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Resumen de la Ponencia:
Esta comunicação analisou dados quantitativos referentes à presença de autorias indígenas nos materiais didáticos e nos periódicos científicos da região Sudeste brasileira. Partindo de análise quantitativa e qualitativa, analisou-se que a escrita de si indígena é radicalmente múltipla e descentrada da concepção de um indivíduo tipicamente humano, convergente e universalista. Em um segundo momento, foi observado as enunciações indígenas escolhendo, para tanto, algumas obras com ilustrações e textos. A partir dos resultados foi constatado o esvaziamento de tais autorias em primeira pessoa nos materiais científicos. Em contraposição, o crescente interesse de pesquisadores sobre a temática nos últimos anos aumenta expressivamente. Em síntese, trata-se, portanto, da interpelação dos materiais didáticos analisando os efeitos da diferença, da escrita e do mercado de citações indígenas no ambiente escolar.
Introducción:
Este artigo analisa o mercado das autorias indígenas na época contemporânea. Foram investigados os últimos arquivos das plataformas CAPES e IBCT e em outro contexto, os materiais didáticos de determinado instituto de educação. Para tanto, selecionamos alguns gráficos e mostragens que serão debatidos nesta pesquisa.
Nas reformas curriculares previstas pela UNESCO as legislações que normatizaram a obrigatoriedade do ensino de culturas africanas e indígenas no Brasil, são potencialmente autorizadas nos currículos acadêmicos, embora, atualizem as identidades do direito do indivíduo universal e não os direitos difusos ou coletivos, como tem se debatido efusivamente nas políticas anarcoindígenas da América Latina (Cusicanqui, 2015). Arriscamo-nos, portanto, ao processo de crítica utópica às dicotomias entre essencialismo/ desconstrucionismo periféricos defendidos, quase sempre, nas mesmas lógicas de base moderna. E para tanto, partimos das economias das citações indígenas nas revistas.
Desarrollo:
1. Metodologia
O estudo se baseia fundamentalmente em uma metodologia de foro quantitativo, tomando como luz as discussões pós qualitativas iniciadas pela corrente pós-estrutural de métodos e aferição de dados. Nesse sentido, vamos analisar os dados aqui, com talvez menos certezas que estes valham. As funções quantificáveis dependem de fatores, como realidade de termos, provas, o que implica “suposta razão”, e naturalmente, o entendimento de verdade. Tais evidências mitigam o que os autores pós-quali entendem como “uma imitação servil do método das ciências brutas". Ou seja, forja-se um positivismo que concebe uma acepção limitada de pesquisa e metoldogias para as ciências humanas (Krenak, Bastos Lopes, Peixoto, 2021; Pierre, 2013; 2014). Nestes casos, as ontologias e os autores indígenas, que não assumem o sujeito/ objeto binário como realidade totalitária em si, auxiliam de forma especialmente contundente no entendimento de que os dados em contextos individuais, não são grandes qualificadores “em realidade”. Nas palavras de St. Pierre (2013) sobre tal aspecto:
Eu li muitos relatórios de pesquisa qualitativa em que as teorias descritas na revisão de literatura foram abandonadas durante a análise porque os pesquisadores estavam obcecados com a “aparência bruta” do senso de dados ao privilegiar a presença de sensação na coleta de palavras de entrevistas face a face e em observações. Codificando palavras/ dados (mesmo que usando a priori esquemas de codificação); e por “descobrir” regularidades empíricas e padrões (temas) em palavras, textos utilizando indução analítica e realismo ontológico para a sua realização. Essas práticas refletem o positivismo latente que supera o interpretativismo, tratando palavras como dados brutos e numéricos que podem produzir a verdade. Neste cenário, os melhores dados não exigem interpretação teórica, acredita-se que eles podem “falar por si”. É realmente bruta tal forma de investigação. [...] No final, os relatórios que não conseguem interpretar, teorizar, não fornecem uma evidência de qualquer coisa muito analítica. Alguém poderia argumentar que a fraqueza desse tipo de pesquisa é causada pelo próprio cientificismo (St. Pierre, 2013, p. 3, tradução nossa).
