais obtiveram resultados provenientes de levantamentos de dados de diversos estados do país. As autoras deste artigo, inclusive, fazem parte da equipe de pesquisadores do Projeto Fairwork no Brasil. Por fim, a partir das formas de regulação e de gestão deste modelo de trabalho plataformizado, serão apresentados aspectos que acentuam o desgaste do trabalho como a intensificação da jornada de trabalho, a insegurança e violência urbana, a exposição aos riscos biológicos das atividades, riscos de acidentes de trabalho, a ausência de proteções e seguros sociais, entre outros.
Desarrollo:
O trabalho mediado por plataformas digitais
Nos últimos anos acompanhamos uma crescente adesão de consumidores, usuários e trabalhadores às plataformas digitais, porém existem diferentes modalidades e formas de atuação das plataformas. A Organização Internacional do Trabalho [OIT] (2021) apresentou em relatório duas grandes categorias que as plataformas digitais podem ser enquadradas: as de location-based, cuja a determinação da atuação e das atividades depende da localização geográfica e das dinâmicas territoriais; e as web-based, plataformas que concentram suas atividades apenas de modo on-line, na internet. As atividades de ambas as modalidades perpassam por serviços digitais e produtos para usuários individuais, facilitação e mediação entre diferentes usuários e plataformas de mão de obra. Algumas plataformas podem ser consideradas “híbridas”, possuem mais de uma dessas características. Nick Srnicek (2017) distingue tipos mais específicos de plataformas: plataformas de publicidade, plataformas de produtos, plataformas de nuvem, plataformas industriais e plataformas enxutas. As plataformas de publicidade extraem e analisam informações de usuários com intuito de vender ao espaço publicitário. As plataformas de produtos oferecem bens e serviços acessíveis para assinantes. Plataformas industriais transformam a fabricação de produtos tradicionais em processos baseados na internet. Plataformas de nuvens alugam armazenamento de dados. E, por fim, as plataformas enxutas são caracterizadas por não possuírem os bens materiais dos quais lucram.
A Uber e 99Pop no ramo de transporte de passageiros, iFood e Rappi no setor de entregas, entre outras, que destacam-se no mercado nacional, podem ser consideradas plataformas de mediação, location-based (OIT, 2021), bem como enquadradas por plataformas enxutas (Srnicek, 2017). Esses modelos de plataformas digitais as quais nos referimos possuem três partes de execução importantes: quem realiza o trabalho; quem solicita o trabalho; e a plataforma que intermedeia a oferta e a demanda (Schmidt, 2017). Desta forma, a plataforma como “intermediária” é capaz de transferir a maioria dos custos, riscos e responsabilidades para as duas outras partes. Porém, quem presta os serviços, ou melhor, a parte que trabalha significa também a parte mais prejudicada desse triângulo (usuário-plataforma-trabalhador).
É evidente nesse modelo de plataforma que o trabalho é central para a realização do serviço final e ele, mesmo essencial, não é diretamente reconhecido. Por isso o trabalho é mediado pelas plataformas. O trabalhador constitui uma parte em desvantagem nesta relação, pois uma vez que a plataforma possui total acesso e controle dos dados, processos e regulamentos, fica evidenciada a assimetria de poder (Schmidt, 2017). Esta disparidade constitui uma das bases desse modelo de negócio.
Assim como se evidenciou nas últimas décadas, os aspectos gerenciais e organizacionais herdados da reestruturação produtiva aumentaram a precarização das condições de trabalho. O trabalho mediado por plataformas pode ser considerado, portanto, mais uma dessas formas e meios para a exploração da força de trabalho.
O cenário do mercado de trabalho brasileiro se construiu historicamente de maneira instável. Os trabalhadores oscilam entre ocupações formais, informais, contratos temporários e pequenos negócios familiares. O trabalho subordinado às plataformas aparece hoje como uma novidade, tendo em vista também a conjuntura recente do período de pandemia e pós-pandemia, estes setores de serviços intermediados por canais de tecnologia cresceram em número de usuários, trabalhadores e mercado.
O exercício do controle do processo de trabalho pelas plataformas demonstra que os mecanismos de gerenciamento algorítmico, dataficação e gamificação, além das novas configurações do trabalho, tornam os trabalhadores cada vez mais dependentes das plataformas para obter recursos para a sobrevivência.
