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Resumen de la Ponencia:
A pesquisa foi desenvolvida com a temática do direito à cidade com ênfase nos loteamentos Jardim Los Angeles e Jardim Manacás/Três Rios no município de Ponta Grossa, estado do Paraná no Brasil. Teve como objetivo analisar indicadores de mobilidade urbana, infraestrutura, equipamentos públicos e participação social incluídas no direito à cidade perante a população destes loteamentos. A natureza da pesquisa foi quanti-qualitativa e exploratória, sendo utilizadas para o desenvolvimento a pesquisa bibliográfica, documental e questionário aplicado a 12 sujeitos, sendo 6 residentes do Jardim Los Angeles e 6 do Jardim Manacás/Três Rios, ressalta-se que os loteamentos Jardim Manacás e Três Rios são tratados juntos devido a sua proximidade geográfica. Para a aplicação dos questionários, utilizou-se do método bola de neve, assim, cada indivíduo participante indicaria outro. Entende-se o direito à cidade enquanto um direito coletivo que engloba os direitos sociais, civis, políticos e humanos e que está diretamente ligado aos aspectos de mobilidade e infraestrutura urbana, bem como participação social. Em relação aos resultados, no que tange a mobilidade urbana, constatou-se a complexidade em ambos os loteamentos. No Jardim Los Angeles há uma linha de ônibus que o percorre de ponta a ponta, porém apenas em uma rua principal. Percebeu-se ainda que o loteamento está excluído do restante da cidade, já que encontra-se cercado em todos os lados por fazendas e indústrias, sendo a única saída por meio de uma rodovia. O Jardim Manacás/Três Rios, também possui linha de ônibus que percorre uma rua principal, porém não chega ao final do loteamento. Além disso, também encontra-se em área limítrofe à uma fazenda, fator que dificulta o deslocamento para acessar o restante da cidade. Analisando a infraestrutura dos loteamentos, percebeu-se que a principal dificuldade encontrada refere-se à acessibilidade, já que 58% dos moradores não possuem calçadas. Quanto à coleta de esgoto e lixo, abastecimento de energia elétrica e água e iluminação pública, considera-se que vem ocorrendo satisfatoriamente. Quanto a equipamentos públicos, o Jardim Los Angeles possui uma Unidade Básica de Saúde e dois equipamentos de educação, porém o Jardim Manacás/Três Rios não conta com qualquer equipamento em seu território, tornando necessário que os moradores desloquem-se aproximadamente 2,5 quilômetros do ponto mais longínquo para que possam acessá-los. A participação social apresenta um grande déficit, uma vez que 100% dos entrevistados não participam da associação de moradores e apenas 16,7% afirmaram ter participado dos processo de tomada de decisão junto ao governo local. Assim, conclui-se que o direito à cidade nos loteamentos Jardim Manacás/Três Rios e Jardim Los Angeles encontra-se cerceado nos quesitos de mobilidade urbana, infraestrutura, equipamentos públicos e participação social em sua amplitude necessária para o bem estar urbano dos moradores.
Introducción:
O direito à cidade é conceituado como um direito coletivo, que visa transformar a cidade conforme os processos de transformação de seus próprios habitantes, de acordo com suas necessidades e desejos. Deve ser analisado sob a ótica dos direitos humanos, sendo incluídos os sociais, políticos, civis, econômicos, e culturais, além de ser garantido a todo indivíduo (Amanajás e Klug, 2018). Ainda pode ser considerado como superior aos demais direitos, uma vez que pressupõe o direito à liberdade, à individualização dentro da própria socialização, ao habitat, à habitação, à obra e à apropriação (Lefebvre, 2011).
O direito à cidade ultrapassa os limites da política urbana estatal, de todo modo ainda está vinculada à ela influenciando e refletindo em suas deliberações (Instituto Pólis, 2020). Outro elemento importante para sua constituição, é a administração democrática (Harvey, 2008) visto que envolve a participação dos envolvidos na produção do espaço.
No Brasil, vem sendo determinado pelo Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001) que dispõe sobre as funções sociais da cidade e da propriedade urbana, a participação da comunidade, a gestão democrática, o plano diretor e a sustentabilidade.