2. Autorias indígenas em revistas científicas
Apresentamos pesquisas em revistas científicas durante os anos 2016 a 2019 a partir dos sites CAPES e CNPq. Como primeira etapa, realizamos o levantamento quantitativo a partir de duas grandes palavras-chaves, “Indígenas em Materiais Didáticos” e a “Representação do Indígena no Material Didático” convergindo para o campo da Educação. No segundo gráfico, concomitantemente, 10 dessas produções foram selecionadas e debatidas. Porém, apresentaremos neste entrecho apenas os apontes quantitativos no intuito de contribuir para uma visualização comparativa, sem ainda a análise dos materiais didáticos e propriamente o PNLD.
No gráfico 1, "Indígenas em Materiais Didáticos", em 2016 localizamos nas bases das revistas científicas CAPES, 917.054 pesquisas com o tema objeto e em 2019, 107.154,3 trabalhos, evidenciando um aumento expressivo no período de três anos. Em uma porcentagem aproximada:
80% dos periódicos científicos demonstram que indígenas estão representados em materiais didáticos.20% dessas mesmas revistas, pontuam que os materiais didáticos não fazem menção a autores indígenas.90% não incluem autores indígenas nas referências dos artigos. Apenas 10% dos periódicos com referida palavra-chave possuem autorias indígenas (como colaborador, ou mesmo, coautor) nas referências bibliográficas.
Já no gráfico 2, a “Reprodução do Indígena em Materiais Didáticos”, em 2016 esboçava 978.759 periódicos e em 2019 localizamos 113.783,5 investigações aumentando para 864.975,5 pesquisas no período de três anos[1].
60% das produções evidenciam que os indígenas constam nos materiais didáticos.40% dos estudos demonstram que os materiais didáticos não mencionam populações indígenas.Apenas 20% das pesquisas nesta palavra-chave possuem escritores ameríndios como autores ou colaboradores nas referências bibliográficas. 80% das pesquisas não têm a autoria, colaboração ou fazem qualquer citação a autores e colaboradores indígenas.
3. Materiais Didáticos na Educação Básica
Sobre o instituto de educação na cidade do Rio de Janeiro: a instituição atende o corpo acadêmico e escolar, sendo este um dos aspectos decisivos para o campo. Reconhecida como instituição de excelência, o corpo pedagógico agrega estudantes da educação básica e professores universitários que desenvolvem pesquisas em diferentes áreas do conhecimento (Bastos Lopes, 2019, 2022). A escolha decorre, justamente do caráter privilegiado do local, possuindo uma variabilidade de projetos, currículos e acervos literários.
Nos últimos anos, uma fala recorrente reconhece a falta dos autores indígenas nos materiais didáticos. Existiria pouco ou nenhum espaço para discussão histórica (Bastos Lopes, 2019). Um estudo produzido por autores ameríndios norte e sul-americanos (Terena, 2020; Taiaiake, 2009; Smith, 2012) demonstrou como os livros utilizam uma linguagem humanista e racional para ensinar conceitos animistas e sagrados dos povos indígenas.
O conceito de material didático ampliou com a Lei nº 11.645/08 e o Parecer nº 14/15 (BRASIL, 2008), afirmando a obrigatoriedade do ensino indígena. As políticas têm conseguido dessa forma, a problematização das tipificações dos materiais pedagógicos (Bastos Lopes, 2019). Este é um ponto positivo para a Educação Indígena, entretanto, em vez de olhar para o contraste apenas no nível legislativo, queremos levar o argumento em outra direção. A pesquisa orienta-se a partir de duas grandes hipóteses: a primeira (1), considera a existência de um novo paradigma que tem incorporado indígenas nos currículos de Educação Básica. A (2) segunda, entende que apesar da inclusão da temática, apoiados pelas políticas de diversidade, a sua figura ainda é representada em pressupostos assimilacionistas e esquemáticos sem grande participação de autorias ou enunciações nos produtos que chegam ás escolas.
Para a análise, o primeiro eixo compreendeu um trabalho tipicamente estatístico de contagem e mapeamento das autorias indígenas. O levantamento com foco na representação foi produzido em extensa parte, na primeira parte do projeto, referente a autores nas publicações das revistas científicas. No estudo de caso dos materiais pedagógicos, dividimos a pesquisa em três segmentos. (1) a análise do quantitativo dos conteúdos programáticos e materiais sobre culturas indígenas nos dois últimos anos do instituto. Com base nos levantamentos, passamos a uma (2) segunda etapa, a da metodologia, o estudo qualitativo bibliográfico do ensino dessas sociedades nos materiais de ensino. Em seguida, passamos ao (3) terceiro eixo performático: a publicização dos dados com o objetivo de oferecer análises e mostras quantitativas.