Neste setor, os trabalhadores são considerados autônomos pelas empresas de plataforma porque não possuem qualquer vínculo empregatício reconhecido. No entanto, consideramos que o caráter de autonomia é fictício, pois os trabalhadores são subordinados às regras e às demandas previstas e impostas pelas plataformas. De um lado a plataforma propõe flexibilidade de trabalho, e, de outro, o trabalhador encontra na flexibilidade uma forma de ampliar a renda e conciliar o trabalho com outras tarefas do cotidiano. A forma como o trabalhador mediado por plataformas organiza o seu próprio processo de trabalho, o qual também está sujeito às interferências das plataformas, é chamada pela socióloga Ludmila Abílio (2019) de autogerenciamento subordinado.
Estima-se que aproximadamente 1,5 milhão de pessoas trabalharam no setor de transportes no fim de 2021, com entrega de mercadorias ou transporte de passageiros. Diante desse número, 61,2% são representados motoristas de aplicativos ou taxistas. Segundo o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), os profissionais vinculados às plataformas são em maioria homens, pretos e pardos, com idade inferior a 50 anos, com escolaridade variada. Por exemplo, entre os mototaxistas 60,1% não possuem ensino médio completo. Entregadores de mercadorias com moto e motoristas de aplicativo e taxistas encontram-se mais concentrados na região Sudeste e mototaxistas se concentram nas regiões Nordeste e Norte do país (Goés; Firmino; Martins, 2022).
Saúde do trabalhador no contexto da plataformização do trabalho
Segundo Cristina Laurell (1976), as diferentes formações sociais apresentam perfis patológicos também diversos, as quais dependem do modo particular que se desenvolvem as forças produtivas e as relações sociais de produção. Neste sentido, entendemos que o trabalho mediado por plataformas está inserido no processo de produção capitalista e suas estruturas organizacionais e gerenciais são determinantes para a compreensão do processo saúde-doença dos trabalhadores deste contexto.
Para contribuir à discussão utilizamos duas categorias analíticas de Laurell (1993) para contribuir ao debate: cargas de trabalho e processo de desgaste.
Cargas de trabalho dizem respeito aos elementos do processo de trabalho que podem alterar os processos corporais e psíquicos. Classificados em dois principais grupos de cargas. As que possuem materialidade externa ao corpo (físicas, químicas, biológicas e mecânicas) e as que adquirem materialidade através do corpo humano (fisiológicas e psíquicas). Os dois grupos põem em movimento a capacidade de adaptabilidade do corpo e da psique expressadas pelos seus processos.
O desgaste é entendido pela perda da “capacidade biológica e psíquica, efetiva e/ou potencial” (Laurell, 1993, p. 21). Deste modo, através da apreensão dos processos biopsíquicos, o desgaste da saúde, de modo geral, afeta o desenvolvimento das potencialidades individuais e coletivas de cada um. De maneira analítica, podem ser identificados “padrões de desgaste” dos trabalhadores por meio das formas da utilização da força de trabalho no processo de trabalho.
A partir disso, a seguir exporemos de maneira generalizada aspectos das cargas de trabalho e do processo de desgaste de entregadores e motoristas por aplicativo com base em pesquisas recentemente realizadas por alguns grupos de pesquisas, como o Fairwork Brasil e a Central Única dos Trabalhadores e o Instituto Observatório Social.
Inicialmente, destacaremos alguns resultados da pesquisa mais recente divulgada pelo Fairwork Brasil. O Projeto Fairwork tem como interesse a investigação do trabalho mediado por plataformas digitais. O projeto desenvolve uma pesquisa-ação sobre trabalho decente e condições do trabalho mediado por plataformas digitais. É coordenado pela Universidade de Oxford (UK) e possui uma equipe de pesquisadores de várias universidades do país. Inclusive, as pesquisadoras autores deste artigo integram o projeto.
No início de 2022, foi publicado o primeiro Relatório Anual Fairwork Brasil 2021. O relatório descreve o contexto do trabalho por plataformas no Brasil e elencou, por meio de pontuações, algumas plataformas que atendem aos princípios de trabalho decente elaborados pelo Fairwork (2022). As plataformas digitais deveriam cumprir os cinco princípios para serem consideradas promotoras do “trabalho decente'', que são eles: remuneração justa, condições justas, contratos justos, gestão justa, representação justa. As plataformas poderiam ter sido pontuadas de 0 a 10, sendo que quanto mais evidências sobre o cumprimento dos princípios fossem levantados, maior seria a pontuação.
