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Resumen de la Ponencia:
Um dos dois maiores desafios da atualidade é equilibrar o crescimento das cidades e responder aos problemas de emergências ambientais e climáticas, que geralmente se inserem de forma incipiente nas agendas governamentais das cidades latino-americanas. No Brasil, essa realidade não é diferente. Com um complexo dinâmico de cidades de grande, médio e pequeno porte, marcadas pelas desigualdades socioambientais, bem como pela forma exploratória, extensiva e intensiva de seus recursos naturais, as cidades tendem a ser mais vulneráveis às ameaças de eventos climáticos extremos, ou que limitam o desenvolvimento de aspectos da capacidade adaptativa às mudanças climáticas. Nesse sentido, o objetivo deste artigo foi compreender como se apresenta a capacidade adaptativa às mudanças climáticas em cidades localizadas em territórios de clima semiárido, no contexto da bacia hidrográfica do rio Piancó-Piranhas-Açu, no Rio Grande do Norte, Nordeste do Brasil. Metodologicamente, a pesquisa é bibliográfica, documental e quantitativa, com base no Índice de Gestão da Capacidade Adaptativa (IGCA), que utiliza dados de fontes secundárias (Pesquisa de Informações Básicas Municipais - MUNIC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), referente ao ano de 2020; e os dados da Plataforma AdaptaBrasil MCTI (Sistema de Informação e Análise de Impactos das Mudanças Climáticas), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Os resultados mostram que as cidades apresentam estruturas de gestão voltadas para a capacidade adaptativa às mudanças climáticas ainda embrionárias,
Introducción:
Na atualidade, um dos grandes desafios contemporâneos é equilibrar o crescimento das cidades e responder aos desafios das emergências ambientais e climáticas. Esse desafio nem sempre está no centro das gestões dos governos nas cidades latino-americanas, e no Brasil essa realidade não é diferente em suas cidades, que formam uma rede urbana complexa de grandes, médias e pequenas cidades. Essa complexidade da rede de cidades brasileiras, influencia em todas as dinâmicas territoriais e urbanas, e consequentemente no processo de desenvolvimento da capacidade adaptativa às mudanças climáticas que podem interferir nas condições de vulnerabilidade e de maior suscetibilidade às ameaças de eventos climáticos extremos que os prognósticos indicam maior probabilidade de ocorrências e intensidade dos seus efeitos.
É o fato de que nos últimos anos aumentaram as ocorrências de eventos climáticos extremos que vemos afetar as cidades brasileiras, gerando cenários de riscos e desastres, como enchentes, enchentes, escassez de água, seca, desertificação, entre outros (Adger et al. , 2007, Martins & Ferreira, 2011, Teixeira et al ., 2021), a exemplo disso tem-se o período de seca que atingiu o Nordeste do Brasil entre os anos de 2012 e 2017, e mais recentemente (2021-2022) os extremos de chuva que causaram enchentes e deslizamentos de encostas nos estados da Bahia, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo. Os cenários de desastres decorrentes desses eventos climáticos extremos, quando somados aos aspectos de organização espacial das cidades brasileiras, marcadas por profundas e históricas desigualdades, provocadas pelo uso e ocupação do seu território de forma extensiva e intensiva dos seus recursos naturais, torna-o um país de extremos.
Embora haja o reconhecimento da necessidade de incorporação de ações de adaptação às mudanças climáticas, por parte dos governos locais, em todo o mundo (Di Giulio et al., 2019), essa forma de gestão ainda não é percebida com tanto afinco nas cidades, de forma geral. No contexto do Brasil é ainda bastante incipiente, e nos últimos anos ampliou-se a falta de priorização das questões socioambientais e climáticas como pauta estratégica nas agendas políticas-governamentais em todos os níveis da federação brasileira. Entretanto, como o novo governo federal, empossado em janeiro deste ano, a expectativa é que haja uma mudança de orientação nestas agendas
Pois, é notório que quando tal posicionamento parte da ingerência do governo nacional, isso reflete também nas agendas dos governos dos estados e municípios brasileiros, que consideram pautas pouco estratégicas politicamente. Essa característica não parece ser diferente mesmo em regiões consideradas de alta vulnerabilidade às ameaças climáticas, como no caso do Semiárido brasileiro, caracterizado por grande variabilidade climática, e de ocorrência de longos períodos de estiagens e secas cada vez mais prolongadas (Marengo, Alves, Beserra & Lacerda, 2011, Santana & Santos, 2020). Sem falar que a maior parte do seu território está localizado na região Nordeste do Brasil, caracterizada por apresentar fortes assimetrias sociais, índices de pobreza elevados, baixo dinamismo econômico e infraestrutura urbana deficitária e maior população rural do país.