A mobilidade urbana e equipamentos públicos possuem relevância para a garantia da efetivação do direito à cidade. Estes três pontos estão interligados pois, para que se possa acessar aos equipamentos públicos comunitários, é necessário que a população tenha garantida a mobilidade urbana eficiente, tanto no que tange a disponibilidade destes equipamentos em local acessível, quanto no seu deslocamento até eles. Portanto, para que se efetive de fato o direito à cidade, os indivíduos devem ter a possibilidade de usufruir da cidade em sua totalidade, de forma a ser parte dela.
A organização dos equipamentos públicos e da mobilidade urbana dentro das cidades perpassam pela produção do espaço, que se constitui por meio do cotidiano das pessoas. Se caracteriza como um produto social e histórico, ao mesmo tempo em que é a realidade presente e imediata (Carlos, 2001), sendo outro elemento importante para efetivação do direito à cidade.
O município de Ponta Grossa apresenta características diversas e contrastantes. Ao mesmo tempo em que possui um dos maiores Índices de Desenvolvimento Humano, também possui localidades em situação de desproteção socioeconômica. Há que se destacar que entre as características marcantes do município, está a grande incidência de atividades agrícolas dentro da área urbana, fazendo com que a população esteja limítrofe à estas.
Os loteamentos Jardim Manacás/Três Rios foram selecionados por encontrar-se limítrofe às atividades agrícolas, inseridas na área urbana do município. Para além observou-se a dificuldade da população para acessar os equipamentos públicos, já que encontram-se ao lado de uma fazenda e de um arroio, fator que dificulta a mobilidade da população que ali reside.
O Jardim Los Angeles foi escolhido pois, além de encontrar-se em área limítrofe à mesma plantação dos demais loteamentos citados, apresenta outras características, que serão aprofundadas mais a frente, e que podem gerar impactos no que tange o direito à cidade.
Perante o exposto acima, este trabalho se justifica pela necessidade de compreender de que modo o direito à cidade se expressa para os moradores por meio dos aspectos de infraestrutura e equipamentos públicos, mobilidade urbana e participação social nos loteamentos Jardim Los Angeles e Jardim Manacás/Três Rios, visto que estes apresentam uma diversidade de características no perímetro urbano de Ponta Grossa.
O objetivo geral da pesquisa foi analisar indicadores de mobilidade urbana, infraestrutura, equipamentos públicos e participação social inclusas no direito à cidade perante a população dos loteamentos Jardim Manacás, Três Rios e Jardim Los Angeles no município de Ponta Grossa. Como objetivos específicos, foram delimitados os seguintes: analisar de que forma ocorre a mobilidade urbana nos loteamentos; analisar o acesso dos moradores à infraestrutura e equipamentos públicos nas regiões de abrangência dos loteamentos definidos; e investigar a participação social dos moradores dos loteamentos na gestão do município.
A natureza desta pesquisa caracteriza-se como quanti-qualitativa e exploratória. Como metodologia foram adotadas a pesquisa bibliográfica e documental, assim, utilizou-se de autores como: David Harvey, Henri Lefebvre, Carola C. Arregui, entre outros. Os documentos empregados consistem em: Plano Diretor de Ponta Grossa; Carta Mundial pelo Direito à Cidade, entre demais considerados relevantes.
Para coleta de dados foi aplicado um questionário nas localidades. A amostragem foi definida a partir do método bola de neve, que consiste em um formato de amostra não probabilística, que se utiliza de cadeias de referência. Para iniciar sua realização, é necessário ter os informantes-chave ou sementes. Estes são responsáveis por auxiliar o pesquisador a começar os contatos e tatear o grupo que será pesquisado. A partir deste momento, solicita-se que os indivíduos indicados pelas sementes indiquem novos contatos e assim sucessivamente (Vinuto, 2014). O questionário foi aplicado para doze sujeitos e distribuído de modo que três pesquisados residissem em área limítrofe à plantação e três próximos ao arroio, sendo seis para o Jardim Los Angeles e seis para o Jardim Manacás/Três Rios.
A aplicação do questionário com perguntas fechadas ocorreu em 30 de novembro de 2021, pela pesquisadora nas casas dos mesmos. Para além das questões já definidas foram anotadas percepções dos entrevistados a respeito dos assuntos em um diário de campo da pesquisa.
Desarrollo:
Para iniciar a discussão, cabe discorrer brevemente acerca do conceito de cidade que, apesar de não ser consenso entre os autores, neste trabalho será definida enquanto o mundo criado pelo sujeito e o mundo ao qual está condenado a viver, sendo a tentativa de refazer o mundo em que se vive. Ao criá-la os indivíduos também recriam-se (Harvey, 2014).