O objetivo da pesquisa é estimular as plataformas e as instituições do Estado a avaliar e melhorar as condições do trabalho mediado por plataformas. As plataformas Uber e 99Pop na área de transportes e a iFood e UberEats, no ramo de delivery, foram analisadas pelo projeto. A plataforma iFood recebeu 2 pontos ao atender alguns requisitos no que se refere à clareza dos termos e condições aceitos pelos usuários e no âmbito representação, pois apresentou meios de diálogo com trabalhadores e garantia de liberdade de associação.
Dentre as plataformas citadas, apenas a 99Pop evidenciou que os motoristas vinculados à plataforma atingem ao menos um salário mínimo local (R$1.212,00 ao mês em 2021), no qual calcula-se os descontos com custos e recursos para o trabalho que são administrados pelos motoristas.
Diante do resultado da avaliação sobre as condições de trabalho, Uber e 99Pop demonstraram ações voltadas à proteção dos trabalhadores. Durante o período mais ávido da pandemia de Covid-19, as plataformas ofertaram equipamentos de proteção individual e garantias de ganhos proporcionais aos que seriam trabalhados no caso de contaminação e necessidade de afastamento. No entanto, os trabalhadores das plataformas, tanto da área de transporte quanto de delivery, apontaram para aspectos comuns de saúde e segurança, como falta de infraestrutura de acesso à banheiros, água potável e lugares de descanso. Além disso, das queixas mais recorrentes, destacam-se o risco de acidentes de trânsito, a violência, a exposição ao sol, dores e desenvolvimentos de problemas crônicos nas costas, estresse e sofrimento psíquico.
Entregadores
Os entregadores atuam no transporte de mercadoria, frete de produtos ou de alimentos. O ramo de delivery de alimentos possui uma grande expressão no mercado e de adesão de trabalhadores, sendo que as principais plataformas deste setor no Brasil são: iFood, Rappi, ZéDelivery, James, entre outras. Essa atividade é realizada com moto ou bicicleta, por isso também os trabalhadores podem ser identificados como bikeboys ou motofretistas.
Com incentivo da OIT, a Central Única de Trabalhadores e o Instituto Observatório Social desenvolveram uma pesquisa (CUT, 2021) sobre as condições de trabalho de entregadores da cidade de Brasília (Distrito Federal) e Recife (Pernambuco). Esta pesquisa teve também o intuito de compreender os impactos das recentes reformas previdenciária e trabalhista sobre a atividade dos trabalhadores mediados por plataformas.
O processo de trabalho de bikeboys e motofretistas possui inúmeras nuances sobre saúde e segurança que precisam ser levadas em consideração. Inicialmente, foi possível identificar cargas materializadas externamente ao corpo, como o excesso de exposição ao sol e às chuvas; vulnerabilidade a acidentes de trânsito, assaltos e violência; e também a inalação de pós e gases presentes nas ruas das grandes cidades.
Uma característica muito importante do trabalho de entrega é o tempo e a gestão do tempo. Segundo a pesquisa, há um caráter heterogêneo dos arranjos adotados por cada trabalhador em relação à jornada de trabalho. O tempo de trabalho e a forma de organização do tempo por dia e por semana são variáveis, pois uma das principais características desta atividade é a flexibilidade de horário e isto constitui um dos fatores que torna o trabalho atrativo para os interessados em ingressar no ramo.
Na pesquisa, constatou-se que há uma despadronização da jornada de trabalho, notada pela perda de referência no modelo antes convencional de 8 horas por dia, 5 dias na semana, e 40 a 44 horas semanais de trabalho. Neste sentido, há inúmeros relatos de extensão dos horários de trabalho, pois mesmo que o entregador trabalhe e fique disponível a plataformas durante 8 horas diárias, muitas vezes estas horas estão espaçadas por longos períodos em que não há demanda. Por exemplo, um entregador que trabalha das 12h às 15h, durante o horário de almoço com maior demanda e das 18h às 23h, seguindo a mesma lógica de maior número de pedidos. Às vezes, as 3 horas entre os períodos de maior atividade não necessariamente são destinadas ao descanso. Entende-se que esta extensão da atividade, podendo ser chamada de invasão, se sobrepõe aos tempos dedicados ao descanso e a outras atividades, até alcançar situações-limite e que, praticamente, consomem todo o dia e todos os dias da semana (CUT, 2021). Ademais, a dinâmica de trabalho prescrita à atividade resulta, segundo a pesquisa, em certa tensão constante do tempo de entrega. Este tempo é determinado algoritmicamente através da avaliação, metas, até mesmo através da sugestão de um tempo máximo para entrega que algumas plataformas propõem.