Assim sendo, este artigo parte da hipótese que a capacidade adaptativa às mudanças climáticas nas cidades brasileiras, depende das vontades dos governos, de suas estruturas institucionais e da sua inserção estratégica nas gestões governamentais. Nesta direção, o objetivo é compreender como se apresenta a capacidade adaptativa às mudanças climáticas em cidades localizadas no território semiárido, da bacia hidrográfica do Rio Piancó-Piranhas-Açu, no Rio Grande do Norte, Nordeste do Brasil.
Nessa perspectiva, este artigo está estruturado em mais duas seções, além desta introdução. A princípio incorpora os aspectos de metodologia, resultados e discussões. Dessa forma, foi apresentada a caracterização da área de estudo, que se refere ao Semiárido brasileiro, no contexto da bacia hidrográfica do rio Piancó-Piranhas-Açu, no estado do Rio Grande do Norte, Brasil. Os critérios metodológicos adotados para o desenvolvimento do artigo estão bem descritos. Nesta seção, são apresentados os resultados e a discussão da pesquisa, com base na literatura. Por fim, na última seção, foram apresentadas as principais conclusões e considerações sobre a gestão da capacidade adaptativa às mudanças climáticas, no contexto de dois governos locais.
Desarrollo:
Materiais e Métodos
Caracterização da área de estudo
A área de estudo deste artigo está inserida no contexto do Semiárido brasileiro, e envolve, sobretudo, os 21 (vinte e um) municípios da Unidade de Planejamento Hidrológico Seridó (UPH Seridó), situados no recorte territorial da bacia hidrográfica do Rio Piancó-Piranhas-Açu, no Rio Grande do Norte, Nordeste do Brasil (Figura 1). Em termos mais abrangentes, a bacia engloba 147 municípios dos estados da Paraíba (100) e do Rio Grande do Norte (47), e sua população é de mais de 1,4 milhões de habitantes, agregando aproximadamente 23% e 16% da população total dos referidos estados, respectivamente (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2010, Agência Nacional de Águas [ANA], 2018).
Figura 1. Mapa de localização da UPH Seridó, Rio Grande do Norte, Brasil

Fonte: As autoras (2023).
A UPH Seridó, na bacia hidrográfica do Rio Piancó-Piranhas-Açu, também engloba municípios dos dois estados da federação, supracitados, sendo 16 inseridos no território da Paraíba e 21 correspondentes ao Rio Grande do Norte. Todavia, o recorte espacial deste artigo restringiu-se apenas aos municípios inseridos no estado do Rio Grande do Norte (UPH Seridó RN). Nesse sentido, em termos populacionais a UPH Seridó RN apresenta uma população estimada em 264.506 habitantes (IBGE, 2020), onde a maioria dos municípios (66,7%) possui menos de 10.000 habitantes, e apenas três municípios (14%) apresentam população superior a 20.000 habitantes, o que a caracteriza como uma região de pequenos municípios, e consequentemente pequenas cidades (IBGE, 2020).
Em termos ambientais, a UPH Seridó RN é uma região de clima semiárido, inserida no bioma Caatinga, cujas características predominantes são a alta variabilidade climática, temperaturas mais elevadas, baixa pluviosidade, e baixos índices de precipitação média anual (ANA, 2018, Lucena, 2019). Isso implica, entre outros fatores, em baixa disponibilidade hídrica, e maior vulnerabilidade socioclimática às populações que vivem na região (Marengo, 2008, ANA, 2018, Lucena, 2019).