Falar sobre o direito à cidade perpassa pelos inúmeros elementos que estão presentes na sua universalidade e na prática dos que vivem e convivem nesses espaços. É um direito que não se limita ao individual, mas se refere a elementos coletivos, portanto que impactam sobre interesses comuns a várias pessoas.
Conforme Lefebvre (2011) é no espaço urbano que a luta de classes se expressa. Esta relação é responsável pela manutenção da produção de diferenças na sociedade pois se mantém voltada para melhorias apenas em questões superficiais da classe trabalhadora. Espaços de lazer e habitação, por exemplo, permanecem segregados dos demais, não há integração entre a cidade em que a burguesia habita e a cidade habitada pelos trabalhadores. Desta forma, aponta-se a necessidade de uma revolução cultural urbana para que então esta divisão seja suprimida (Brandt, 2018).
De acordo com Lefebvre:
Se é verdade que a palavra e conceito: cidade, urbano, espaço correspondem a uma realidade global e não designam um aspecto menor da realidade social , o direito à cidade se refere à totalidade ainda visada. Não é um direito natural nem contratual.(...) ele significa o direito dos cidadãos/citadinos e de grupos que eles constituem (sobre a base de relações sociais) a figurar sobre todas as redes e circuitos de comunicação de informação, de trocas. O que não depende nem de uma ideologia urbanística, nem de uma intervenção arquitetônica, mas de uma qualidade ou propriedade essencial do espaço urbano: a centralidade.(Lefebvre, 2008. p.162).
Para o autor, o direito à cidade é uma forma superior aos demais direitos, é o:
direito à liberdade, à individualização na socialização, ao habitat e à habitação. O direito à obra (atividade participante) e o direito à apropriação (bem distinto da propriedade) que se imbricam dentro do direito à cidade, revelando plenamente o uso (Lefebvre, 2011. p.140).
David Harvey, outro importante teórico para a definição do direito à cidade, afirma que o debate acerca do direito à cidade na atualidade não se deve apenas às contribuições feitas por Lefebvre, mas sim pelos movimentos e lutas sociais sobre a vida urbana. Para Harvey (2008), a ideia do direito à cidade surge nas ruas, por pessoas oprimidas que necessitam de amparo. Ainda define como o direito de transformação das cidades em algo diferente, na qual a população participa de suas mudanças e as constrói conforme seus interesses e necessidades. É também um direito coletivo antes de ser individual, uma vez que este processo de transformação radical só pode ocorrer de maneira coletiva.
Harvey (2008, p.74) defende que “a liberdade de construir e reconstruir a cidade e a nós mesmos é, como procuro argumentar, um dos mais preciosos e negligenciados direitos humanos”. A administração democrática do excedente do capital é outro fator que constitui o direito à cidade, porém destaca-se que:
O direito à cidade, como ele está constituído agora, está extremamente confinado, restrito na maioria dos casos à pequena elite política e econômica, que está em posição de moldar as cidades cada vez mais ao seu gosto (Harvey, 2008. p.87).
De acordo com a Carta Mundial pelo Direito à Cidade (2009), o direito à cidade é caracterizado como a liberdade de todas as pessoas usufruírem da cidade, sem distinção de gênero, raça, etnia, religião, idade, orientação sexual, nacionalidade, renda, entre outros. Este deve abarcar critérios de sustentabilidade, democracia, equidade e justiça, voltado, especialmente, a grupos considerados mais vulneráveis, objetivando o alcance de condições de vida adequadas. Além disso:
supõe a inclusão do direito ao trabalho em condições eqüitativas e satisfatórias; de fundar e afiliar-se a sindicatos; de acesso à seguridade social e à saúde pública; de alimentação, vestuário e moradia adequados; de acesso à água potável, à energia elétrica, o transporte e outros serviços sociais; a uma educação pública de qualidade; o direito à cultura e à informação; à participação política e ao acesso à justiça; o reconhecimento do direito de organização, reunião e manifestação; à segurança pública e à convivência pacífica. Inclui também o respeito às minorias e à pluralidade étnica, racial, sexual e cultural, e o respeito aos migrantes (Carta Mundial pelo Direito à Cidade, 2009, p.3).