O gráfico 1 esboça o resultado quantitativo das atividades do instituto de forma genérica. Como resposta, pode-se constatar que 21% dos materiais possuem abordagem convergente ao estudo indígena. Em contraposição, 79% dos exercícios não apresentam qualquer conteúdo relacionado e/ ou suas derivações. Os conteúdos analisados refletem reiteradamente os diversos campos disciplinares do Ensino Fundamental. Esses campos estão divididos em projetos sendo eles: Projeto Bairros, Projeto Ciências, Projeto Matemática, Projeto Português, Projeto Povos Brasileiros, e Projeto Vale do Paraíba. Além disso, conta também com avaliações e vídeos. O total de conteúdo foi de aproximadamente 240 acervos e desse número, apenas 26 trabalharam a temática ameríndia se incluirmos as avaliações e vídeos, em contraste aos 214 restantes que não estudam ou fazem nenhuma menção ao tema objeto.
Com acesso ao banco de dados, foram coletados materiais de diversas áreas do ensino. Em consequência, houve uma análise das atividades selecionadas que abordavam questões referentes aos indígenas.
Ressaltamos que entendemos como enunciação indígena toda e qualquer citação ou estudo aprofundado dessas populações. Uma próxima análise foi situar e quantificar das enunciações quantas possuíam autorias indígenas, entendendo como autoria, toda participação como interlocutores, considerando escritos, falas, textos e vídeos. Complexificando a ideia de uma autoria meramente indexada em livros.
O segundo gráfico acima, demonstra a análise sobre autorias/ enunciações, resultando em apenas 4% dos materiais inspirados ou com autores indígenas no seu corpo de citação. Sendo 96%, os que não possuem tais tipos de manuscritos.
Figura 1 – Tabela, Textos e Materiais Didáticos
PROJETO PORTUGUÊS
PROJETO POVOS BRASILEIROS
PROJETO CIÊNCIAS
VÍDEOS, POWER POINT E LINKS DO YOUTUBE
O buraco no céu
(Daniel Munduruku)
A participação dos povos indígenas na cultura brasileiraAvaliação de Ciências: mapa das populações indígenasAldeamento Indígena
Os filhos do trovão
(Daniel Munduruku)
Antes de nós, os índios Brasil Colônia I
Conto - Kaba Derebu
(Daniel Munduruku)
Dia do Índio Mapa Político do Brasil
Conto do fogo (Daniel Munduruku)Mercúrio e Garimpo Amazônia e Reservas Indígenas
A lenda do dia e da noiteRio antes do Rio Fundação do Rio de Janeiro
Deus TupãComo era a paisagem do Rio Povo TarianaSéculo XVI: europeus em terras indígenas Como surgiu a noiteNome do Rio de Janeiro Glossário - Palavras TupisO que significa Carioca Avaliação - Declaração solene dos povos indígenasO Rio de Janeiro continua índio Fonte: Acervo dos autores, 2021- 2022
A tabela 1 mostra com detalhamento os conteúdos que possuem a enunciação indígena incluindo distintas áreas dos conhecimentos e tipos de atividades. Os estudos indígenas dentro dos arquivos (pastas) e avaliações permaneceram em 21 materiais, divididos entre os Projetos Português, Povos Brasileiros e Bairros, entretanto, ao acrescentar outras pastas como apresentações de powerpoint, vídeos e links de Youtube, passa a totalizar 26 materiais pedagógicos. É relevante observar que os que possuem autorias indígenas prevalecem em apenas quatro projetos e se restringem apenas à Língua Portuguesa; na leitura e atividades com contos de um mesmo autor: Daniel Munduruku.
Por fim, no Projeto Matemática, Projeto Vale Paraíba e Projeto Bairros, não foi encontrado nenhum estudo indígena, havendo exclusivamente uma menção ao mapeamento das populações em uma avaliação na disciplina Ciências da Natureza. O restante dos conteúdos se restringem às Ciências Humanas e Linguagens (Língua Portuguesa e Literatura Brasileira), reiteradamente.