A escolha da área de estudo se deu em função das características socioambientais da região, que apresentam maior suscetibilidade aos impactos das mudanças climáticas, tornando-a mais vulnerável aos eventos de extremos climáticos. Desse modo, levou-se em consideração, além dos aspectos de baixo dinamismo socioeconômico, o contexto de fragilidade socioambiental que denota os cenários de seca, desertificação e escassez hídrica, presentes na região (Marengo, 2008). E por ser considerada uma área estratégica, devido às características elencadas acima que a tornam umas das suscetíveis aos efeitos das mudanças climáticas em curso.
Procedimentos metodológicos
No intuito de atingir o objetivo proposto na seção introdutória deste artigo, a metodologia apresenta abordagem quantitativa, uma vez que contribui analiticamente com os aspectos de diagnóstico situacional inerentes à capacidade de gestão adaptativa às mudanças climáticas, nas cidades da UPH Seridó RN.
Para isso foram coletados dados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic) de 2020, divulgada em 2021, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2021), haja vista a necessidade de informações recentes para cada município investigado. Os dados da Munic foram utilizados quantitativamente para a estruturação do diagnóstico situacional dos governos locais, quanto à capacidade de resposta aos riscos das mudanças climáticas, mediante a utilização do Índice de Gestão de Capacidade Adaptativa (IGCA), desenvolvido por Santos (2022), que corresponde a um dos objetivos do Projeto de Pesquisa “Gestão de riscos, vulnerabilidades socioambientais, sustentabilidade e capacidade adaptativa climática em cidades do semiárido do Nordeste”, Edital MCTIC/CNPq nº 23/2020 (Processo: 441883/2020-6).
A partir da metodologia do IGCA (Santos, 2022) estruturada em 77 indicadores, segmentados em três dimensões e seis categorias de análise, os resultados foram apresentados em mapas desenvolvidos em Sistema de Informações Geográficas (SIG), a partir do software QGIS DEVELOPMENT TEAM - Versão 3.22.8. Quanto a isso, utilizou-se a função Graduado de 5 classes em intervalos iguais, na função simbologia do QGIS, com distribuição de cores na escala semafórica, a saber: i. Verde Escuro; ii. Verde; iii. Amarelo Claro; iv. Laranja Claro; e, v. Vermelho. Sendo o verde escuro a cor que representa o melhor cenário, e vermelho como representação do pior cenário da análise (Santos, 2022).
Resultados e discussão
O problema das mudanças climáticas tem se tornado uma grande ameaça global, haja vista sua intensidade e poder de alcance, mas tem seus efeitos regionais e locais que necessitam ser considerados nessa problemática. Esse dilema toma maiores proporções quando se pensa sobre a sustentabilidade do planeta, uma vez que o espectro de complexidade desse fenômeno tem desafiado a ciência, em relação ao conhecimento da dinâmica de alterações climáticas, e o que essas modificações poderão ocasionar nos sistemas, em longo prazo (Engle, 2011).
Nesse sentido, a comunidade acadêmico-científica tem intensificado os estudos sobre mudanças climáticas, no intuito de encontrar estratégias mais eficazes no processo de antecipação ao enfrentamento dos impactos advindos dessas mudanças (Adger, 2001, Engle, 2011; Allen et al., 2018; Pörtner et al., 2022). Tais pesquisas são cruciais para o entendimento do fenômeno das alterações do clima, e os efeitos delas decorrentes, tendo em vista que “o aquecimento global e as mudanças climáticas podem conduzir à escassez de recursos naturais em certas regiões, prejudicando o sustento das pessoas” (Fernandes, 2014, p. 41).
Pesquisas realizadas no campo das mudanças climáticas evidenciam situações de impactos predominantemente desfavoráveis aos ecossistemas e sistemas humanos (Lavratti & Prestes, 2010, Allen et al., 2018, Pörtner et al., 2022). Isso implica que os impactos decorrentes das alterações no clima em face do aquecimento global, poderão refletir, sobretudo, em atividades relacionadas à “agricultura, a piscicultura e o extrativismo”, em virtude de serem mais vulneráveis, no aspecto climatológico. Todavia, também atingirão diretamente “a saúde humana, a segurança alimentar e a configuração das cidades (no tocante à habitação e à prevenção de desastres) e no próprio processo produtivo” (Mantelli, Castilho & Garcia, 2017, p. 5).