No Brasil, o principal instrumento legal referente ao direito à cidade é o Estatuto da Cidade, apresentado como Projeto de Lei no ano de 1989 e implementado apenas em 2001. O documento combina a gestão participativa com os ideais de sustentabilidade ecológica e econômica, buscando também melhorar a ordenação do espaço urbano e solucionar problemas sociais como o saneamento e moradia. Possui caráter municipalista, centrado no Plano Diretor e de gestão participativa nas decisões de interesse público (Boeira, Santos e Santos, 2009).
Tendo sido elucidado o conceito do direito à cidade, parte-se para seus indicadores. Utilizando-se daqueles construídos por Arregui (2018) observa-se que estes dividem-se em dois grupos: o primeiro aponta para inserção urbana, nos quais estão contempladas as dimensões de infraestrutura urbana, serviços essenciais, mobilidade e condições habitacionais; já o segundo é voltado para a sociabilidade e participação social que apresenta como dimensões a sociabilidade, espaços de informação, participação social e organização coletiva.
Para além dos indicadores descritos acima, há o Índice de Bem-Estar Urbano (IBEU), que procura avaliar o usufruto dos cidadãos em relação ao bem-estar urbano levando em conta o consumo de mercado e os serviços prestados pelo Estado, sendo composto pelas dimensões de: Mobilidade Urbana, Condições Ambientais Urbanas, Condições Habitacionais Urbanas, Atendimento de Serviços Coletivos Urbanos e Infraestrutura Urbana (Ribeiro e Ribeiro, 2016).
Cabe ressaltar que para a construção dos indicadores utilizados neste trabalho, teve-se com referência estes apresentados acima, assim alguns destes indicadores foram selecionados para serem analisados pelas autoras, conforme será abordado posteriormente.
Partindo para o lócus da pesquisa, o município de Ponta Grossa, situa-se na região dos Campos Gerais, no segundo planalto paranaense, e está a 118 quilômetros da capital do estado, Curitiba. Tem uma dimensão territorial de 2.054.732 km e uma população estimada de 358.838 (IBGE, 2021).
Atualmente, o município de Ponta Grossa tem característica de centro urbano de médio porte. Para os aspectos socioeconômicos, Ponta Grossa é uma das cidades do Paraná com o maior Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M), com 0,763 (IBGE, 2021), no entanto possui um Índice Gini de 0,5437, o que demonstra uma alta concentração de renda no município (Ministério da Saúde, 2010).
Analisando alguns componentes do IDH-M, observa-se que a taxa de alfabetização é alta, chegando a 94%. Na área da saúde, a mortalidade infantil corresponde a 13,01 óbitos por mil nascidos vivos de acordo com dados do IBGE (2021). A renda per-capita do município é inferior à um salário mínimo, alcançando o valor de R$318,22, assim a taxa de pobreza chega a 18,6% (Ponta Grossa, 2018).
Quanto aos aspectos de infraestrutura e serviços públicos do município, iniciar-se-á pela mobilidade urbana. Neste quesito de acordo com o Plano Diretor, algumas problemáticas são encontradas, como: falta de pavimentação em diversas vias, más condições de acessibilidade para pedestres, principalmente para pessoas com deficiência, insuficiência de ligações viárias, e no transporte público são encontradas questões como alto custo de passagem (Ponta Grossa, 2018), que atinge o valor de R$5,50 no período de construção desta pesquisa (Ponta Grossa, 2021), e sobrecarga do transporte (Ponta Grossa, 2018).
Referente ao saneamento, Ponta Grossa tem um sistema de abastecimento de água bastante eficiente atendendo 99,15% da população, quanto à coleta de esgoto, são atendidos 91,22% da população de acordo com o Plano Municipal de Saneamento Básico (Ponta Grossa, 2019).
No que tange os equipamentos públicos, na área da saúde são totalizados 41 estabelecimentos, entre os quais estão 1 Pronto Socorro, 6 hospitais, 2 Centros Municipais, um de Especialidades e outro da Mulher, entre outros. Na educação são 71 escolas municipais, 44 escolas estaduais e 2 instituições de ensino superior públicas. Para cultura e lazer, o município possui 12 estabelecimentos culturais, 5 estádio de futebol, 21 ginásios esportivos, 9 piscinas locais, 10 mini-ginásios esportivos, 62 campos de futebol, 9 campos de grama sintética, 3 pistas de skate e 18 praças públicas (Ponta Grossa, 2018). Na assistência social Ponta Grossa conta com 10 Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), 2 Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), 1 Centro POP (Ponta Grossa, s/ano).