É importante salientar que a relação prolongada do indivíduo com o trabalho e seu envolvimento revela processos de tensionamento fisiológicos e psicológicos que podem estar vinculados ao processo de desgaste da saúde do trabalhador (Laurell & Noriega, 1989). Neste caso, o desgaste não fica tão visivelmente compreendido, porque depende das características e mobilizações subjetivas dos indivíduos aliadas ao prolongamento da exposição às cargas fisiológicas e psicológicas. Como por exemplo a tensão e a apreensão que são acometidos entregadores pela possibilidade de serem lesados fisicamente por um acidente, pelo risco de perda do trabalho, pelo medo e risco de assaltos, violência ou assédio.
As condições precárias dos lugares de uso para pausa e descanso (calçadas, praças, postos de gasolina e shoppings) também se enquadram como cargas do âmbito fisiológico e psíquico que prejudicam a viabilidade do desenvolvimento das capacidades biopsíquicas dos indivíduos. Muitas vezes, eles não encontram água, nem banheiros, ou tomadas para recarga da bateria de energia do celular.
Especificamente sobre a saúde mental destes trabalhadores relaciona-se ao medo de bloqueios, pois as plataformas utilizam das regras de avaliação e punições de restrição ao trabalho nas plataformas que confere certa pressão sobre qualidade do trabalho e cumprimento das regras prescritas pelas plataformas. A intenção do trabalhador sempre será de não ser atingido por bloqueios para não prejudicá-lo financeiramente e emocionalmente.
Os relatos dos trabalhadores demonstram também que no momento da entrega do produto, os entregadores podem passar por situações preconceituosas, discriminatórias e humilhantes, tanto de usuários do serviço quanto por outros indivíduos envolvidos no processo, como os porteiros, seguranças, etc.
Consideramos que todas as cargas descritas se relacionam ao processo de desgaste vivenciado pelos entregadores.
Motoristas
No caso do serviço ofertado pelas plataformas do setor de transporte de passageiros, o valor das viagens corresponde a um preço baseado no tempo e na distância, a um custo fixo variável dependendo da região e um valor dinâmico que é determinado pela oferta e demanda. Quando finalizada uma viagem, uma parcela é destinada à empresa de plataforma e o restante ao motorista. Assim como é feito com as entregas de mercadorias. Embora o valor de uma viagem, mesmo com os aspectos já citados, seja determinado pela plataforma e não pelo motorista, tais empresas se abstém da possibilidade de haver um vínculo empregatício na relação entre o motorista e a empresa. A empresa Uber defende que “não emprega nenhum motorista e não é dona de nenhum carro” (Uber, 2020), pois oferece “uma plataforma tecnológica para que motoristas parceiros aumentem seus rendimentos e para que usuários encontrem uma opção de mobilidade” (Uber, 2020).
O processo de trabalho dos motoristas indica cargas de trabalho muito parecidas com os bikeboys e motofretistas, principalmente na relação com as plataformas, as características da gestão e autogerenciamento do trabalho. Contudo, as características da atividade se modifica dependendo do meio de transporte, motoristas possuem uma exposição menor ao sol, frio e chuvas porque se protegem em seus carros. Mas possuem os mesmos problemas para paradas para descanso, acesso a banheiros públicos, alimentação, etc. O que se repete também é a extensão da jornada de trabalho, que chegam até 16 horas por dia ou mais.
Os trabalhadores motoristas por aplicativos no Brasil submetem-se a longas, exaustivas e inseguras jornadas de trabalho. Muitas vezes esta atividade de trabalho possibilita a obtenção única ou complementar de fonte de renda, acessar bens de consumo e cumprir com questões básicas para a reprodução da vida. Desta forma acabam ficando expostos a acidentes e ao adoecimento (Fairwork, 2022).