Ao considerar que os países em desenvolvimento tendem a sofrer em maior proporção os impactos advindos das mudanças climáticas (Adger, 2001, Bathiany, Dakos, Scheffer & Lenton, 2018), torna-se evidente o cenário de ameaça climática, principalmente no tocante às incertezas nos territórios e consequentemente às populações que deles fazem parte, frente às questões de insegurança nos meios de subsistência estratégicos. Seja causado pela ameaça à segurança hídrica, energética e alimentar.
No âmbito das mudanças climáticas, potencializadas pelo aquecimento médio global, as ameaças climáticas podem ser conceituadas como um fenômeno físico, capaz de modificar o curso natural de uma sociedade em função da ocorrência de eventos climáticos extremos (Adger, 2007, Allen et al., 2018). Essa modificação se enquadra, principalmente, nos aspectos de intensidade dos eventos climáticos que podem ampliar as áreas de riscos de desastres nas cidades.
Em outras palavras, a ameaça pode ser considerada como um fator de potencialização da variabilidade climática, o que permite a ampliação dos cenários de vulnerabilidade socioambiental (Adger, 2001, 2006, Allen et al., 2018). Isso, por sua vez, demanda dos governos locais ações estratégicas de respostas e enfrentamento aos riscos de impactos que o sistema pode sofrer, em caso da ocorrência dos eventos extremos de maiores intensidades (Allen et al., 2018, Di Giulio et al., 2019, Santos, 2022).
No contexto do semiárido brasileiro, incluindo o enquadramento territorial da UPH Seridó RN, os cenários de ameaça climática são ainda mais perceptíveis quando relacionados aos riscos de impactos derivados de seca. Ao aplicar o IGCA, no que tange aos indicadores de ameaça climática (Santos, 2022), os resultados apontam que os municípios da UPH Seridó RN sofreram impacto de seca recentemente, entre os anos de 2017 e 2020. Nesse sentido, observa-se ainda que foi identificado o surgimento ou aumento de áreas de desertificação em pelo menos 38% dos municípios analisados.
Quanto aos riscos de desastres por eventos hidrológicos, quando há possibilidade de incidência de eventos extremos relacionados à água (chuvas, enchentes, enxurradas e outros), 28% dos municípios foram atingidos por alagamentos ou processos erosivos acelerados, no mesmo período. Nesse cenário, constatou-se que os municípios da UPH Seridó RN estão expostos tanto aos riscos de impacto de extremos climatológicos (seca), quanto hidrológicos.
Quando aplicado ao mapa de ameaça do IGCA, a representação de intensidade do grau de exposição dos municípios às ameaças climáticas, classifica esses municípios nas faixas de média a alta suscetibilidade (Figura 2).
Figura 2. Ameaça aos riscos das mudanças climáticas, UPH Seridó, RN, Brasil

Fonte: Santos (2022).
Como observado no mapa da Figura 2, percebe-se que a maior parte dos municípios da UPH Seridó RN (66%) estão inseridos na classificação de média intensidade às ameaças climáticas, enquanto 28% dos municípios apresentam alta suscetibilidade, estando apenas 01 (um) município enquadrado na classificação “Muito Alto” do IGCA, que representa o cenário mais pessimista do índice.
Esse contexto alinha-se ao cenário de incertezas quanto aos eventos extremos dessa natureza (secas e chuvas), pelo aumento da variabilidade climática (Adger, 2007, Bathiany et al., 2018), uma vez que não há uniformidade nos resultados das projeções climáticas globais nesse sentido, principalmente nos países do sul global, onde o Brasil está inserido (Intergovernmental Panel on Climate Change [IPCC], 2014, Marengo, 2014; Dias & Pessoa, 2020).