Oliveira e Sahr (2012), afirmam que a expansão urbana, o uso e ocupação do solo do município de Ponta Grossa não ocorreu da forma como preconizado pelo direito à cidade, uma vez que:
Enquanto expressiva parcela da população habita áreas longínquas ou ambientalmente frágeis em fundos de vale, que não interessam ao mercado, os gestores municipais atendem aos interesses privados e de determinados segmentos do mercado. Isso reproduz, cada vez mais, a exclusão social vivenciada pela maioria das cidades, dando luz à ineficácia social da legislação urbana (Oliveira e Sahr, 2012, p.122).
O processo de favelização no município se deu por um conjunto de fatores, fosse pela industrialização massiva que vinha ocorrendo na cidade e por consequência a grande expansão populacional que culminou na especulação imobiliária, esta por sua vez acarreta em escassez gerada pelo próprio mercado, criando um déficit quanto ao acesso à habitação (Nascimento e Matias, 2006).
Assim, compreende-se que a escassez de terras à venda, o aumento populacional, a inércia do governo municipal para tomar medidas de contenção da especulação imobiliária, somadas ao empobrecimento da população fez com que a saída mais viável para a classe trabalhadora fosse habitar as favelas (Nascimento e Matias, 2006).
De modo predominante, as favelas localizam-se nas piores terras do espaço urbano para as condições de habitação. No município, estão localizadas, majoritariamente, em vales, porém são encontradas também em terrenos íngremes, próximo à ferrovia, redes de alta tensão, terrenos abandonados e em terrenos desregulamentados (Nascimento e Matias, 2006).
O loteamento Jardim Los Angeles, localizado no bairro Boa Vista possui 24.968 habitantes (IBGE, 2021), encontra-se às margens da rodovia PR-151, sendo esta a única forma de chegar ou sair do loteamento, além disso encontra-se isolado do restante da cidade e cercado por fazendas, apesar de estar inserido na zona urbana de Ponta Grossa. Algumas atividades extrapolam suas respectivas áreas, como plantação de soja destinada à exportação e indústrias como a Fundição Hübner que ocupa espaço fora da zona industrial (Agustinho e Scheffer, 2020).
O loteamento ainda possui ocupações irregulares em áreas com características geológicas de voçoroca e regiões com fios de alta tensão de energia elétrica (Agustinho e Scheffer, 2020).
Os loteamentos Jardim Manacás e Três Rios, localizam-se no bairro Chapada. Foram criados no ano de 2016 sendo que o Jardim Manacás conta com 243 habitações e o Jardim Três Rios possui 119 residências, de acordo com dados da PROLAR (2017) .
O Jardim Três Rios possui três riachos ao longo de sua extensão, seu nome advém deste fato, porém estes encontram-se totalmente poluídos, ainda assim é comum que crianças brinquem na água (Schimanski et al. 2011). Ambos os loteamentos estão em área limítrofe à atividade agrícola, fato que gera agravos à saúde da população residente (Leite e Scheffer, 2021).
Para além destas questões, a região é considerada como uma das mais pobres do município de Ponta Grossa. Possui problemas com altos níveis de desemprego, baixa escolaridade, saúde precária e índices altos de violência (Schimanski et al. 2011).
Caracterizado o lócus da pesquisa, parte-se para a análise dos indicadores do direito à cidade em tais localidades.
Para que se compreenda as condições estruturais dos loteamentos, foram elencados os indicadores de infraestrutura que compreendem as condições de pavimentação e calçadas, rede oficial de esgoto, abastecimento de água, coleta de lixo, energia elétrica por rede oficial e iluminação pública.
Inferiu-se que no Jardim Los Angeles 66,6% dos entrevistados não possuem calçadas e 33,3% não residem em rua asfaltada, fator que pode dificultar a locomoção de pessoas idosas, pessoas com deficiência, pessoas com carrinho de bebê, entre outros.
Referente à coleta de esgoto e lixo, abastecimento de água, distribuição de energia elétrica e iluminação pública no Jardim Los Angeles, considera-se que estes serviços são prestados de forma significativa, uma vez que 100% dos sujeitos possuem acesso à estes.
Para que os equipamentos públicos fossem analisados, os entrevistados foram questionados quanto ao acesso a praças, parques, campos de futebol, à espaços e eventos culturais como shows e peças de teatro, por exemplo, além do acesso à escola, Unidades Básicas de Saúde (UBS), Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS).