A partir dos dados alcançados associados aos gráficos, é perceptível que os materiais didáticos ainda têm muito o que dirimir no sentido de uma geopolítica menos racista, ocidental e embranquecida. Mesmo considerando como autorias, as entrevistas, as coautorias e toda referência realizada por indígenas, encontramos apenas Daniel Munduruku como obra majoritária (Bastos Lopes, 2017, 2022). O que torna explícita a distinta participação de enunciadores indígenas, (4%) mesmo com as políticas de ação afirmativa e lei de obrigatoriedade do ensino sobre a temática nas escolas. Estes dados apontam a baixa imersão dos indígenas como interlocutores de suas próprias enunciações.
Conclusiones:
Notada a variação de atividades que estudam a temática, é significativo o volume de exercícios no caso das atividades escolares e periódicos, que acedem autorias indígenas, apesar dos estudos estarem concentrados nos campos da História, Geografia e Sociologia. O artigo conclui que por mais que a reiteração da temática tenha aumentado exponencialmente, o número das suas enunciações não tem aumentado na mesma proporção. Isto significa, que há uma quantidade significativa de estudos sobre indígenas realizados por pessoas não indígenas, e, devido a isso, tentamos expor tal interesse inversamente proporcional.
Um conteúdo tendo como locutores os próprios indígenas assumem potencialidades não inteiramente outras, mas expõem as subjetividades de um grupo. Sob esse prisma, concluímos que utilizar metodologias, conteúdos e literaturas feitas por e para indígenas é trabalhar com o que instiga e provoca os índices convencionais de autorias e seus vastos mercados de citações. Portanto, torna-se importante problematizar a comparação entre escritas e promover um estudo que perceba indígenas como dotados de naturezas carregadas de epistemologias, escritas de si e ontologias. Expandindo o ensino para além dos campos das ciências humanas e tratando-os não como cultura outra, porém, pensando as potencialidades nas contribuições e processos de educação, como por exemplo, o campo da linguagem. É interessante, assim, o exercício de uma prática pedagógica que não colabore com a perpetuação de verdades únicas (Das, 2015), e em contrapartida, multiplique naturezas e epistemologias subalternas.
Bibliografía:
BASTOS LOPES, D. (2017). A presença do invisível em escolas indígenas: escolarização, diferença e cosmologia entre os povos Mbyá (Guarani) do Rio de Janeiro. Cadernos Cimeac, 7,103 – 119.
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BASTOS LOPES, D.; LUIZ, J. R. (2022). O mercado de citação das autorias indígenas no Brasil: um estudo político (2016-2024). Tellus, Campo Grande, 22 (49), 91-108.
BRASIL. (2008). Lei 11.645/08 de 10 de março de 2008. Altera a Lei n° 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Diário Oficial da União. Brasília, DF: Congresso Nacional, 10 mar.
CUSICANQUI, S. R. (2015). Sociología de la imagen: miradas ch’ixi desde la história andina. Buenos Aires: Tinta Limón.
DAS, V. (2015). Affliction: health, disease, poverty. New York: Fordham University Press.
KRENAK, E.; BASTOS LOPES, D.; PEIXOTO, L. (2021). “Com que sangue foram feitos meus olhos?” Conversando com Edson Krenak sobre literaturas e metodologias indígenas. Revista Teias, Rio de Janeiro, 22 (70 [especial]), 12-28.
PIERRE, E. A. (2014). St. An always already absent collaboration. Cultural Studies - Critical Methodologies [s.l.], 14 (4), 374-379.
PIERRE, E. A. (2013). St. The appearance of data. Cultural Studies - Critical Methodologies [s.l.], 13 (4), 223-227.
SMITH, L. T. (2012). Decolonizing methodologies: research and indigenous peoples. New York: University of Otago Press.
TAIAIAKE, A. (2009). Wasáse: indigenous pathways of action and freedom. Toronto: University Toronto Press.
TERENA, M. (2020). A literatura indígena deve atender ao interesse das comunidades indígenas! In: DORRICO, J.; DANNER, F.; DANNER, L. F. (Orgs.). Literatura Indígena Brasileira Contemporânea: autoria, autonomia, ativismo. Porto Alegre: Editora Fi.
Palabras clave:
Enunciações Indígenas; Materiais Didáticos; Diferença.