Quanto aos modelos climáticos relacionados ao contexto regional do Nordeste do Brasil, os resultados apontam para uma possível diminuição nos níveis de precipitação, o que pode resultar em aumento da temperatura média na região (Marengo, 2014). Esse cenário, quando comparado ao contexto de ameaça climática presente na UPH Seridó RN, sugere a possibilidade de aumento e sobreposição das vulnerabilidades socioambientais às quais os municípios já estão expostos, principalmente pelos aspectos de degradação ambiental causados pela influência antrópica. O que provocará intensificação nas condições de desertificação e o agravamento da incidência de extremos climáticos, seja de chuvas ou secas intensas e seus impactos nas populações (Adger, 2007).
Nesse sentido, embora o contexto físico e natural da UPH Seridó RN apresente fragilidades ambientais, pelos fatores já mencionados neste artigo, os resultados inerentes aos aspectos de vulnerabilidade indicaram que os municípios analisados apresentam maior vulnerabilidade social que ambiental, quando aplicados os indicadores de vulnerabilidade do IGCA ao contexto investigado (Santos, 2022).
Os resultados mostraram que 76% dos municípios foram atingidos com situações adversas resultantes em perdas financeiras, decorrentes da seca, enquanto 95% sofreram perdas de produção agrícola (95%). Quanto aos aspectos de vulnerabilidade ambiental, a frequência de municípios que sofreram impacto nessa categoria foi de 80% para o indicador MGRD033, que se refere a perdas animais, enquanto 47% dos municípios relataram perdas ambientais.
Quando há ocorrências de perdas animais, o IGCA compreende como perda de espécie e por isso se enquadra na categoria de vulnerabilidade ambiental. No entanto, há também o impacto socioeconômico se levado em consideração como rebanho de propriedade particular. Nesses casos, se ampliam os cenários de vulnerabilidade, os quais geralmente estão atrelados a condições de pobreza, e quanto a isso as populações expostas a tais situações sofrem maiores danos, haja vista a desigualdade socioeconômica existente nas regiões semiáridas.
Em suma, no que diz respeito ao nível de vulnerabilidade na UPH Seridó RN, a Figura 3 aponta três cenários. O mapa (A) representa a categoria de vulnerabilidade social; o mapa (B) corresponde à categoria de vulnerabilidade ambiental; e o mapa (C) demonstra o cruzamento de ambas as categorias, por meio da utilização de média aritmética, evidenciando o cenário de geral de vulnerabilidade socioambiental da UPH Seridó RN no dimensionamento do IGCA.
Figura 3. Mapa de vulnerabilidade aos riscos das mudanças climáticas, UPH Seridó, RN, Brasil

Fonte: As autoras (2023).
No primeiro cenário (A), percebe-se que grande parte dos municípios da UPH Seridó RN (71%) estão inseridos no cenário mais pessimista do IGCA, a faixa “Muito Alto”. Enquanto cerca de 24% apresentam alta vulnerabilidade, e apenas 01 município se insere no contexto de média vulnerabilidade social do índice.
O segundo cenário (B) apresenta situações um tanto extremas. Não há municípios em condição de média vulnerabilidade ambiental. Entretanto, pode-se observar que 47% dos municípios estão em condição de alta vulnerabilidade ambiental. Por outro lado, 38% apresentam baixa vulnerabilidade, e o cenário mais otimista está representado por 14% dos municípios da UPH Seridó RN, com incidência muito baixa, de vulnerabilidade ambiental.
Quando se observa o terceiro cenário (C), pode-se inferir que semelhante a categoria de ameaça, a UPH Seridó RN apresenta um contexto de média a alta vulnerabilidade socioambiental. Uma vez que 57% dos municípios se inserem na faixa “Alto” da categoria, seguido por 38% que correspondem à faixa “Médio”, e onde apenas 01 município permaneceu na faixa “Muito Alto” inerente ao nível de vulnerabilidade, na área de análise.