O Relatório do Projeto Fairwork divulgou o seguinte relato de um motorista por aplicativo:
Pedro tem ensino médio completo, se declara pardo, tem uma filha e mora em Porto Alegre (RS). O trabalho como motorista por meio da plataforma é a sua principal fonte de renda: “é uma coisa que eu preciso pra sobreviver”, conta. As jornadas intensas de trabalho de 8 a 12 horas contínuas por dia não são prazerosas, mas necessárias. Ele diz que a atividade muitas vezes não permite pausas para ir ao banheiro, nem conversar com colegas. “Tenho metas se eu não trabalhar eu não recebo. A Uber cria um vínculo querendo ou não”. Pedro reconhece que não é o próprio patrão e compreende que os algoritmos são uma forma de controle da plataforma sobre o trabalho. “O próprio sistema te manipula”. Cita como exemplos os bloqueios feitos pela plataforma ou a não autorização a participar de promoções que a plataforma organiza. “A Uber se comporta como se o carro fosse dela, mas é meu”. Não é possível cancelar uma corrida por escolha, mesmo com os motivos, de falta de segurança na região, passageiros sem máscaras, crianças sem cadeirinhas de viagens (Fairwork, 2022, p. 20).
Várias camadas do processo de trabalho de inúmeros motoristas destacam-se neste relato. Primeiro, o excesso de horas trabalhadas pela necessidade de alcançar metas pré-estabelecidas, mas que também são calculadas de acordo com as necessidades. Essas necessidades podem ter relação com possíveis dívidas, uma renda ideal a ser alcançada, também a necessidade de arcar com os altos custos do próprio trabalho como carro, combustível, manutenção e etc.
Outra afirmação importante é que, no caso dos motoristas, eles possuem pouca interação com colegas, pois não possuem ponto de encontro e também o encontro um com os outros não faz parte da atividade (entregadores tem locais de espera para retirada de pedidos em restaurantes e cozinha de delivery que acabam compartilhando da rotina com outros trabalhadores). Embora haja a interação com passageiros, o trabalho como motorista pode ser solitário. Aliás, há o fato de que os usuários das plataformas de transporte possuem autonomia nas avaliações sobre os motoristas, as quais podem acabar gerando banimentos se não estiverem no nível de qualidade exigido pela plataforma. Isso faz com que os motoristas estejam sempre em estado de atenção para atender as demandas da plataforma, além da atenção necessária no trânsito.
As plataformas também não têm controle sobre o comportamento dos passageiros; por mais que demonstrem “educar” seus usuários, é de responsabilidade dos motoristas alertar ao uso de máscaras (quando obrigatório) e até a necessidade de cadeirinha de viagem para crianças e o uso do cinto de segurança. O atrito ou conflito com passageiros também pode acarretar em bloqueios e penalidades, impedindo a atividade de trabalho de motoristas. Isso pode ser muito preocupante se a única fonte de renda possível ao trabalhador é a plataforma. Muitas vezes não há comunicação, nem direitos ou garantias com as plataformas (Fairwork, 2022).
Conclusiones:
A Câmara de vereadores da cidade de São Paulo divulgou no início de dezembro de 2022 um relatório com dados, questionamentos e recomendações referentes à atuação das plataformas digitais de transporte de passageiros e delivery na cidade, além de destacar as condições de saúde e segurança que os trabalhadores vêm enfrentando. Segundo a investigação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que deu origem ao relatório, a iFood afirma que 49% dos entregadores trabalham mais de 10 horas por dia. Além disso, destaca-se o relato da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), cuja o dado diz que ao menos 28% dos motociclistas que morreram em 2021 envolvidos em acidentes de trânsito atuavam como motofretistas. Muito relevante também se mostrou o dado do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, que diz que 70% das pessoas em estado grave que entraram ou estiveram internadas no Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas nos últimos anos são vítimas de acidentes de moto (São Paulo, 2022).
O que se percebe é um mesmo Estado atingido pelos prejuízos dos casos de acidente e de sua ausência, e evidentemente, contraditoriamente, responsável. A atuação das instituições públicas é essencial para a promoção de melhores condições de trabalho por plataformas. É preciso implementar e ampliar legislações de trânsito que diminuam casos de acidentes, controlar as atuações das plataformas, voltar-se à segurança e às condições de trabalho, e atender as demais garantias que escorrem entre os dedos daqueles que de fato necessitam.