Assim, foi possível inferir que 33,3% dos residentes do Jardim Los Angeles não possuem acesso à espaços recreativos, 100% não possui acesso à eventos culturais, 16,7% afirmou não possuir acesso à escola numa distância de até 500 metros de sua residência, 66,7% não possui acesso à CRAS e CREAS e 100% dos sujeitos acessam a UBS próximo a sua residência.
Quanto à qualidade de atendimento dos serviços no Jardim Los Angeles, existem divergências entre os entrevistados sobre um mesmo equipamento. Foi relatado por um dos sujeitos que o atendimento da Unidade Básica de Saúde é precário, pois não recebe atendimento adequado e encontra dificuldades para agendamento de consultas, por exemplo. Porém outra entrevistada afirmou que sempre quando necessário conseguiu suprir suas necessidades.
Deste modo entende-se que os sujeitos têm percepções diferentes sobre as situações. Cada indivíduo pode interpretar de forma diversa o mundo à sua volta de acordo com suas vivências e experiências.
No Jardim Manacás/Três Rios, observou-se que 50% dos entrevistados não possuem acesso à calçada, rua com pavimentação em frente à sua residência, bem como rede de esgoto. 100% dos sujeitos dispõem de abastecimento de água, coleta de lixo e iluminação na residência, no entanto 16,7% afirmaram não possuir iluminação pública.
Quanto aos equipamentos públicos, 66,7% não têm acesso a espaços recreativos, assim como 83,3% não acessam eventos culturais. 100% acessam a escola próximo à sua residência, 83,3% acessam a UBS e 83,3% não possuem acesso à CRAS e CREAS.
O problema percebido em ambos loteamento quanto à infraestrutura refere-se à acessibilidade, pois a maioria das ruas não possuem calçadas, fator que dificulta e traz riscos à locomoção dos pedestres, principalmente se tratando de pessoas idosas, com deficiência, entre outros.
Quanto aos equipamentos públicos, percebe-se que este tem um grande déficit, principalmente no Jardim Manacás/Três Rios, que não conta com qualquer equipamento público em seu território, fazendo com que os moradores precisem se deslocar cerca de 2,5 quilômetros, do ponto mais longínquo, até bairros nas proximidades para poderem acessar escolas, Unidades Básicas de Saúde, CRAS e CREAS.
O acesso à cultura nos loteamentos pode ser considerado inexistente, já que dos doze entrevistados, onze não possuem acesso a shows, peças de teatro, entre outras atividades. Este fato se confirma pois no município de Ponta Grossa, as atividades culturais são realizadas majoritariamente no centro da cidade e as condições de mobilidade urbana não facilitam o acesso desta população aos eventos.
Quanto à mobilidade, no jardim Los Angeles, o principal meio de transporte utilizado pelos moradores é o carro (66,7%). Questionados sobre o acesso a ciclovias, 100% dos entrevistados afirmou não possuir, no entanto todos possuem acesso à pontos de ônibus próximo à sua residência, ainda que esta percorra apenas uma via principal do loteamento.
No Jardim Los Angeles, um dos principais indicadores defasados tange à mobilidade urbana, justamente por encontrar-se isolado do restante da cidade, tanto pela periferização quanto por haver apenas uma única entrada para o loteamento que consiste em um acesso pela rodovia, o que dificulta o acesso ao restante da cidade.
No Jardim Manacás/Três Rios, 50% dos entrevistados utilizam o transporte coletivo como principal meio de deslocamento, sendo este o mais expressivo. 100% dos sujeitos não possuem acesso à ciclovia e 100% acessam ponto de ônibus próximo à sua residência, no entanto é válido ressaltar que a linha de ônibus disponibilizada para o Jardim Manacás não o percorre em toda sua dimensão.
Analisando a participação social no Jardim Los Angeles, inferiu-se que 100% dos entrevistados nunca participaram da construção e avaliação de políticas e orçamentos públicos, assim como 100% nunca participou de associação de moradores.
Referente ao Jardim Manacás/Três Rios, 33,3% dos entrevistados afirmaram ter participado em algum momento do processo de construção e avaliação de políticas e orçamentos públicos, porém 100% não participa ou participou da associação de moradores.
A partir dos dados analisados compreende-se que os sujeitos, residentes de ambos os loteamentos, estão excluídos do processo de construção de políticas e da própria cidade, assim como, consequentemente, não exercem o controle social. Percebe-se também o distanciamento entre a gestão municipal e a população.