Ao conceituar vulnerabilidade, Adger (2006, p. 268) a entende como “o estado de suscetibilidade a danos decorrentes da exposição a estresses associados a mudanças ambientais e sociais e da ausência de capacidade de adaptação”. Nesse contexto, cabe ressaltar que a região da UPH Seridó RN está exposta e suscetível à ocorrência de perdas materiais, físicos e sociais, cujos impactos se ampliam à medida que a influência antrópica se torna mais presente e predatória dos recursos naturais.
Contudo, visto que os municípios da UPH Seridó RN apresentam maior intensidade nos aspectos de vulnerabilidade social, o que reflete em mau gerenciamento político-governamental para com as pautas ambientais que não são discutidas com afinco nos governos locais. E isso gera menor capacidade de gestão adaptativa, como observa-se na Figura 4.
Figura 4. Mapa capacidade de gestão aos riscos das mudanças climáticas, UPH Seridó, RN, Brasil

Fonte: As autoras (2023).
Ao observar isoladamente cada mapa da Figura 4, percebe-se que nenhum dos cenários faz referência às faixas “Alto” ou “Muito Alto”, representadas pelas cores verde claro e verde escuro do IGCA. Nesse cenário, 28 % dos municípios foram inseridos na classificação “Médio” e “Baixo” de capacidade de gestão, quando se observa apenas a categoria de Mitigação. Ainda na mesma categoria, representada pelo mapa (A), cerca de 43% dos municípios foram classificados com a capacidade de gestão na faixa “Muito baixo” do IGCA. A referida categoria apresenta indicadores que remetem à minimização imediata do impacto, como distribuição regular de água mediante utilização de carros-pipa, construção de poços, cisternas e outros (Santos, 2022).
Quando se observa o segundo mapa (B) da Figura 4, pode-se constatar o pior cenário da análise, com todos os municípios da UPH Seridó RN inseridos no contexto “Muito Baixo” de adaptação, conforme a escala do IGCA (Santos, 2022). Nesse sentido, deve-se ressaltar que a adaptação às mudanças climáticas está diretamente relacionada aos aspectos de gestão, e envolve imprescindivelmente questões inerentes à vontade política (Di Giulio et al., 2019). E uma vez que as mudanças climáticas denotam um problema de magnitude global, ultrapassando os limites geográficos em termos locais, regionais e nacionais, do mesmo modo deve-se ocorrer o processo de resposta aos impactos dessas alterações no clima, de forma integrada, participativa e estratégica.
O mapa de Capacidade Institucional (C) da Figura 4, apresenta um maior dinamismo no que tange a distribuição de classes, contudo apresenta ainda um cenário de baixa capacidade de gestão, quando se observa isoladamente a categoria supracitada. Nesse aspecto, 38% dos municípios se inserem na faixa “Muito Baixo” da Capacidade Institucional, enquanto 52% apresenta baixa capacidade de resposta. Sendo assim, apenas 02 municípios na faixa “Médio”, sendo eles Caicó e Parelhas (Figura 5 – C).
Com isso, o quarto mapa (D) da Figura 4, foi estruturado a partir da junção das três categorias já mencionadas (mitigação, adaptação e capacidade institucional), e indica que, em síntese, a UPH Seridó RN possui baixa capacidade de gestão aos riscos das mudanças climáticas, uma vez que aproximadamente 67% dos municípios estão inseridos no cenário “Muito Baixo” e 33,33% na faixa “Baixo” da categoria. Resultado esse que se assemelha ao cenário final do IGCA, para os municípios investigados (Figura 5).
Figura 5. Mapa de gestão de capacidade adaptativa às mudanças climáticas, UPH Seridó, RN, Brasil

Fonte: Santos (2022).
Ao sintetizar e sobrepor os dados relativos às três dimensões do IGCA (ameaça, vulnerabilidade e gestão), constatou-se o cenário de baixa capacidade de gestão adaptativa às mudanças climáticas, nos municípios de clima semiárido, inseridos no contexto da UPH Seridó, bacia hidrográfica do rio Piancó-Piranhas-Açu, Rio Grande do Norte, Nordeste do Brasil. Pode-se observar na Figura 5 que a maior parte dos municípios (76%) se enquadram na classificação “Baixo” do IGCA.