Ainda assim, são inúmeros os relatos e evidências de resistência da classe trabalhadora. A exemplo, há o projeto e manifesto também coordenado pela CUT e pelo Observatório Social com apoio da OIT: A gente não se entrega. Esta iniciativa tem como objetivo ampliar o debate sobre as pautas da classe, dar voz às lutas por direitos e fortalecer a organização dos trabalhadores. A própria pesquisa apresentada neste artigo é divulgada e constitui uma ferramenta de contestação às empresas e ao Estado (CUT, 2021). Além disso, outros modelos de trabalho no campo crescente das plataformas digitais possuem meios alternativos como o cooperativismo de plataforma, cuja a proposta se baseia na autogestão, na horizontalidade e na copropriedade entre trabalhadores (Grohmann, 2018; Scholz, 2016).
Por fim, a partir dos aspectos levantados, entendemos que as atividades exercidas por entregadores e motoristas apresentam aspectos de insegurança, não somente em relação ao controle do trabalho, mas também porque estão expostos à violência urbana, aos acidentes de trânsito, e às doenças de longa exposição e infectocontagiosas. Além disso, os trabalhadores estão sujeitos a danos fisiológicos e psíquicos que não se materializam no corpo, mas afetam diretamente os “modos de andar a vida” (Laurell & Noriega, 1989). As cargas psíquicas e as cargas de trabalho de modo geral apresentam relação com os crescentes números de transtornos mentais relacionados ao trabalho. É urgente, portanto, problematizar a relação entre o modelo de gestão e organização do trabalho de entregadores e motoristas de modo a contribuir com a discussão sobre o processo saúde-doença e as condições de trabalho no contexto do trabalho mediado por plataformas.
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Palabras clave:
Condições de trabalho; Entregadores; Motoristas de aplicativo; Plataformas digitais; Saúde do trabalhador.
Resumen de la Ponencia:
La pandemia por COVID-19 asestó un golpe sin precedentes a la economía mundial y a los mercados laborales. La mayoría de los países paralizaron, en distinta medida, las actividades económicas y establecieron una restricción de la movilidad de las personas. En este contexto, diferentes organismos internacionales comenzaron la tarea de monitoreo de políticas públicas implementadas en los países. En el presente trabajo se toma como fuente principal informes y documentos elaborados por la Organización Internacional del Trabajo (OIT) durante 2020, a fin de analizar las programáticas políticas en torno a las condiciones de trabajo, seguridad social, apoyo y estímulo al empleo, y los ingresos en países de América Latina y G-20 en el primer año de pandemia. La OIT promovió la adopción de medidas basadas en tres pilares: proteger a los/as trabajadores/as en el lugar de trabajo, estimular la economía y el empleo, y sostener los puestos de trabajo y los ingresos. Estas propuestas se orientaron fundamentalmente a trabajadores/as asalariados/as formales e informales. Por su parte, el sitio web de este Organismo brinda información sobre cuáles fueron las medidas adoptadas por los diferentes países. Son destacables aquellas vinculadas a indemnizaciones por despidos y seguros de desempleo, a los cambios en la protección de la salud de los/as trabajadores/as, condiciones de higiene y seguridad en el espacio de trabajo, y la implementación del teletrabajo. Si bien la OIT no desarrolló particularmente orientaciones en torno al trabajo autónomo e informal, dentro de las medidas relevadas, se observan políticas cuya población objetivo fue esta parte sustanciosa de la población trabajadora. En este trabajo se presentan, por un lado, los principales hallazgos para los países de América Latina y por otro, los del resto de los países del G-20. Con esta ponencia se busca realizar una síntesis donde se tipifiquen, en términos generales, diferentes tendencias respecto a las medidas adoptadas en los países analizados y en particular, se ponderan las medidas adoptadas en Argentina. En síntesis, se identifica una tendencia general a tomar medidas tendientes a garantizar la supervivencia de la población y aminorar el impacto económico de la crisis, con particularidades. Cada país y región lo hizo a partir de las condiciones socioeconómicas preexistentes y las capacidades propias de los Estados, en donde incluyeron, además, las negociaciones y disputas entre las organizaciones del trabajo y el capital. En términos esquemáticos, es posible distinguir entre países en los que las políticas se centraron en la protección del empleo y las personas, frente a otros en los que se modificaron sustancialmente las legislaciones laborales, tendiendo a una flexibilización para garantizar los niveles de empleo, a favor de las empresas. En el medio de estos dos polos, hay situaciones intermedias que combinan ambos tipos de medidas.