Portanto ressalta-se que um dos principais fatores para que a cidade seja construída e transformada pelos indivíduos que a compõem, não vem sendo fomentado de forma eficiente nos loteamentos, afastando os moradores da garantia do direito à cidade.
Face a todo o exposto ao longo deste trabalho, observa-se que não houveram diferenças significativas entre entre os loteamentos analisados. Alguns indicadores são mais efetivos que outros, ainda assim compreende-se que não há a garantia do direito à cidade na sua totalidade, uma vez que os indicadores de equipamentos públicos, mobilidade urbana e participação social tiveram resultados negativos.
Em síntese, segundo os moradores dos loteamentos e dados coletados infere-se que nos locais pesquisados tem-se acesso a infraestrutura, porém nos indicadores equipamentos públicos e mobilidade urbana estes ficam aquém do necessário encontrando-se territorialmente excluídos. Quanto à participação em associações de moradores esta foi nula e nas políticas públicas urbanas foi escassa, o que define que o direito à cidade que representa um direito coletivo não foi efetivado na sua totalidade. Portanto, não se verifica a construção de uma cidade socialmente justa, livre de desigualdades de classe e nem garante a todos a possibilidade de transformar o meio em que vive por meio de processos democráticos.
Conclusiones:
Por meio deste trabalho, averiguou-se que nos loteamentos Jardim Los Angeles, Jardim Manacás/Três Rios, alguns indicadores fundamentais para a efetivação do direito à cidade estão defasados.
No que tange a mobilidade urbana, constatou-se que esta é complexa em ambos os loteamentos. No Jardim Los Angeles há uma linha de ônibus que o percorre de ponta a ponta, porém apenas em uma rua principal. Percebeu-se ainda que o loteamento está excluído do restante da cidade, uma vez que encontra-se cercado em todos os lados por fazendas e indústrias, a única saída é por meio de uma rodovia.
O Jardim Manacás/Três Rios, também possui linha de ônibus que percorre uma rua principal, porém esta não chega ao final do loteamento. Assim como o Jardim Los Angeles, o Manacás/Três Rios também encontra-se em área limítrofe à uma fazenda, fator que dificulta o deslocamento para acessar o restante da cidade.
Analisando a infraestrutura dos loteamentos, percebeu-se que a principal dificuldade encontrada refere-se à acessibilidade, já que 58% dos moradores não possuem calçadas. Quanto às questões de coleta de esgoto e de lixo, abastecimento de energia elétrica e água e iluminação pública, considera-se que esta vem ocorrendo de modo satisfatório.
O acesso a equipamentos públicos é outro fator que carece de atenção. O Jardim Los Angeles conta com uma Unidade Básica de Saúde, e dois equipamentos de educação, porém o Jardim Manacás/Três Rios não conta com qualquer equipamento em seu território, tornando necessário que os moradores se desloquem aproximadamente 2,5 quilômetros do ponto mais longínquo para que possam acessá-los.
Quanto à participação social, entendeu-se que esta possui um grande déficit uma vez que 100% dos entrevistados não participam da associação de moradores e apenas 16,7% afirmaram ter participado dos processo de tomada de decisão junto ao governo local. Assim, compreende-se que estes indivíduos estão excluídos de processos importantes referentes à participação social. Vale ressaltar que quando a sociedade civil se aproxima da gestão do município, a tendência é que as desigualdades sociais nos territórios sejam minimizadas.
Por meio dos resultados obtidos na pesquisa realizada entende-se que o trabalho confirma a hipótese de que o direito à cidade nos loteamentos Jardim Manacás, Três Rios e Jardim Los Angeles encontra-se cerceado nos quesitos de mobilidade urbana, infraestrutura, equipamentos públicos e participação social na sua amplitude necessária para o bem estar urbano dos moradores.
Viver na cidade implica em ter suas necessidades atendidas de forma equânime entre as diversas localidades, porém este trabalho demonstra que se faz necessário uma contínua luta para sanar e acessar os direitos. Nas vivências é possível ver as contradições onde ao mesmo tempo que se reproduz relações de não acesso a direitos também cria-se a possibilidade de superação ao buscar algo novo por meio do estímulo à participação e a reivindicação.
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Palabras clave:
Direito à Cidade; Urbanização; Cidades.