Diante desse cenário, é válido ressaltar que embora as cidades sejam “propulsoras de ações transformadoras, principalmente em sua capacidade de enfrentar os desafios setoriais, demográficos, espaciais e ecológicos das mudanças climáticas e riscos extremos de desastres” (Hughes, Chu & Mason, 2018, p. 2), a pequenas cidades possuem acesso limitado a recursos humanos, financeiros e políticos, quando comparadas às grandes cidades e metrópoles (Espíndola & Ribeiro, 2020). Isso, por sua vez, ainda são entraves que reduzem a capacidade de adaptação desses governos, no que tange ao enfrentamento das mudanças climáticas.
Por outro lado, não se pode ignorar que as iniciativas de adaptação dependem, sobretudo, da vontade política (Di Giulio et al., 2019). E com isso reitera a necessidade latente de uma gestão integrada que vislumbre a implantação e implementação de medidas estratégicas de adaptação aos impactos das mudanças climáticas. Desta forma, reduzir os elevados índices de vulnerabilidade já existentes na região, alicerçados, entre outros fatores, na integração e melhoria das políticas de gestão dos recursos hídricos, saneamento e habitação (Espíndola & Ribeiro, 2020). A esse respeito, Lemos (2010) destaca que a adaptação climática e consequente minimização das vulnerabilidades nas cidades, contribuem para uma melhor qualidade de vida das populações, e inibem ou agravam os efeitos das mudanças climáticas.
Conclusiones:
A incorporação de uma agenda voltada para a adaptação climática ainda apresenta diversos desafios no contexto das cidades em geral. Mas, não nos dois governos locais, no nível municipal, eles parecem ser mais desafiadores. A região da UPH Seridó RN é um exemplo de como os municípios, inseridos no contexto do semiárido brasileiro, apresentam fragilidade não relacionada a uma gestão de capacidade adaptativa. Esse aspecto não parece ser um problema de tamanho, seja pequeno, médio ou grande, a inserção da adaptação às mudanças climáticas nas agendas governamentais ainda não é central.
A partir das discussões e resultados apresentados ao longo deste artigo, sugerimos os principais aspectos necessários para a estruturação e boa gestão da capacidade adaptativa às mudanças climáticas, a fim de tornar as cidades menos vulneráveis às ameaças climáticas e outros problemas ambientais, tornando-as mais resilientes e sustentáveis.
Os aspectos naturais da região apresentam fragilidade ambiental, não relacionada à predisposição a processos erosivos e de desertificação, além da baixa disponibilidade hídrica que pode resultar em insegurança hídrica e alimentar. No entanto, parece que a suscetibilidade aos perigos climáticos parece predominar nos aspectos dos riscos climáticos, a vulnerabilidade à seca na região está relacionada à interferência político-governamental e à ineficiência na implementação de políticas públicas, especialmente na gestão dos recursos hídricos. a região apresenta maior vulnerabilidade social, na classificação IGCA.
O IGCA aplicado no contexto da UPH Seridó RN, exemplificou e apontou para um cenário de despreparo, quanto à capacidade de resposta aos riscos das mudanças climáticas, uma vez que embora foram constatadas ações de mitigação dos problemas da seca, os resultados não apresentaram a existência de medidas de adaptação em nenhum dos municípios investigados. Os quais evidenciam ainda baixa capacidade institucional.
Em síntese, o diagnóstico de baixa capacidade de gestão adaptativa nos municípios da UPH Seridó RN constatou a necessidade latente de alinhamento e promoção de medidas de mitigação e adaptação. Soma-se a isso a indispensabilidade de melhorias no âmbito da capacidade institucional, em termos financeiros, materiais, humanos e tecnológicos, no intuito de enfrentar e minimizar os riscos de impacto das mudanças climáticas, representados pelos aspectos de ameaça climática e vulnerabilidade socioambiental.
A realidade aqui apresentada neste estudo, é categórica que ainda são necessários avanços no que tange à inserção das problemáticas ambientais e climáticas nas agendas dos governos locais, de forma integrada, participativa e estratégica.
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Palabras clave:
Mudanças climáticas. capacidade adaptativa. Adaptação. semi-árido.